A
Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) considerou abusiva a
cláusula contratual que prevê a imputação, ao devedor em mora, de
responsabilidade ampla e sem limites pelo pagamento de honorários advocatícios
extrajudiciais.
No
caso em questão, o Instituto de Defesa do Consumidor do Amapá (Procon/AP)
ajuizou ação civil pública contra a União das Faculdades de Macapá (Fama) por
exigir honorários advocatícios em cobrança administrativa de alunos
inadimplentes. A Associação Educacional da Amazônia (Asseama) ingressou na ação
como interessada.
O
juízo de primeiro grau reconheceu que a cobrança extrajudicial de dívidas de
consumidores não enseja o pagamento de honorários advocatícios contratados
facultativamente pelo credor.
A
sentença foi parcialmente reformada pelo Tribunal de Justiça do estado, que
aplicou o artigo 395 do Código Civil (CC) para reconhecer a licitude da
contratação de cláusula expressa que imponha ao consumidor em mora o pagamento
das despesas decorrentes de honorários advocatícios, mesmo que a cobrança seja
efetivada pela via extrajudicial.
O
Procon recorreu ao STJ reiterando que tal cobrança é abusiva e viola o artigo
51, XII, do Código de Defesa do Consumidor (CDC). Sustentou que a cláusula de
imputação de responsabilidade pelo pagamento de honorários advocatícios
decorrentes de cobrança de débitos caracteriza ilícita transferência de ônus
decorrente do risco do negócio para o consumidor. Diante da nulidade, requereu
que a cláusula fosse retirada dos contratos.
A
Fama contestou os argumentos. Para ela, o afastamento da possibilidade de
contratação da responsabilidade do devedor em mora pelos honorários
advocatícios contraria expressa disposição legal do artigo 395 do CC.
Contrato de adesão
A
relatora do recurso no STJ, ministra Nancy Andrighi, reconheceu que os artigos
389, 395 e 404 do CC de 2002 inserem expressamente a possibilidade de
restituição de valores relativos a honorários advocatícios, independentemente de
previsão contratual. Contudo, ressaltou que o caso em análise envolve contrato
consumerista por adesão, em que o espaço negocial de ambas as partes é
limitado.
Segundo
a relatora, o artigo 51, XII, do CDC, ao disciplinar o tratamento conferido às
cláusulas abusivas em contratos de consumo, prevê de forma expressa a nulidade
das cláusulas contratuais que obriguem o consumidor a ressarcir os custos de
cobrança de sua obrigação, sem que igual direito seja conferido ao consumidor.
Portanto,
para a justa solução da presente controvérsia, deve-se analisar o atendimento e
a relação dos honorários advocatícios com sua finalidade específica, para que
se compreendam os exatos limites do adequado exercício do direito, afirmou em
seu voto.
Prestação de serviço
Para
a ministra Nancy Andrighi, os valores referentes à remuneração profissional do
advogado somente têm cabimento quando se verifica a efetiva prestação de
serviço profissional, conforme o Enunciado 161 do Conselho da Justiça Federal.
Por
consequência lógica, afasta-se a cobrança de honorários advocatícios quando não
houver prestação de qualquer serviço que se adeque àqueles tipicamente
previstos na legislação, tais como os atos de mera cobrança por telefone,
correspondências físicas ou eletrônicas e outros meios semelhantes, enfatizou.
A
ministra admitiu a possibilidade de cobrança de honorários contratuais
decorrentes de contrato de prestação de serviços advocatícios extrajudiciais,
desde que a efetiva contratação de advogado seja estritamente necessária após
tentativas amigáveis frustradas, e da comprovação da efetiva prestação de
serviços privativos de advogado, o que afasta sua incidência para serviços
gerais de cobrança administrativa.
Na
hipótese dos autos, concluiu a ministra, uma vez que o contrato previu, de
forma ampla e ilimitada, a possibilidade de ressarcimento dos honorários,
bastando apenas que o consumidor esteja inadimplente, tem-se caracterizada a
abusividade da cláusula contratual, que deverá ser afastada, nos termos do
artigo 46 do CDC.
Assim,
por unanimidade, a Turma deu provimento ao recurso especial do Procon para
reconhecer como abusiva a cláusula contestada ante o descumprimento dos limites
expostos no voto da relatora.
Fonte
Idec