Quem
já adquiriu um apartamento na planta ou recém-construído, pode ter sido
surpreendido com cobranças de taxas condominiais, referente a períodos
anteriores a efetiva entrega das chaves, e, por conseguinte, questionado acerca
da legitimidade da cobrança.
Na
prática, tem sido corriqueiro, as incorporadoras não arcarem com as despesas
condominiais ao tempo que estão na posse da unidade, e ao vendê-las tentarem
atribuir referidos ônus ao promitente comprador.
Em
decorrência, ao imitir-se na posse do imóvel, é comum o comprador ser
surpreendido com a cobrança de referidos valores. Provavelmente a cobrança
decorre de uma prática bem frequente das incorporadoras: de tentar transferir
ao comprador as taxas condominiais de período anterior à efetiva entrega das
chaves.
Em
casos análogos, a incorporadora afirma que o débito condominial tem natureza de
dívidas propter rem, ou seja, existem em razão (propter) da coisa (rem), e não
em função de qualquer obrigação pessoal, razão pela qual o promitente comprador
do imóvel na planta seria o responsável por todas as despesas referentes ao
imóvel, ainda que não esteja na posse direta do bem.
Cabe
esclarecermos que a obrigação propter rem não surge por força do acordo de
vontades, mas sim em razão de um direito real dentre aqueles previstos no
artigo 1.225 do Código Civil, tais como: a propriedade, o penhor, a anticrese,
o usufruto etc.
Em
síntese, as obrigações propter rem são denominadas como obrigações hibridas, ou
ambulatórias, por manterem-se entre os direitos patrimoniais e os direitos
reais, perseguindo a coisa (patrimônio) onde quer que ela esteja, ou seja, tem
caráter hibrido por não decorrer da vontade do titular, mas sim da coisa.
Considerando
que a obrigação de pagar taxas condominiais relativas à unidade imobiliária de condomínio
possui natureza propter rem, a responsabilidade pelo pagamento dessas despesas
tanto pode recair sobre o promitente vendedor quanto sobre o promissário
comprador, pois ambos podem assumir a posição de condômino, dependendo das
circunstâncias do caso concreto.
Pois
bem, a questão chegou ao Superior Tribunal de Justiça – STJ, por meio de
recursos repetitivos, que entendeu por prudente modular os efeitos da natureza
propter rem da obrigação condominial, atribuindo a incorporadora a obrigação do
pagamento da taxa condominial, desde que fique comprovado: (i) que o
promissário comprador não se imitira na posse do imóvel; e (ii) o condomínio
não teve ciência da transação de compra e venda.
Com
efeito, em recente decisão, os desembargadores da Quinta Turma Cível do
Tribunal de Justiça do Distrito Federal, nos autos do processo nº.
20141310045556APC, observaram o entendimento do STJ, apreendendo ser
incumbência da incorporadora do empreendimento imobiliário a responsabilidade
pelo pagamento dos encargos condominiais, até a efetiva entrega das chaves.
CIVIL. APELAÇÃO. AÇÃO DE
COBRANÇA. TAXAS CONDOMINIAIS. COMPROMISSO DE COMPRA E VENDA NÃO LEVADO A
REGISTRO. ILEGITIMIDADE PASSIVA. REJEIÇÃO. OBRIGAÇÃO PELO PAGAMENTO DE DESPESAS
CONDOMINIAIS. PROPTER REM. PODE RECAIR SOBRE PROMITENTE VENDEDOR OU PROMISSÁRIO
COMPRADOR. PECUARIDADES DO CASO CONCRETO. IMISSÃO NA POSSE. CIÊNCIA INEQUÍVOCA
DO CONDOMÍNIO ACERCA DO NEGÓCIO JURÍDICO DE ALIENAÇÃO. NÃO DEMONSTRAÇÃO.
RESPONSABILIDADE ATRIBUÍDA À PROMITENTE VENDEDORA. SENTENÇA MANTIDA. 1 - Detém
legitimidade para figurar no polo passivo de ação de ajuizada por condomínio o
titular do domínio do imóvel mesmo ante a existência de contrato de compra e
venda não registrado. Aplicação da teoria da asserção. Preliminar de
ilegitimidade passiva rejeitada. 2 - Havendo compromisso de compra e venda não
levado a registro, a responsabilidade pelas despesas de condomínio pode recair
tanto sobre o promitente vendedor quanto sobre o promissário comprador,
dependendo das circunstâncias de cada caso concreto. Precedentes do STJ. 3 - No
caso, não demonstrada a efetiva posse do promitente comprador no imóvel,
referente ao período em atraso das cotas condominiais, tampouco a ciência
inequívoca do condomínio acerca do negócio jurídico de alienação do imóvel, a
compromissária/vendedora deve ser responsabilizada pelo pagamento das taxas de
condomínio, ressalvando-lhe o direito de regresso. Precedentes do STJ. 4 -
Recurso conhecido, preliminar rejeitada e, no mérito, desprovido.(Acórdão
n.955532, 20141310045556APC, Relator: MARIA IVATÔNIA 5ª TURMA CÍVEL, Data de
Julgamento: 20/07/2016, Publicado no DJE: 27/07/2016. Pág.: 300/308)
Segundo
a desembargadora relatora, Maria Ivatônia,
“como o propalado contrato
de compra e venda não foi registrado no competente cartório na forma do art.
1.245 do Código Civil, para que o promitente comprador seja responsabilizado
pelas taxas condominiais, deveria ter sido dada ciência ao condomínio de que
houve alienação do imóvel e que de a construtora não mais possuía a propriedade
e/ou posse do bem. Do contrário, não haveria como o condomínio efetuar a
cobrança de quem realmente deveria arcar com tal obrigação.”
Arremata
o voto concluindo que:
“[...] não demonstrada a
efetiva posse do promitente comprador no imóvel, referente ao período em atraso
das cotas condominiais, tampouco a ciência do condomínio acerca do negócio
jurídico de alienação do imóvel, a compromissária/vendedora, ora apelante, deve
ser responsabilizada pelo pagamento das taxas condominiais cobradas.”
O
julgamento foi unânime, mantendo a condenação da incorporadora ao pagamento das
taxas condominiais, do período cobrado, no qual o comprador não estava na posse
do imóvel.
Por
certo, lastreado no caso apreciado, diante da não entrega das chaves, não pode
o promitente comprador ser responsabilizado por débitos condominiais anteriores
a efetiva posse do bem, na medida em que não gozou dos benefícios e de
eventuais benfeitorias do empreendimento.
Conclui-se
assim, que caso o promitente comprador seja surpreendido com a cobrança
condominial de períodos anteriores a entrega das chaves, deverá buscar solução
extrajudicial com o condomínio, a fim de que referidos valores sejam cobrados
da incorporadora e/ou construtora, que é quem está enlaçada à obrigação de
suportar as taxas geradas pelo imóvel até a efetiva entrega do bem, e na
impossibilidade de solução amigável, recorrer à via judicial.
Por
Santos & Pereira Advogados
Fonte
JusBrasil Notícias