Selecionamos 24 dicas para advogados, promotores e concurseiros melhorarem as suas peças
jurídicas. O pequeno manual foi produzido pelos procuradores da República
Gustavo Torres Soares e Bruno Costa Magalhães
1 – Um bom texto é simples, claro, objetivo
e gramaticalmente correto: simplicidade: embora obediente à língua culta, seu
texto deve ser acessível, com o mínimo de erudição possível (diga “também” ou
“igualmente” em vez de “outrossim”).
2 – clareza: fuja da ambiguidade, do “duplo
sentido”, da ironia, do conteúdo implícito; seja explícito em suas idéias.
3 – objetividade: os juízes e tribunais têm
pouco tempo; por isso, em textos jurídicos, “sendo completo, quanto menor,
melhor”.
4 – correção gramatical: é ideal a ser
perseguido por toda a vida; o único modo de se aprender gramática é,
infelizmente, estudando-a; a leitura de escritores clássicos ajuda, mas não
substitui o estudo da gramática.
5 – Dê espaço de quatro centímetros para a
margem esquerda, para evitar que a autuação dificulte a leitura da
manifestação.
6 – Os destaques (CAIXA ALTA, negrito,
sublinhado, itálico, texto recuado etc.) devem ser usados com moderação, de
modo que só os elementos que realmente o mereçam sejam destacados. Exemplos:
são dignos de destaque o cabeçalho (nº do processo etc.), os itens e subitens
da petição, a (s) palavra (s)-chave na conclusão de tese desenvolvida na
petição, o nome da demanda proposta ou ato processual praticado (ação civil
pública, denúncia, promoção de arquivamento etc.), o nome das partes
envolvidas; não necessitam de destaque o nome de testemunhas, juízes, tribunais
ou autores.
O destaque CAIXA ALTA, por ser muito
espalhafatoso, deve ser evitado ou exclusivamente reservado para o (s) réu (s).
E lembre-se: as aspas (“”) não são mero destaque, mas demonstração de citação,
ironia, trocadilho, ambiguidade evidente e proposital, grande excepcionalidade,
ditado popular, frase-feita ou estrutura rígida de palavras – fora desses
casos, as aspas tendem a estar mal empregadas.
7 – No início da manifestação, evite dizer
que “o Ministério Público Federal vem expor e requerer o que se segue” ou que
“o Ministério Público Federal vem se manifestar nos termos seguintes” – seja
direto, desde o início: “Trata-se de requerimento de viagem internacional,
formulado pelo acusado…” ou “O acusado requer, na f. 87, autorização judicial
para…”.
No final da manifestação, não é necessário
escrever “Nestes termos, pede deferimento”, pois tal desejo de deferimento já
está logicamente implícito nos pedidos e requerimentos expressamente deduzidos.
8 – Nas defesas, ou denúncias, imediatamente
após qualificar o (s) acusado (s), crie tópico denominado “Síntese fática” e,
ali, narre, baseando-se nos dados já obtidos pela investigação, a (s) conduta
(s) penalmente típica (s) a ele (s) imputada (s), com todas suas elementares,
causas de aumento e, se possível, também as circunstâncias agravantes, de modo
a responder: quem? Quando? Onde? O que? Como? Por que? Para que? Com quem?
Contra quem?
9 – Uma peça, por mais simples que seja, é
manifestação única, autônoma. Devemos contextualizar a peça: ela tem que
indicar sua razão de existir, ainda que sucintamente. Faça a pergunta: Se
alguém ler a peça, isolada (e – é certo – várias pessoas a lerão isoladamente),
haverá necessidade, para que ela seja compreendida, de que se consultem outras
peças e documentos processuais? Se a compreensão da peça (aqui não estamos
falando de construção do convencimento jurídico), se para sua simples
compreensão houver necessidade de consultar outras peças processuais, é sinal
de que sua peça não disse suficientemente a que veio. Por isso, evitemos dizer:
“O Ministério Público Federal, em
atendimento ao despacho de f. 145 e considerando o ofício de f. 143, reitera
sua manifestação de f. 141, para que seja reiterado o ofício de f. 139”.
A nossa manifestação não deve forçar o
leitor a se aprofundar em pesquisas para decifrar o seu significado. Deixemos
essa importante tarefa para os poetas e para os correspondentes de guerra!
Preferiremos nos manifestar assim, por
exemplo:
“O Ministério Público Federal, em
atendimento ao despacho de f. 145, informa que, segundo o ofício de f. 143,
emitido pela Receita Federal do Brasil em Guarulhos, o parcelamento da dívida
consolidada no procedimento administrativo nº 10830.005902/2006-10, em nome da
sociedade empresária PREGOS & BROCAS LTDA. está sendo regularmente
cumprido.
Por isso, o MPF aguarda a vinda de novas
informações sobre a cumprimento do parcelamento; caso elas não sejam trazidas
aos autos em três meses, requer, desde já, para esse fim, a expedição de ofício
requisitório à Receita Federal do Brasil em Guarulhos. Com a resposta,
aguarda-se nova vista, para manifestação”.
A manifestação, assim redigida, fica bem
mais longa. Em contrapartida, disse absolutamente tudo o que tinha a dizer, sem
meias-palavras. Em geral, com a repetição de manifestações sobre a mesma
situação, sequer teremos o trabalho de elaborar a estrutura do texto – bastando
cuidar das adaptações pontuais.
10 – Outros exemplos: dizer cumprimento “da
decisão” (você sabe qual, mas quem está lendo não sabe – deve-se, no mínimo,
fazer menção à folha em que ela está e, melhor ainda, ao seu comando: “da
decisão que suspendeu o processo e o curso da prescrição”); escrever
“entendimento majoritário do tribunal” (sem mencionar no mínimo três acórdãos
que expressem, ou pelo menos indiciem, a maioria) pode parecer embromação;
dizer que o Ministério Público “concorda o disposto à f. tal e requer o
prosseguimento do feito em seus ulteriores termos” pode indicar que a dita
‘folha tal’ não foi analisada coisíssima nenhuma e de que estamos mais perdidos
no processo do que cego em tiroteio – porque, geralmente, quem pede que o processo
siga “em seus ulteriores termos” é porque não sabe ou está com preguiça de
analisar quais devem ser os próximos passos do procedimento.
Esse tópico pode ser resumido em uma
palavra: se você fez a análise do processo, sua manifestação deve espelhar,
ainda que sucintamente, essa análise – que inclusive servirá para as futuras
consultas ao processo, como uma espécie de síntese do que foi feito até aquele
ponto.
11 – A abreviação para a palavra “folha” é
“f.”, seja no singular, seja no plural. Por isso, evite usar “fl.” ou “fls.”. O
intervalo entre folhas é designado por um hífen (-), não pela consagrada barra
(/), que, rigorosamente, indica número fracionário (por exemplo: 3/5 significa
“três quintos” e não “de três a cinco”). O correto é “na f. 10”, “de f. 12”,
“nas f. 10-12”, “de f. 10-12”.
12 – A abreviação de “número” é n. ou nº,
não “n.º”.
13 – Evitar adjetivos desnecessários, como
“o ilustre Pontes de Miranda”, “o magistral ensinamento do saudoso Nélson
Hungria”, “o colendo Supremo Tribunal Federal”. Exceções: a referência ao juiz
ou tribunal da causa, para agradar o julgador ou amenizar crítica a ser
proferida, pode ser precedida de elogio moderado (exemplo: “digno juiz”, “culto
magistrado”, “douto juízo”, “egrégio tribunal” etc.)
14 – O adjetivo “anexo” deve ser assim
utilizado: “as provas anexas”, “o arquivo anexo”; não se deve escrever “as
provas em anexo” ou “o arquivo em anexo”. Por outro lado, atente-se para a
situação do documento referido: se ele figura como elemento secundário de
petição ainda não juntada, ele se encontra “anexo” ou “acostado” (ou seja, nas
costas), apenso ao elemento principal; se ele já está dentro dos autos, está
“juntado nas f. 49-56”, “inserido nas f. 43-60”, “encartado nas f. 23-25”.
15 – A expressão “sendo que”, quase sempre,
é modo artificial de prolongar frase que deveria ter sido desdobrada, através
de ponto e vírgula ou ponto. Em vez de dizer “dois técnicos da ANATEL
identificaram a rádio clandestina, sendo que no local foram encontrados os
respectivos equipamentos”, diga “dois técnicos da ANATEL identificaram a rádio
clandestina; no local foram encontrados os respectivos equipamentos”.
16 – A sigla “etc.” significa “et coetera”
ou seja “e outros” (“e os restantes”). Por isso, como “etc.” já contém a
conjunção e, não é correto usar e ou vírgula antes de tal sigla.
17 – Evite a expressão “menor” (policialesca
e anterior ao ECA), preferindo “criança” (até 11 anos) ou “adolescente” (entre
12 e 17 anos).
18 – Ao abordar valores numéricos, dê
preferência à forma por extenso. Evite, por exemplo, escrever “ele procurou o
guichê de atendimento por 3 vezes”, preferindo “ele procurou o guichê de
atendimento por três vezes”. Exceções:
·
expressões
de valores em moeda. Nesse caso, colocar o valor em numeral (p. ex.: R$ 1.250,00).
·
datas:
usar a forma “10.11.2006”;
·
em
geral, para indicar quantidades superiores a vinte;
·
os
nomes de tribunais regionais federais podem, indiferentemente, ser grafados em
numeral ordinal ou por extenso (tanto é correto escrever “Tribunal Regional
Federal da Terceira Região” quanto grafar “Tribunal Regional Federal da 3ª
Região” – aparentemente, os TRFs até preferem a segunda forma, com numeral
ordinal); e
·
claro,
para fazer menção às folhas do processo.
19 – Salvo quando o valor mereça ser
destacado (por ser muito alto ou ínfimo, estranhamente coincidente ou
divergente de outro valor relevante etc.), não é imprescindível escrever valor
monetário por extenso – prática útil em cheques e em contratos (nos quais a
possibilidade de fraude é grande), mas pouco necessária em trabalhos retóricos.
Todavia, se for o caso de se escrever por extenso, a grafia de R$ 1.250,00 é
“mil, duzentos e cinqüenta reais”, e não “um mil, duzentos e cinqüenta reais”,
tampouco “hum mil, duzentos e cinqüenta reais”, formas adotadas em cheques para
se evitarem golpes.
No caso de medidas precisas de massa,
espaço, tempo etc., embora não seja obrigatório, costuma ser útil a redação do
numeral arábico e por extenso: “1,349 g (mil, trezentos e quarenta e nove
gramas)”, “3.547 m2 (três mil, quinhentos e quarenta e sete metros quadrados)”,
14h37min (quatorze horas e trinta e sete minutos).
20 – Quando citar passagens do processo,
fatos e documentos importantes, SEMPRE MENCIONAR AS FOLHAS em que está a
informação. Isso facilita enormemente o trabalho de correção da peça e de
compreensão de seu conteúdo e significado. Além de ser prova de dedicação e
efetiva análise do processo. Mas ATENÇÃO: após o oferecimento das denúncias (e
outras petições iniciais), pode ocorrer repaginação no Judiciário, de modo que
o número de determinada folha no inquérito policial acabe sendo outro em sede
judicial; uma forma de se evitar levar o julgador a erro é dizer, entre
parênteses, logo no cabeçalho da denúncia:
(ATENÇÃO: Os números de página aqui
mencionados se referem à ordenação dada pela Polícia, de modo que poderão ser
alterados após eventual repaginação judicial)
21 – Evite utilizar linguagem de telegrama:
“Laudo pericial, f. 12-14” ou “Juntada folha de antecedentes às f. 167-170”. As
orações, em geral, devem ter sujeito e predicado. Então, prefira: “O laudo
pericial foi juntado nas f. 12-14”, “A folha de antecedentes foi inserida nas
f. 167-170” ou “Foi encartada a folha de antecedentes nas f. 167-170”.
22 – Outra impropriedade linguística:
costuma-se dizer que “o laudo toxicológico foi anexado/acostado/apensado nas f.
30-33 dos autos”; rigorosamente, “anexar” significa “reunir (o que era
independente) a outra coisa, considerada principal”; “acostar” remete a
“costas”; e apensar é “juntar como apenso (de outra coisa, considerada
principal)”; ou seja: salvo nas situações em que haja realmente a junção de
feito principal e feito acessório (de modo que este foi/será
anexado/acostado/apensado naquele), prefira dizer que “o laudo toxicológico foi
juntado/inserido/encartado/aposto/alocado nas f. 30-33 dos autos”.
23 – Segundo a ABNT, a forma correta de se
mencionar o município e a unidade da federação é a seguinte: Guarulhos, SP –
seguida ou não de vírgula, a depender do contexto. Não utilizaremos, pois,
“Guarulhos/SP”, “Guarulhos/S.P.” ou “Guarulhos, São Paulo”.
24 – Todas as páginas das manifestações
deverão ser numeradas, de preferência do modo como se fez neste “mini-manual”:
“1/7”, “2/7”, “3/7”, “4/7”, “5/7”, “6/7” e “7/7”.Atenção: “f. 1/7” significa
“página 1, dentro do total de 7”; “f. 1-7” signifca “da folha 1 à folha 7”.
Fonte Justificando.cartacapital