Entrou em vigor no dia 18 o novo Código de Processo Civil (CPC), Lei
13.105/15. Primeiro CPC adotado no país em plena vigência da democracia, o
texto que passou por quase cinco anos de debates no Congresso Nacional, busca
garantir maior efetividade aos princípios constitucionais e nasce com a
promessa de assegurar processos judiciais mais simples e rápidos.
Com
o novo código, recursos são extintos e multas aumentam para quem recorrer
apenas para adiar decisões. Além disso, a Justiça deve ganhar rapidez com o
mecanismo de julgamento de recursos repetitivos, que permitirá a aplicação de
uma decisão única para processos iguais. O texto determina ainda a criação de
centros judiciários para que se promova a solução consensual de conflitos.
Para
o ex-presidente do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, que
integrou a comissão de juristas responsáveis pelo anteprojeto que resultou no
novo CPC, Marcus Vinícius Furtado Coêlho, o grande problema do Judiciário
brasileiro é a morosidade que precisa ser enfrentada.
O
advogado acrescentou que a questão é agravada por mais de 100 milhões de
processos que tramitam na Justiça brasileira, especialmente na primeira
instância, e pela falta de recursos humanos para julgar essa demanda. “ A
sociedade brasileira não está disposta a gastar mais recursos com o judiciário,
por isso o novo CPC se apresenta com alternativas criativas, para diminuir a
burocracia da tramitação e os obstáculos que impedem o andamento rápido do
processo", explicou Marcus Vinícius.
Nesse
sentido, especialistas ouvidos pela Agência Brasil foram unânimes em dizer que
um dos pontos altos do novo código é o estimulo à mediação e à conciliação. O
código prevê que a tentativa de conciliação deve ocorrer no início de todas as
ações cíveis. O entendimento é de que a decisão quando é alcançada por meio de
uma conciliação põe fim definitivo à questão.
“O
que estava acontecendo com o código antigo, que era de 1973, é que ele foi se
desmontando. O novo código, não é uma maravilha, mas vem tentar resolver pelo
menos uma nova sistemática à prestação da atividade jurisdicional, que é
consagrada em uma sentença e no cumprimento dela. Nesse particular,
indubitavelmente o novo código é um avanço muito grande", disse o
professor de processo civil da Universidade de Brasília, Jorge Amaury Maia
Nunes.
Ações coletivas
Entre
as novidades do novo código está ainda a possibilidade de ações individuais
serem transformadas em coletivas. Antes, as partes serão consultadas para
verificar se aceitam a conversão do processo.
Vinculação de decisões
Até
ontem, apenas as súmulas vinculantes do Supremo Tribunal Federal deveriam ser
seguidas pelos outros tribunais. A partir de hoje, os tribunais devem
necessariamente seguir decisões do plenário do Supremo em matéria constitucional
e do Superior Tribunal de Justiça (STJ) em outros temas. Se não houver decisão
dos tribunais superiores, a primeira instância necessariamente deve seguir a
segunda instância (tribunais de Justiça estaduais ou tribunais regionais
federais).
Recursos
O
novo CPC retira a possibilidade de agravo de instrumento para decisões
intermediárias sobre provas e perícias, por exemplo. Acabam os chamados
embargos infringentes - recurso apresentado em decisões colegiadas com apenas
um voto contrário -, mas prevê que o caso seja reavaliado por outra composição
de juízes. Além disso, a cada nova instância que recorrer e perder, a parte
passa a pagar as custas do processo e os honorários, e não somente no fim do
processo em caso de derrota.
Ações repetitivas
Uma
mesma decisão poderá ser aplicada a várias ações individuais que tratam do
mesmo tema. Entre as ações que podem ser beneficiadas estão, por exemplo,
processos contra planos de saúde, empresas de telefonia e concessionárias de
automóveis. Nesses casos, todas as ações de primeira instância serão
paralisadas até que a segunda instância tome uma decisão sobre uma amostra de
casos.
Ordem cronológica
Também
no novo CPC está a regra que estabelece que os juízes terão que julgar
processos pela ordem de chegada. A medida evitará que ações novas sejam
julgadas antes de antigas. Situações excepcionais e causas relevantes continuam
tendo prioridade.
Testemunhas
Para
dar mais agilidade às ações, caberá aos advogados das partes notificar as
testemunhas do processo e levá-las a juízo. Caso elas não compareçam, o
processo vai correr sob o entendimento de que a testemunha foi dispensada. Até
então, audiências de instrução para ouvir testemunhas são remarcadas
sucessivamente pelo fato de essas pessoas não terem sido localizadas pelos
oficiais de Justiça, por apresentarem atestado médico, ou ainda por
simplesmente não atenderem à intimação.
Condômino inadimplente
O
condômino inadimplente é obrigado pagar a dívida com o condomínio em até três
dias, sob pena de penhora do imóvel. O devedor terá três dias para pagar o
débito, ou terá seu imóvel penhorado. A lei só dá uma alternativa para o
devedor: fazer pagamento parcelado em seis vezes
Divórcio
A
separação judicial de casais é permitida antes de eles decidirem entrar com
pedido de divórcio. Assim, eles terão a possibilidade de reverter a decisão da
separação com mais facilidade, caso desejem. O texto mantém a possibilidade de
o casal partir diretamente para o divórcio, o que é previsto pela Constituição
desde 2010. Antes, o divórcio só era permitido um ano depois da separação
formal ou dois anos após a separação de fato.
Pensão alimentícia
Após
a decisão judicial, depósito de pensão alimentícia deverá ser feito em três
dias. No caso de não pagamento, o devedor será preso em regime fechado, mas em
cela separada, pelo prazo de 1 a 3 meses.
Reintegração de posse
Audiências
públicas terão que ser realizadas para ouvir todos os lados antes de decidir
sobre a reintegração, quando o local estiver ocupado por mais de 12 meses.
Regulamentação
Alguns
dispositivos do novo Código de Processo Civil ainda dependem de regulamentação
pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Uma consulta pública sobre algumas
temas foi aberta até 4 de abril no site do órgão. Todas as propostas de
resolução passarão pelo plenário do CNJ, para discussão e posterior aprovação
pelo colegiado. Um dos temas diz respeito aos mediadores.
Na
lista de temas abertos para sugestões estão comunicações processuais e Diário
da Justiça eletrônico, leilão eletrônico, atividade dos peritos, honorários
periciais, demandas repetitivas e atualização financeira.
Após
o prazo da consulta, as sugestões serão analisadas pelo grupo de trabalho para
regulamentação do novo CPC. Todas as propostas de resolução passarão pelo
plenário do CNJ, para discussão e aprovação pelo colegiado.
Insatisfações
Uma
das maiores críticas feitas por juízes à norma diz respeito aos julgamentos
virtuais. Para Thiago Brandão, da Comissão da Associação dos Magistrados
Brasileiros (AMB) que analisou e colaborou com críticas e sugestões ao novo
CPC, o código avançou quando foi aprovado, mas recentemente foi aprovada uma
lei (13.256) que revogou o Artigo 945, justamente o que regulamentava o
plenário virtual. A AMB e a Associação Nacional dos Magistrados do Trabalho (Anamatra)
chegaram a pedir o veto dessa lei, mas não foram atendidos. "O plenário
virtual é uma alternativa mais célere ao presencial e não oferece nenhum
prejuízo ao processo, uma vez que ele só é possível quando as partes concordam.
O trabalho já é feito pelos tribunais, mas o Artigo 945 uniformizaria essa
ferramenta de julgamento. Agora, continuaremos na mesma situação atual, com
cada tribunal regulamentando o tema de forma individual, desde que preservando
os interesses das partes" explicou o juiz.
A
AMB também avalia que o CPC não vai cumprir uma de suas promessas: reverter o
chamado efeito da apelação. A ideia inicial, segundo a entidade, era de que a
sentença proferida produzisse efeitos imediatos, o que fortaleceria o trabalho
dos juízes de primeiro grau. Na prática, o juiz Thiago Brandão explicou que
tudo vai continuar como já é, ou seja, os recursos precisam ser julgados antes
de um resultado efetivo.
Outra
questão é a boa-fé. "Embora o CPC traga punições para quem romper com esse
princípio, elas são muito tímidas. Existe um limite máximo. Acreditamos que
mais eficiente seria o juiz definir a punição caso a caso, porque, em algumas
situações, as partes podem avaliar que a multa vale a pena. Alertamos para esse
ponto, inclusive. Os artigos 77 e 81 estipulam o máximo de 20% sobre o valor da
causa ou, quando a causa tiver um valor irrisório, dez vezes o salário
mínimo", ressaltou.
Vantagens
Em
defesa do texto, o ministro do Tribunal de Contas da União Vital do Rêgo, que à
época da elaboração do código era relator da proposta no Senado, disse que dada
a complexidade do tema e o número de sugestões recebidas o resultado final foi
impressionante. “Algumas coisas que poderiam estar mais completas foram vetadas
pela presidenta Dilma Rousseff, mas isso aconteceu até obedecendo uma
necessária reflexão que o Supremo fez, que o STJ fez, de algumas matérias.
Acredito que 95% do projeto foram concebidos, talvez esse restante que ainda
possa estar faltando, e eu não posso me antecipar ao que possa ser, venha com o
dia a dia do direito, das práticas que vão ocorrer”, observou.
Por
Graça Adjuto
Fonte
Agência Brasil