Em
inglês bullying é um substantivo derivado do verbo bully, sendo que este, nos
termos do Cambridge Advanced Learner's Dictionary, significa "machucar ou
ameaçar alguém mais fraco para forçá-lo a fazer algo que não quer". Esta
definição, no entanto, parece um tanto limitada já que o bullying pode ser
praticado sem que haja a intenção de que a vítima faça, efetivamente, algo.
Podemos dizer, então, que o bullying está relacionado a comportamentos
agressivos e antissociais, inclusive por meio de agressões físicas, podendo
ocorrer mediante violência psicológica, mas de maneira repetitiva e sem causa
aparente.
Diz-se
que a prática é mais comum no meio ambiente educacional de crianças e
adolescentes, mas não se exclui sua ocorrência em outros ambientes.
Quando
estes comportamentos intimidatórios ocorrem mediante o uso de aparatos
tecnológicos, são denominados de cyberbullying.
Tendo-se
em vistas estas breves considerações iniciais, é preciso ressaltar que no
último dia 09 de novembro foi publicada a pequena lei 13.185/2015, que tem
vacatio legis de noventa dias e apenas oito artigos. A lei institui o Programa
de Combate à Intimidação Sistemática, conhecida como "Bullying" e
abrange as condutas praticadas no âmbito da internet e com o uso de aparatos
tecnológicos.
Muito
embora a definição de bullying seja complexa e difícil como vimos acima, a lei
assim o descreveu (art. 1º, §1º): "considera-se intimidação sistemática
(bullying) todo ato de violência física ou psicológica, intencional e
repetitivo que ocorre sem motivação evidente, praticado por indivíduo ou grupo,
contra uma ou mais pessoas, com o objetivo de intimidá-la ou agredi-la,
causando dor e angústia à vítima, em uma relação de desequilíbrio de poder
entre as partes envolvidas."
Verifica-se,
de pronto, que a prática definida é a reiterada em razão da utilização da
expressão "repetitiva". Ademais, é dolosa na medida em que foi
definida como "intencional". Em outras palavras, atos isolados não
são considerados bullying. Mas a lei exige, ainda, que a intimidação
sistemática ocorra em relação de desequilíbrio de poder entre as partes, o que
sugere que uma das partes é mais poderosa, seja porque fisicamente é maior ou
mais forte, seja porque há uma quantidade maior de agressores, como um grupo.
Resta a dúvida se o desequilíbrio de poder poderia restar configurado apenas em
uma perspectiva moral/mental e não física. Parece-nos que sim.
Apesar
da lei parecer ter sido redigida para que fosse aplicada a crianças e
adolescentes em situações havidas nos estabelecimentos educacionais (art. 5º),
não há uma clara restrição que a impeça de ser aplicada a outros atores,
inseridos em outros ambientes, tais como adultos em meio ambiente digital, como
as redes sociais. Quanto a isto, aliás, há previsão expressa como veremos
abaixo.
As
definições legais dos atos que configuram a intimidação sistemática são um
tanto quanto amplas, de modo que a violência pode ser física ou psicológica,
mas não se restringindo a essas hipóteses, incluindo-se aí discriminação e
humilhação.
Além
da violência física ou psicológica em atos de intimidação, humilhação ou
discriminação, também é considerado bullying a prática de ataques físicos, nos
termos do art. 2º, (I); insultos pessoais (II); comentários sistemáticos e
apelidos pejorativos (III); ameaças por quaisquer meios (IV); grafites
depreciativos (V); expressões preconceituosas (VI); isolamento social
consciente e premeditado (VII); e pilhérias (VIII).
O
parágrafo único do art. 2º ainda determina que "há intimidação sistemática
na rede mundial de computadores (cyberbullying), quando se usarem os
instrumentos que lhe são próprios para depreciar, incitar a violência,
adulterar fotos e dados pessoais com o intuito de criar meios de
constrangimento psicossocial".
Há,
ainda, uma classificação dos atos de intimidação, que restaram considerados
como: a) verbais; b) morais; c) sexuais; d) sociais; e) psicológicos; f)
físicos; g) materiais; h) virtuais.
No
que diz respeito à responsabilização a lei praticamente não trouxe inovações já
que se ateve não incentivar a punição dos ofensores apesar de determinar que
"é dever do estabelecimento de ensino, dos clubes e das agremiações
recreativas assegurar medidas de conscientização, prevenção, diagnose e combate
à violência e à intimidação sistemática". Essas medidas deverão ser
perseguidas por meio dos objetivos previstos no art. 4º, isto é, as condutas
de: (I) prevenir e combater a prática da intimidação sistemática (bullying) em
toda a sociedade; (II) capacitar docentes e equipes pedagógicas para a implementação
das ações de discussão, prevenção, orientação e solução do problema; (III)
implementar e disseminar campanhas de educação, conscientização e informação;
(IV) instituir práticas de conduta e orientação de pais, familiares e
responsáveis diante da identificação de vítimas e agressores; (V) dar
assistência psicológica, social e jurídica às vítimas e aos agressores; (VI)
integrar os meios de comunicação de massa com as escolas e a sociedade, como
forma de identificação e conscientização do problema e forma de preveni-lo e
combatê-lo; (VII) promover a cidadania, a capacidade empática e o respeito a
terceiros, nos marcos de uma cultura de paz e tolerância mútua; (VIII) evitar,
tanto quanto possível, a punição dos agressores, privilegiando mecanismos e
instrumentos alternativos que promovam a efetiva responsabilização e a mudança
de comportamento hostil; (IX) promover medidas de conscientização, prevenção e
combate a todos os tipos de violência, com ênfase nas práticas recorrentes de
intimidação sistemática (bullying), ou constrangimento físico e psicológico,
cometidas por alunos, professores e outros profissionais integrantes de escola
e de comunidade escolar.
Por
fim, a lei esclarece que "serão produzidos e publicados relatórios
bimestrais das ocorrências de intimidação sistemática (bullying) nos Estados e
municípios para planejamento das ações". (art. 6º) e que "os entes
federados poderão firmar convênios e estabelecer parcerias para a implementação
e a correta execução dos objetivos e diretrizes do Programa instituído por esta
lei". (art. 7º).
Não
há, portanto, muitas medidas práticas, sendo quase todas definições ou normas
programáticas, mas fica formalizada a necessidade de se combater o bullying e o
cyberbullying, demonstrando que são assunto sério. Fato é que apesar desta lei
não trazer medidas concretas de responsabilização, não se pode negar que o
sistema jurídico detêm mecanismos penais e civis para tanto, como são os casos
dos crimes contra a honra e a previsão de responsabilidade civil, além,
evidentemente, das normas contidas no Estatuto da Criança e do Adolescente.
Fonte
Migalhas