Contei
meus anos e descobri que terei menos tempo para viver daqui para a frente do
que já vivi até agora.
Tenho
muito mais passado do que futuro.
Sinto-me
como aquele menino que recebeu uma bacia de cerejas. As primeiras, ele chupou
displicente, mas percebendo que faltam poucas, rói o caroço.
Já
não tenho tempo para lidar com mediocridades. Não quero estar em reuniões onde
desfilam egos inflamados. Inquieto-me com invejosos tentando destruir quem eles
admiram, cobiçando seus lugares, talentos e sorte.
Já
não tenho tempo para conversas intermináveis, para discutir assuntos inúteis
sobre vidas alheias que nem fazem parte da minha. Já não tenho tempo para
administrar melindres de pessoas, que apesar da idade cronológica, são
imaturas.
Detesto
fazer acareação de desafetos que brigaram pelo majestoso cargo de secretário
geral do coral.
As
pessoas não debatem conteúdos, apenas os rótulos. Meu tempo tornou-se escasso
para debater rótulos, quero a essência, minha alma tem pressa.
Sem
muitas cerejas na bacia, quero viver ao lado de gente humana, muito humana; que
sabe rir de seus tropeços, não se encanta com triunfos, não se considera eleita
antes da hora, não foge de sua mortalidade, quero caminhar perto de coisas e
pessoas de verdade.
O
essencial faz a vida valer a pena.
E
para mim, basta o essencial!
Mario de Andrade