Em
um processo de arbitragem, a atuação do advogado fica mais ampla e sua
responsabilidade é ainda maior. É o que se conclui após uma conversa com
Ricardo Ranzolin, sócio de Silveiro Advogados, e novo vice-presidente da
Comissão de Arbitragem do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil.
Isso
porque o processo já começa com uma importante diferença em relação à atuação
no Judiciário: o profissional orienta seu cliente sobre a escolha de quem irá
julgar uma possível futura causa. Em geral, são apontados três árbitros, sendo
um por cada parte e o outro por consenso. Esse é um dos muitos aspectos que
diferenciam a atuação do advogado em cortes arbitrais.
O
cargo na comissão vem após Ranzolin ter presidido a Comissão de Arbitragem do
Rio Grande do Sul, além de ocupar o cargo de vice-presidente da Câmara de
Mediação e Arbitragem do CIERGS-FIERGS (CAMERS). Como autor, escreveu o livro
Controle Judicial da Arbitragem.
“A
Comissão de Arbitragem vem sendo uma das mais atuantes do Conselho Federal da
OAB e é responsável por todas as adaptações da regulamentação da profissão da
advocacia frente às novas práticas da arbitragem. Além disso, vem disseminando
boas práticas, denunciando as câmaras de arbitragem irregulares, e
estabelecendo cursos no plano nacional, para formação dos profissionais do
Direito nesta nova temática”, afirma Ranzolin.
Em
entrevista à revista eletrônica Consultor Jurídico, o novo presidente da
comissão destacou algumas peculiaridades na atuação do advogado em ambiente
arbitral. Orientar a escolha do árbitro, a busca por tutela de urgência na
Justiça comum, a não possibilidade de se recorrer , a flexibilidade de prazos,
a permissão para fazer perguntas diretamente à testemunha foram alguns dos
pontos.
Como é esse processo do advogado auxiliar o cliente a
escolher um árbitro?
Ricardo
Ranzolin – Este processo de nomeação de árbitros leva algumas semanas. Cabe
também ao advogado fazer contatos com os árbitros que venham a ser escolhidos
para verificar acerca de sua disponibilidade e se não há eventual impedimento. Ao advogado incumbe também fiscalizar e
eventualmente impugnar a indicação de árbitro provinda da outra parte ou da
escolha conjunta feita pelos dois árbitros, no caso deste ser impedido para o
julgamento do conflito. Isto tudo exige conhecimento e pesquisa dos perfis dos
profissionais, seja para indicação, seja para impugnação, assim como postura
ética para tais tratativas.
No caso dessa
comissão de árbitros não estar formada e umas das partes sentir necessidade de
uma decisão urgente, qual o procedimento?
Ricardo
Ranzolin – O fato de demorar algumas semanas para se ter um tribunal arbitral
instituído para julgar a causa exige atenção especial quando houver a
necessidade de obtenção de uma tutela de urgência, seja de cunho cautelar ou
antecipatória. Nesses casos, em não havendo a previsão expressa da utilização
especial de árbitro de emergência na cláusula compromissória (serviço prestado
por algumas instituições arbitrais internacionais), a tutela de urgência poderá
ser postulada diretamente ao juízo estatal competente para apreciação da causa,
podendo depois ser reapreciada pelo tribunal arbitral quando este for
instituído.
Como se dá a questão de prazos no processo de
arbitragem?
Ricardo
Ranzolin – É mais flexível, menos formalista e mais instrumental. Dificilmente
a entrega de uma manifestação com atraso de um dia, por exemplo, em um
procedimento arbitral, levará a que a parte sofra a perda de todos seus
direitos, como pode ocorrer no processo judicial estatal. Vem sendo construída
uma praxe menos formalista e mais instrumental na condução das arbitragens, o
que a direciona para o julgamento do direito material em discussão. Certamente
que o árbitro cuida para que não haja cerceamento de defesa das partes. Mas não
fará da observância rígida e formalista das regras de procedimento algo mais
importante do que a questão de mérito em si.
Algumas empresas têm bancado os custos de uma das
partes em processos arbitrais, em troca de porcentagem caso haja vitória no
processo. O que o senhor acha disso? Não pode fomentar uma judicialização
arbitral?
Ricardo
Ranzolin – A possibilidade de haver venda de parte ou de todo o direito posição de uma parte em disputa em um
procedimento arbitral pode ocorrer igualmente nos processos judiciais. Talvez
por haver um custo direito mais elevado nos procedimentos arbitrais haja uma
maior tendência a que se trate de tal tema em relação à arbitragem.
O
que merece análise é o eventual dever de as partes informar aos árbitros e à
parte contrária acerca de tais aquisições. Isto porque as regras de impedimento
dos árbitros dependem do grau de relacionamento com as partes em conflito. Se
houver mais interesses sob julgamento em um procedimento arbitral (de outras
partes), estes interesses devem ser conhecidos por todos (árbitros e partes), a
fim de que possa ser sempre garantida, de forma transparente, a independência
do tribunal arbitral. Eu entendo que a postura de boa-fé no procedimento
arbitral exige que haja revelação sobre tal fato (aquisição total ou parcial
dos direitos de uma parte em disputa em arbitragem) aos árbitros e à outra
parte.
O novo CPC traz a possibilidade das partes acordarem
ritos processuais. Considera uma aproximação do processo estatal com a
arbitragem?
Ricardo
Ranzolin – Estas regras do novo CPC foram editadas, sem dúvida, sob inspiração
da flexibilidade dos procedimentos arbitrais. Contudo, não creio que vá haver
uma aproximação do processo judicial estatal com a arbitragem. Estas novas
regras são bem intencionadas, visando democratizar (permitir maior participação
das partes) e flexibilizar o processo judicial estatal . Mas, na realidade
prática, com o número de processos que os magistrados têm à sua frente (e são
milhares em cada vara de primeira instância ou Câmara julgadora de segundo grau,
sem falar nas terceiras instâncias) é impossível que venham a estudar regras de
procedimento distintas para cada um dos caso.
Os
despachos de mero expedientes, como o de abertura de prazo para as partes, por
exemplo, são na prática expedidos quase que de forma automática. Imagine-se
situação em que os prazos sejam distintos para cada processo. Seria impossível
e inviabilizaria completamente a jurisdição neste momento. O que acho,
portanto, é que a criação de tal possibilidade no novo CPC descurou da realidade
do atual grave congestionamento do processo civil brasileiro.
Por
Fernando Martines
Fonte
Consultor Jurídico