quarta-feira, 26 de abril de 2017

RESPONSABILIDADE DAS COMPANHIAS AÉREAS POR ATRASOS E OVERBOOKING NOS VOOS


A reparação moral não estará prejudicada mesmo que todos os deveres anexos ao contrato principal de transporte aéreo sejam observados, desde que o consumidor comprove inequivocamente que sofreu prejuízos pelo atraso excessivo verificado.
O presente trabalho tem por finalidade analisar a responsabilidade das Companhias Aéreas por atrasos e overbooking nos vôos e os direitos dos consumidores ao se depararem com estas situações desconfortáveis.
Como base legal e teórica utilizar-se-á o Código de Defesa do Consumidor, bem como Resoluções Normativas da ANAC.

1. Noções Introdutórias
É notório o incremento da utilização do transporte aéreo pela população brasileira. Esse aumento, verdadeiramente exponencial, no entanto, não foi acompanhado pelo desenvolvimento da infraestrutura do setor, eis que as Companhias Aéreas Operadoras não realizaram os investimentos necessários para poder atender com eficiência a demanda que se lhes apresentou.
O resultado prático deste conjunto de fatores é o que se convencionou denominar de “Caos Aéreo”, que consiste em inúmeros e reiterados atrasos nos vôos, preterição de embarque (overbooking), somado à falta de informação aos passageiros e, não raro, nenhuma prestação de auxílio material por parte das Companhias Aéreas.
Mencionadas condutas, em que pese representar prática habitual das Companhias Aéreas, são atentatórias ao Código de Defesa do Consumidor e às Resoluções Normativas da ANAC e, por conseguinte, geram em favor do consumidor o direito à reparação pelos danos indevidamente sofridos.

2. Dos deveres das Companhias Aéreas nos casos de atraso e preterição de embarque
Apesar de não existirem maiores formalidades para a aquisição de passagens aéreas, a negociação empreendida entre as Operadoras e os passageiros representa a celebração de verdadeiro contrato.
Dessa forma, estabelecem-se obrigações recíprocas entre as partes, cabendo ao consumidor pagar o valor da passagem e, em contrapartida, às Operadoras Aéreas disponibilizar o vôo no horário fixado.
No entanto, a complexidade inerente ao serviço de transporte aéreo por muitas vezes enseja atrasos nos vôos que, se excessivos, impõem às Companhias Aéreas à adoção de deveres anexos, sob pena de inadimplemento contratual.
A primeira questão que se coloca, então, é saber o que se considera como atraso excessivo para fins de observância dos mencionados deveres anexos. Por certo a expressão induz ao subjetivismo sendo passível de interpretações distintas de acordo com o interessado.
Buscando eliminar a abrangência subjetiva do termo, a ANAC, através de sua Resolução Normativa nº 141/2010, estabeleceu como paradigma o prazo de 04 horas, sendo certo que após o seu transcurso, às Operadoras Aéreas caberá a adoção de medidas compensatórias.
Dispõe o art. 3º da mencionada Resolução Normativa que incumbirá ao transportador, em caso de atrasos de mais de 04 horas, oferecer ao passageiro sua reacomodação em vôo próprio que preste serviço equivalente, ou que apresente horário e data de sua conveniência, ou mesmo o reembolso do valor pago.
Deverá ainda ser conferido ao passageiro que comparecer ao embarque a disponibilização de auxílios materiais, nos termos do art. 14, § 1º, da Resolução Normativa nº 141/2010, nos seguintes termos:

Art. 14. Nos casos de atraso, cancelamento ou interrupção de voo, bem como de preterição de passageiro, o transportador deverá assegurar ao passageiro que comparecer para embarque o direito a receber assistência material.
§ 1º A assistência material consiste em satisfazer as necessidades imediatas do passageiro, gratuitamente e de modo compatível com a estimativa do tempo de espera, contados a partir do horário de partida originalmente previsto, nos seguintes termos:
I - superior a 1 (uma) hora: facilidades de comunicação, tais como ligação telefônica, acesso a internet ou outros;
II - superior a 2 (duas) horas: alimentação adequada;
III - superior a 4 (quatro) horas: acomodação em local adequado, traslado e, quando necessário,serviço de hospedagem.

Além disso, as Operadoras Aéreas devem manter sempre informados os seus passageiros, e por escrito se assim solicitarem, inclusive com a previsão de partida atualizada de seus vôos, tudo em conformidade com a regulamentação normativa do setor e o Código de Defesa do Consumidor.
O mesmo ocorre nas hipóteses de overbooking, sendo o auxílio material, a necessidade de informação, inclusive por escrito, e as alternativas de prestação de serviço informadas igualmente devidas.

3.Da responsabilidade das Companhias Aéreas nos casos de atraso de vôos e preterição de embarque
Pois bem, como anteriormente informado, em se verificando atrasos excessivos, ou preterição de embarque, às Operadoras Aéreas se impõe a adoção de medidas compensatórias consistentes nos denominados deveres anexos, sob pena de inadimplemento contratual.
A inércia e omissão das Companhias Aéreas, que não raro mantém seus passageiros desinformados, sem acesso à Internet ou outros meios de comunicação, alimentação e local para se acomodar, além de configurar violação ao contrato, gera dissabor e desconforto passíveis de indenização por danos morais, bem como o dever correlato de restituir todos os gastos com o auxílio material indevidamente suprimido.
O overbooking, por sua vez, configura manifesta falha na prestação de serviços e decorre não só da suposta desorganização das Companhias Aéreas, mas verdadeiramente de sua irrefreada ânsia por lucro que a leva a vender mais passagens do que dispõe, acreditando em eventuais desistências que, quando não ocorrem, acarretam dano e desconforto por vezes irreparáveis aos passageiros.
Dessa forma, independentemente de culpa ou dolo, a reparação pelos prejuízos materiais e morais se impõe, eis que neste caso a preterição de embarque não viola, em regra, os deveres anexos antes mencionados, mas o próprio objeto do contrato que consiste na disponibilização de voo no horário escolhido pelo consumidor.
 Por derradeiro, ressaltamos que advogamos a tese de que a adoção pelas Companhias Aéreas de todas as medidas compensatórias previstas, não prejudica eventual pleito indenizatório na esfera judicial.
Isso porque o consumidor tem legítima expectativa na prestação do serviço de acordo com o contratado, razão pela qual não raro se organiza, seja para encontrar familiares, seja para participar de reuniões de negócio, ou mesmo passeios turísticos, de acordo com o horários de seu voo.
Neste sentido, ainda que todas as medidas compensatórias sejam adotadas, isto é, oferecida alimentação, local de descanso, translado, hospedagem, se o passageiro comprovar que sofreu prejuízo por conta do atraso inesperado, mesmo o de ordem moral, deverá ser por ele ressarcido, independentemente de culpa da Companhia Aérea que, nos termos do Código de Defesa do Consumidor, assume os riscos do negócio que presta.
Em outras palavras, mesmo que as companhias aéreas prestem as medidas compensatórias estabelecidas pela ANAC em casos de atraso, ainda assim estará caracterizado o dever de indenizar por prejuízos causados por tais condutas.
Por outro lado, a não prestação das medidas compensatórias caracteriza um agravamento do dano sofrido pelos passageiros em razão do atraso e, por isso, deve conduzir necessariamente a uma majoração de eventual indenização que venha a ser fixada pelo Judiciário.

Conclusão
Pelo exposto, devem as Companhias Aéreas responder judicialmente pelo desconforto proporcionado aos seus passageiros em virtude da não prestação de auxílio material, que lhe é atribuída pela Resolução Normativa nº 141/2010, da ANAC, nos casos de atraso de voo, ou preterição de embarque.
Devem responder também nas hipóteses de overbooking, eis que evidente a falha na prestação de serviço por violação direta ao objeto principal do contrato de transporte aéreo.
Não obstante, a reparação moral não estará prejudicada mesmo que todos os deveres anexos ao contrato principal de transporte aéreo sejam observados, desde que o consumidor comprove inequivocamente que sofreu prejuízos pelo atraso excessivo verificado.

Por Daniel Menegassi Reichel
Fonte Jus Naviganti