Em contratos eletrônicos admite-se a
responsabilidade civil material e imaterial do fornecedor quando não entrega o
produto no prazo estipulado ao consumidor quando este tinha o intuito de
presentear alguém, como também, a possibilidade do direito de arrependimento.
Resumo
O presente artigo visa discorrer sobre a
possibilidade jurídica de algumas hipóteses de proteção ao consumidor quando
celebra contratos eletrônicos, a saber: a responsabilidade civil do fornecedor
pela impossibilidade de presentear pelo consumidor e o exercício do direito de
arrependimento nos contratos virtuais, sendo alternativas criadas para atingir
o devido equilíbrio nas relações consumeristas.
Palavras-chave: Consumidor.
Comércio eletrônico. Internet.
INTRODUÇÃO
Nos últimos anos o e-commerce vem ganhando
espaço e atenção aos consumidores tanto no mundo como no Brasil, o que puxa
também a necessidade de proteção a figura daquele, representado – em sua imagem
maior – pelo Código de Defesa do Consumidor.
Por mais que ainda exista um certo receio
pelos consumidores em adquirem produtos e serviços online, esse mercado tem
atingindo proporções gigantescas, movimentando quantias elevadas no mercado.
Visando proteger o consumidor por meio desse
novo mercado, tanto as doutrinas e jurisprudências consumeristas vem atribuindo
novas interpretações aos institutos legais vigentes, sendo que, nesse presente
trabalho será exposto duas situações a que integram o mercado virtual.
1. DADOS ESTATÍSTICOS SOBRE
O E-COMMERCE
Inicialmente, antes de adentrar ao objetivo
deste presente trabalho, vale a pena ressaltar as afirmativas apresentadas
acima sobre o crescente movimento do comércio eletrônico no Brasil, por meio da
apresentação e alguns dados estatísticos, a título de conhecimento.
Conforme aponta o site “Convergência Digital”,
no primeiro semestre do ano de 2012, houve um crescimento de 21% de vendas
pela internet no Brasil, estimando existir no país 37,6 milhões de consumidores
onlines[1].
Todavia, por mais que o número de
consumidores desta categoria seja alta, apenas 2% dos brasileiros afirmam
confiar nos sites de compras e internet banking, sendo que 82% ainda preferem
ao antigo método de “cara-crachá”, comparecendo pessoalmente as lojas e aos
bancos. Já 8% afirmam que, mesmo não confiando nos serviços online acabam
aceitando os riscos. E, por fim, 5% confiam nas compras online desde que conheçam
a forma dos sistemas utilizados nos sites[2].
2. PROTEÇÕES AO CONSUMIDOR
NOS CONTRATOS ONLINE
Não há qualquer dúvida hoje sobre a extensão
do Código de Defesa do Consumidor ao e-commerce, a aplicabilidade da lei é pacífica
no ordenamento jurídico brasileiro, buscando, aquele, a todo momento tentar se
adequar a essa forma de comércio.
Neste sentido, cita-se, por exemplo, o
projeto de lei n. 4.348/2012 em tramitação pelo Congresso Nacional, que altera
o artigo 49 do Código de Defesa do Consumidor e acrescenta o artigo 49-A do
mesmo diploma legal, que disciplinaria sobre a proteção do consumidor no comércio
eletrônico, obrigando o fornecedor a prestar informações claras e precisas ao
consumidor, não apenas em relação ao produto/serviço pactuado como links que
facilitarão a divulgação da própria lei consumerista como os órgãos de proteção.
Adiante, sobre as situações apontadas no início
do trabalho que serão abordadas, tem-se:
a) A impossibilidade de presentear alguma
pessoa em data comemorativa em razão do não cumprimento do prazo estipulado
para entrega pelo fornecedor, e;
b) O direito de arrependimento do consumidor
nos contratos eletrônicos, a qual passa-se a expor.
2.1. Impossibilidade
de presentear pelo consumidor.
Primeiramente, sobre a impossibilidade de
presentear, como se sabe, nas vésperas de datas comemorativas o fluxo de
pessoas buscando o comércio aumenta significativamente fazendo com que muitos
fornecedores eletrônicos abaixem seus preços e ofereçam condições vantajosas de
pagamento e envio do produto.
O fornecedor que se vale do e-commerce esta
obrigado a apresentar um prazo estimado da entrega do produto a qual estará vinculado
ao mesmo, em especial, nas ocasiões de vésperas de datas comemorativas. Não há lógica
afirmar que o consumidor, ao realizar a compra eletrônica, tem que ter o
conhecimento que a data anunciada para entrega se trata de uma passível de
descumprimento, uma vez que, essa foi uma das razões por optar por aquele
fornecedor.
A arguição da responsabilidade civil do
fornecedor pela impossibilidade de presentear pelo consumidor se dá em razão de
que o Código de Defesa do Consumidor adotou a teoria do risco do negócio, um
dos fundamentos para a responsabilidade objetiva, obrigando o fornecedor
indenizar o consumidor independente de culpa, tendo que o último apenas a
necessidade de demonstrar o dano causado com a conduta lesiva, no caso, a não
entrega do produto no prazo estabelecido.
Para essa teoria, toda pessoa que exerce
alguma atividade que cria um risco de dano para terceiros, deve ser obrigado a
repará-lo, ainda que sua conduta seja isenta de culpa. Isso significa dizer que
a responsabilidade civil desloca-se da noção de culpa para a ideia de risco.[3]
O fornecedor assume o risco ao estipular um
prazo de entrega do produto, tendo o mesmo que arcar com os danos que resultam
do descumprimento contratual, danos estes que ocorrem quando o consumidor, por
exemplo, desejando presentear seu filho na data comemorativa de “dia das crianças”
realiza, dias antes, a compra de um brinquedo, sendo informado pelo fornecedor
em seu site, que a entrega ocorreria em tempo hábil para o consumidor
presentear seu filho, todavia, o produto não é entregue.
Na situação hipotética houve, inicialmente,
o descumprimento contratual pelo fornecedor, havendo a possibilidade do
consumidor requerer a rescisão do contrato com seus efeitos, exigindo ou a
devolução dos valores pagos ou se preferir a exigência do cumprimento, aqui, o
Código de Defesa do Consumidor, por meio do seu artigo 7°, caput, se vale o
artigo 475 do Código Civil:
Art.
7° Os direitos previstos neste código não excluem outros decorrentes de
tratados ou convenções internacionais de que o Brasil seja signatário, da
legislação interna ordinária, de regulamentos expedidos pelas autoridades
administrativas competentes, bem como dos que derivem dos princípios gerais do
direito, analogia, costumes e equidade.
Art.
475 A parte lesada pelo inadimplemento pode pedir a resolução do contrato, se não
preferir exigir-lhe o cumprimento, cabendo, em qualquer dos casos, indenização
por perdas e danos.
Além das hipóteses elencadas pelos
dispositivos acima expostos, ainda existe a possibilidade de requer indenização
por danos morais pela impossibilidade de presentear, tratado de situação
largamente aceita pela jurisprudência nacional, conforme segue ementas abaixo:
RECURSO
INOMINADO. CDC. INDENIZAÇÃO. COMPRA VIA INTERNET. MERCADORIA PAGA E NÃO
ENTREGUE. INDÉBITO. FALHA NA PRESTAÇÃO DE SERVIÇO. FRUSTRAÇÃO. PRESENTE DE
NATAL. DANOS MORAIS EM PATAMAR RAZOÁVEL. 1. Nos termos do artigo 14, do CDC, o
fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela
reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação
dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua
fruição e riscos. ; 2. O dano moral está configurado, não só pelo descaso e
desrespeito com o consumidor, que não conseguiu solucionar administrativamente
a demanda, mas também, e, principalmente, pelo caráter punitivo e pedagógico
que integra este tipo de reparação; 3. A indenização, no caso de dano moral,
tem a finalidade de compensar ao lesado atenuando seu sofrimento, e quanto ao
causador do prejuízo, tem caráter sancionatório para que não pratique mais ato
lesivo a personalidade das pessoas; 4. Não havendo critérios objetivos para
fixação do quantum indenizatório por danos morais, deve este ser mantido quando
arbitrado em consonância com os princípios da razoabilidade e da
proporcionalidade e de acordo com os valores comumente arbitrados por esta
turma recursal em causas da espécie; 5. Recurso conhecido e improvido, mantendo-se
a sentença pelos próprios fundamentos. A teor do art. 46, da Lei Federal nº 9.099/
95, serve a presente Súmula de julgamento como acórdão; 6. Custas e honorários
advocatícios, estes fixados em 20% (vinte por cento) sobre o valor da condenação,
a serem pagos pela recorrente vencida.[4]
APELAÇÃO
CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. Preliminar contra-recursal de não conhecimento
do apelo. Rejeição. Mérito. Compra e venda de mercadoria via internet. Promessa
de entrega até o dia das crianças. Descrumprimento. Frustração de expectativa. Dano
moral indenizável. Quantum. Manutenção. Preliminar contra-recursal rejeitada. Apelo
desprovido.[5]
O segundo ponto a ser discutido neste
presente trabalho se trata do direito de arrependimento nos contratos eletrônicos.Observando
a fundamentação utilizada nos julgados selecionados, a ideia da possibilidade
de indenização por danos morais não se traduz apenas pelo desrespeito ao
consumidor pelo descumprimento contratual, como também pela frustração pela
expectativa criada e até, pode-se dizer, pelos danos causados a pessoa que
seria presenteada, afetando seu estado emocional.
2.2. Do direito de
arrependimento nos contratos eletrônicos.
O Código de Defesa do Consumidor disciplina
no artigo 49 que o direito de arrependimento pode ser exercido, pelo
consumidor, no prazo de sete dias a contar da data de assinatura ou do ato de
recebimento do produto e serviço. Sempre que a contratação de fornecimento de
produtos e serviços ocorrer fora do estabelecimento comercial, especialmente
por telefone ou domicílio. Portanto, o direito de arrependimento, é o direito
de desistir do negócio, tratando-se “de um ‘prazo de reflexão obrigatório
instituído pela lei, de modo, a assegurar que o consumidor possa realizar uma
compra consciente, equilibrando a relação de consumo”[6].
O direito de arrependimento também pode ser
utilizado nos contratos eletrônicos, aplicado perfeitamente o artigo 49 do Código
de Defesa do Consumidor, sendo que, a única ressalva se faz pelo direito de
arrependimento sobre serviços.
Prega-se, portanto, que sendo o contrato
celebrado à distância, como no caso do contrato de consumo via Internet, ao não
se permitir que o consumidor tenha acesso físico ao serviço ou produto, aquele
deve ser classificado como contrato realizado fora do estabelecimento
comercial, aplicando-se o direito de arrependimento previsto no Código de
Defesa do Consumidor.[7]
Caso o serviço não seja de natureza
continuada (ou seja, não se esgota com a entrega do serviço, estendendo assim
com o tempo) não é possível exercer o direito de arrependimento, mas, caso seja
de natureza continuada, é possível, observando a proporcionalidade do serviço
utilizado para a restauração do status quo inicial.
Assim sendo, portanto, recebendo o produto,
por exemplo, em casa, o consumidor tem, a partir daquela data, sete dias para
requerer com o fornecedor a devolução do produto/ serviço e do valor pago. Claro,
se, por ventura, a pessoa consumir um serviço (de natureza continuada, como por
exemplo, planos de assinatura) dentro desse prazo de sete dias e requerer a
devolução do valor pago, essa mesma devolução deve ser proporcional à consumação
do serviço, em nome da segurança jurídica.
Outro ponto interessante é que, caso um
consumidor realize a compra de um produto e recebe o mesmo em sua residência,
aquele pode violar o envelope usado para a exportação que revestiu o produto até
sua residência, sem que seu direito de arrependimento seja prejudicado.
CONCLUSÃO
O e-commerce se trata, na atualidade, de uma
grande evolução no mercado, conquistando o público brasileiro, por esta razão,
há a necessidade de uma atenção especial pelo direito consumerista na proteção
daqueles considerados a parte mais vulnerável em uma relação de consumo.
O objetivo do presente trabalho foi
apresentar duas situações que demonstram essa ampliação da proteção jurídica ao
consumidor, quando este efetua contratos eletrônicos. Detona-se ser admitida a
responsabilidade civil material e imaterial do fornecedor quando não entrega o
produto no prazo estipulado ao consumidor quando este tinha o intuito de
presentear alguém, como também, a possibilidade do direito de arrependimento.
Todavia, sempre é importante relembrar que,
por mais que existam elementos de proteção jurídica do consumidor, a própria
ideia da proteção deve partir, inicialmente, pelo próprio consumidor antes de
celebrar qualquer contrato eletrônico, adotando condutas como verificar a
validade e idoneidade do fornecedor, se há um sistema de atendimento ao
consumidor, política de comércio dentre outras condutas necessárias.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Artigos, doutrinas e
notícias utilizadas
BARRETO DE SOUZA, Déborah. O direito de
arrependimento nos contratos eletrônicos. Conteúdo Jurídico. Disponível em: http://conteudojuridico.com.br/?artigos&ver=2.27084.
Acesso em: 24 de dez. de 2.012.
CARDOSO ARAGÃO, Valdenir. Aspectos
da responsabilidade civil ojbetiva. Âmbito jurídico. Disponível em: http://www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=2352.
Acesso em: 24 de dez. de 2.012.
CONVERGÊNCIA VIRTUAL. http://convergenciadigital.uol.com.br/cgi/cgilua.exe/sys/start.htm?infoid=31550&sid=4.
Acesso em: 24 de dez. de 2.012.
_____.http://convergenciadigital.uol.com.br/cgi/cgilua.exe/sys/start.htm?infoid=30407&sid=4.
Acesso em: 24 de dez. de 2.012.
GARCIA, Leonardo de
Medeiros. Direito de consumidor: código comentado, jurisprudência, doutrina,
questões, decreto n 2.181/97. 6. ed. rev., ampl. e atual. pelas leis n. 11.989/2009
e 12.039/2009. Niterói: Impetus. 2.012.
Jurisprudências
utilizadas
TJAC; Rec. 0002049-48.2010.8.01.0070;
Ac. 4.846; Relª Juíza Mirla Regina da Silva Cutrim; DJAC 12/04/2011.
TJRS; AC 70027564392; Porto
Alegre; Sexta Câmara Cível; Rel. Des. Antônio Corrêa Palmeiro da Fontoura; Julg.
23/09/2010; DJERS 18
Notas
[1] CONVERGÊNCIA VIRTUAL. http://convergenciadigital.uol.com.br/cgi/cgilua.exe/sys/start.htm?infoid=31550&sid=4.
Acesso em: 24 de dez. de 2.012.
[2] CONVERGÊNCIA VIRTUAL. http://convergenciadigital.uol.com.br/cgi/cgilua.exe/sys/start.htm?infoid=30407&sid=4.
Acesso em: 24 de dez. de 2.012.
[3] CARDOSO ARAGÃO,
Valdenir. Aspectos da responsabilidade civil ojbetiva. Âmbito jurídico. Disponível
em: http://www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=2352.
Acesso em: 24 de dez. de 2.012.
[4] TJAC; Rec. 0002049-48.2010.8.01.0070;
Ac. 4.846; Relª Juíza Mirla Regina da Silva Cutrim; DJAC 12/04/2011.
[5] TJRS; AC 70027564392;
Porto Alegre; Sexta Câmara Cível; Rel. Des. Antônio Corrêa Palmeiro da
Fontoura; Julg. 23/09/2010; DJERS 18/10/2010.
[6] GARCIA, Leonardo de
Medeiros. Direito de consumidor: código comentado, jurisprudência, doutrina,
questões, decreto n 2.181/97. 6. ed. rev., ampl. e atual. pelas leis n. 11.989/2009
e 12.039/2009. Niterói: Impetus. 2.012. p.
298.
[7] BARRETO DE SOUZA, Déborah.
O direito de arrependimento nos contratos eletrônicos. Conteúdo Jurídico. Disponível
em: http://conteudojuridico.com.br/?artigos&ver=2.27084. Acesso em: 24 de
dez. de 2.012.
Por Vinicius de Almeida Gonçalves
Fonte JusNavigandi