Quando você amortiza o saldo devedor do seu
financiamento imobiliário, na prática você está deixando de pagar os juros e
encargos que incidiriam sobre a quantia amortizada
Entrar
em um financiamento imobiliário longo – de 20, 30 anos – não necessariamente
significa levar todo esse tempo para quitar a sua dívida. Nem quer dizer que o
valor das parcelas precisará ser aquele até o fim. Quando entram recursos
extras, você pode fazer o que se chama de amortização – adiantar o pagamento ao
banco, reduzindo o saldo devedor do seu imóvel, pagando menos juros e
acelerando a quitação da casa própria.
Para
entender como a amortização funciona, convém compreender como são formadas as
parcelas de um financiamento imobiliário. Cada parcela, do início ao fim do
prazo, é composta de principal (a parte correspondente ao valor que você pegou
emprestado), juros (o que o banco cobra para emprestar) e os encargos (como
seguros e outras taxas operacionais).
O saldo devedor
– que é o que você amortiza – corresponde, portanto, apenas ao valor que você
pegou emprestado. Se seu imóvel custou 400 mil reais, e você financiou 300 mil,
seu saldo devedor é de 300 mil, independentemente de quanto você tenha que
pagar de juros e encargos.
Nesse
sistema, o valor amortizado mês a mês é constante, mas no início do
financiamento são pagos mais juros do que no final, o que faz com que as
parcelas diminuam com o tempo. Assim, se um financiamento começa com uma parcela
de 1.000 reais, na qual 500 reais são referentes ao principal, os demais 500
reais correspondem a juros e encargos. Na última parcela, 500 reais
corresponderão ao principal, mas uma quantia bem menor - digamos, 5 reais -
serão referentes a juros e encargos.
Suponha
um financiamento de 100 mil reais, cuja primeira parcela seja de 1.000 reais e
500 reais sejam referentes à amortização. No segundo mês, o saldo devedor será
de 99.500 reais, e não de 99 mil reais, como uma subtração simples poderia
sugerir. É esse saldo devedor de 99.500 reais que o devedor pode amortizar se
tiver recursos extras.
Duas opções: redução do prazo ou do valor das parcelas
Portanto,
quando você amortiza o saldo devedor do seu financiamento imobiliário, na
prática você está deixando de pagar os juros e encargos que incidiriam sobre a
quantia amortizada. Como você está pagando o banco antes do que ele
inicialmente esperava receber, a instituição não cobra os juros sobre aquela
quantia.
Essa
é a primeira vantagem da amortização. A segunda é a possibilidade de escolher o
melhor caminho para o seu planejamento financeiro.
Os
bancos dão duas opções ao cliente quando ele deseja amortizar a dívida. Uma é
manter o valor das parcelas e diminuir o prazo. A outra é manter o prazo e
reduzir o valor das parcelas. “A primeira opção é boa para quem não sente que
as parcelas estejam pesando no bolso, pois é possível quitar o imóvel mais
rápido; já a segunda opção é interessante para quem precisa dar um alívio no
orçamento”, aconselha Marcelo Prata.
Prata
lembra que no Brasil não existe penalidade para quem financia por um prazo
maior. A taxa de juros para determinada pessoa em determinado banco costuma ser
a mesma para um prazo de dez ou de 30 anos, desde que ela tenha capacidade de
pagamento em ambos os prazos. Assim, não há necessidade de se esforçar para
quitar o imóvel logo se a parcela está deixando o devedor no aperto. Para o
presidente da Abracefi, se esse for o caso, melhor reduzir as parcelas e manter
o prazo.
Contudo,
que ao pagar até o fim do prazo estipulado inicialmente, o devedor pode ter uma
surpresa desagradável: “Às vezes há um saldo residual, que faz com que o
financiamento ultrapasse o prazo inicialmente estipulado”, observa. Portanto,
se essa for a escolha, convém se planejar para isso.
Gotlib
afirma ainda que hoje em dia os bancos não costumam mais encrencar com quem tem
dinheiro na mão para quitar o saldo devedor de uma vez, antecipando o término
do financiamento. “Esse é um direito de quem contrata um financiamento. Quanto
mais você antecipa o pagamento, menos juros você paga”, diz Gotlib.
Se a correção for pós-fixada, pode valer a pena
reduzir o prazo
Os
juros dos financiamentos são sempre definidos no ato da contratação, mas podem
ou não ter um índice de correção pós-fixado, normalmente a Taxa Referencial
(TR). Assim, o financiamento pode ter, por exemplo, uma taxa de juros fixa de
12% ao ano, sem correção, ou uma taxa de 9% ao ano, mais correção pela TR.
No
segundo caso, o devedor conta com um elemento de incerteza, que pode fazê-lo
pagar, ora mais, ora menos, dependendo da flutuação da taxa básica de juros, a
Selic. Assim, quando a Selic tem tendência de alta, como ocorre hoje, a TR
também sobe, engordando o juro pago ao banco.
Quem
financia nessa modalidade, portanto, pode achar mais interessante reduzir o
prazo do financiamento do que o valor das parcelas na hora da amortização.
Afinal, quanto menor o prazo, menor a exposição às incertezas da economia. “Mas
mesmo que haja alta da Selic, a forma como a TR é calculada costuma puxá-la
para baixo”, explica Marcelo Prata, que julga que eventuais altas na TR não
chegam a ter muito impacto no custo do financiamento.
Para
quem financia diretamente com a construtora, porém, optar pela redução de prazo
na hora de amortizar é bem mais vantajoso. Isso porque, nesses casos, o juro é
corrigido pela inflação – em geral, pelo IGP-M. “Aí, de fato, quanto maior o
prazo, maior o risco de a taxa de juros ter uma alta substancial com o aumento
da inflação”, observa o presidente da Abracefi.
Use o FGTS para amortizar
Se
você for empregado com carteira assinada, pode fazer uma amortização a cada
dois anos com os recursos do seu FGTS. “Só é preciso tomar cuidado, porque o
FGTS também é uma espécie de seguro para quando se é demitido sem justa causa”,
lembra Marcelo Prata.
Do
ponto de vista financeiro, usar o FGTS para amortizar o saldo devedor é ótimo,
pois no fundo o dinheiro só rende 3% ao ano mais TR, perdendo da inflação. Mas
para não ficar desprotegido em caso de demissão, o trabalhador deve se
preocupar em ter uma reserva de emergência em uma aplicação conservadora,
suficiente para cobrir pelo menos seis meses das suas despesas. E essa quantia
não deve ser usada para amortizar o financiamento.
Na
hora de usar o FGTS, porém, é preciso ficar atento à modalidade escolhida.
Existem duas formas de usar o seu FGTS no meio do financiamento (sem ser como
entrada ou para pagar o imóvel à vista): uma é a amortização propriamente dita.
A outra é a quitação de parcelas vencidas ou a vencer.
Na
quitação de parcelas, você não paga só o saldo devedor, mas sim as parcelas
cheias, compostas por principal, juros e encargos. Assim, se você usa 6 mil
reais do seu FGTS para quitar antecipadamente três parcelas de 2 mil reais
cada, você estará pagando não só o principal, mas os juros e os encargos
embutidos nessas parcelas. Como contrapartida, terá o direito de ficar sem
pagar nada durante três meses.
A
vantagem dessa modalidade, em que você não deixa de pagar os juros e encargos,
é a possibilidade de ter uma folga durante certo período. “Essa modalidade só
deve ser usada por quem precisa retomar o fôlego financeiro por algum motivo;
se não for o caso, não se deve queimar recursos com juros e encargos à toa”,
aconselha Marcelo Prata.
A
utilização do FGTS para essa finalidade também só pode ser feita a cada dois
anos. É possível pagar até 80% de 12 prestações a vencer ou vencidas, desde que
não haja mais que três parcelas em atraso.
Por
Julia Wiltgen
Fonte
Exame.com