Devido à semelhança com as disputas por
guarda e visita de crianças e adolescentes, animais domesticados não podem mais
ser classificados apenas como coisas ou objetos, por isso devem ser
reconhecidos como membros de um núcleo familiar.
Assim entendeu a 7ª Câmara de Direito
Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo ao reconhecer que as varas de
Família são competentes para solucionar questões relativas à guarda e à visita
de animais de estimação.
O processo analisado envolve um casal que
vivia em união estável e, durante o período sob o mesmo teto, adotaram um
cachorro. Com o término do relacionamento, a mulher ficou com a posse do cão, e
passou a impedir que o ex-companheiro tivesse acesso a ele.
Na ação de reconhecimento e dissolução da
união estável, a Defensoria Pública pediu a posse compartilhada e a
regulamentação de visitas em relação ao cachorro, porém o juízo de primeira
instância julgou extinta a ação sem resolução de mérito, por entender que se
tratava de questão estranha à vara de Família.
A defensora pública Cláudia Aoun Tannuri
recorreu, sob o argumento de que, hoje em dia, os animais adentraram no âmbito
de convivência e proteção das famílias, sendo considerados verdadeiros integrantes
do núcleo familiar. "O Direito não pode ficar alheio a tal situação. Nesse
sentido, os animais não podem mais ser classificados como coisas ou objetos, devendo
ser detentores, não de direitos da personalidade, mas de direitos que o
protejam como espécie", disse.
Os desembargadores da 7ª Câmara aplicaram, por
analogia, o disposto no Código Civil acerca da guarda e visita de crianças e
adolescentes.
O relator, juiz em segundo grau José Rubens
Queiróz Gomes, comentou que, com base em pesquisa recente do IBGE, é possível
afirmar que há mais cães de estimação do que crianças em lares brasileiros.
Ele também apontou lacuna legislativa, pois
a relação afetiva existente entre seres humanos e animais não foi regulada pelo
Código Civil de 2002, que fala que “os animais são tratados como objetos
destinados a circular riquezas (artigo 445, parágrafo 2º), garantir dívidas (artigo
1.444) ou estabelecer responsabilidade civil (artigo 936)".
Como a lei não previu como resolver
conflitos entre pessoas em relação a um animal adquirido com a função de
proporcionar afeto, e não riqueza patrimonial, Queiróz concluiu que cabe ao
juiz “decidir de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais de
direito, nos termos do artigo 4º da Lei de Introdução às Normas de Direito
Brasileiro”.
"Considerando que na disputa por um
animal de estimação entre duas pessoas após o término de um casamento e de uma
união estável há uma semelhança com o conflito de guarda e visitas de uma
criança ou de um adolescente, mostra-se possível a aplicação analógica dos
artigos 1.583 a 1.590 do Código Civil", escreveu o relator.
Ele ressaltou ainda que, diferentemente do
que acontece com filhos, "a guarda e as visitas devem ser estabelecidas no
interesse das partes, não do animal, pois o afeto tutelado é o das pessoas".
O voto foi seguido por unanimidade.
Para a ler a decisão: https://www.conjur.com.br/dl/vara-familia-julga-guarda-compartilhada.pdf
2052114-52.2018.8.26.0000
Fonte Consultor Jurídico