terça-feira, 12 de janeiro de 2016

5 MITOS SOBRE A RELAÇÃO ENTRE MULHERES E DINHEIRO

Para psicóloga, cultura cria mitos que influenciam o comportamento de homens e mulheres na hora de investir

Mulheres no mercado de trabalho: não é mais tabu, mas ainda há resquícios de valores ultrapassados

Pesquisas e profissionais de mercado atestam que mulheres e homens lidam de formas diferentes com dinheiro, e que elas são mais conservadoras que eles na hora de investir. As possíveis explicações para isso já passam até por estudos sobre uma suposta influência dos hormônios nas decisões financeiras. Mas afora os polêmicos aspectos biológicos, há outros fatores que podem afetar a maneira como as pessoas de cada gênero lidam com suas finanças. E o melhor: eles podem ser mudados conscientemente.
Em seu livro “Valor Feminino”, a psicóloga Andréa Villas Boas dedica alguns trechos aos aspectos psicológicos da relação de homens e mulheres com o dinheiro. A partir de sua experiência como profissional de RH e de entrevistas com pessoas de ambos os sexos, Andréa descortina uma série de mitos oriundos da cultura, da criação familiar e até da deficiência ou ausência de educação financeira nos lares brasileiros.
A autora não nega que haja diferenças entre os gêneros. Pelo contrário, a ideia não é que as pessoas anulem suas características ao lidar com as finanças, mas sim que abram mão das ideias prontas, que parecem naturais, mas não são. São elas que, acredita Andréa, influenciam boa parte do comportamento distinto de homens e mulheres em relação ao dinheiro. Alguns desses mitos, esmiuçados por Andréa em seu livro, estão resumidos a seguir:

1. Mulheres economizam para uma emergência, homens investem para obter algo
Como os especialistas em investimentos já sabem, as mulheres costumam ser cautelosas, mas às vezes podem se tornar excessivamente conservadoras, o que pode ser ruim. Atualmente, as mulheres representam apenas 25% do total de pessoas físicas que investem em renda variável diretamente. Em suas entrevistas, Andréa Villas-Boas também detectou esse padrão. Das mulheres que investiam, 62,1% aplicavam em caderneta de poupança, contra 43,8% dos homens investidores; 28,8% das mulheres investiam em ações diretamente, e 22,4% em fundos de ações. Do lado dos homens, esses números eram, respectivamente, 45% e 35%.
É claro que o brasileiro tem uma tendência a ser conservador em seus investimentos, e a falta de educação financeira em geral contribui para isso. Mas outra questão cultural pode explicar essa diferença entre homens e mulheres. Para Andréa, existe uma tendência das famílias a elogiarem as mulheres por sua “prudência”, “previdência” e “cautela”, enquanto os homens normalmente são mais incentivados a correrem atrás do que querem desde crianças.
“Com anos de experiência em arriscar, ganhar e perder, homens investem com mais ousadia. O ímpeto masculino, desde sempre alimentado, não se sacia pela mera manutenção do patrimônio – eles põem o arrojo a serviço da multiplicação de sua riqueza”, diz a autora no livro. Mas os tempos mudam, a cultura muda e o comportamento das investidoras também. De 2002 para cá, a presença das mulheres na Bolsa aumentou mais de 800%.

2. Mulheres se mantêm, homens provêm
Esse é o desenrolar do mito anterior. Se a partir da liberação feminina as mulheres passaram a ser incentivadas a formar uma reserva, foi para que, mais tarde, fossem capazes de se manter sem a ajuda de um homem. Elas, então, passaram a ser motivo de orgulho quando eram capazes de se sustentar; para eles, no entanto, continuou pesando o dever de não só se sustentar – nada mais do que sua obrigação – como também de manter toda a família.
Esse tipo de pensamento ainda está por aí, ainda que inconscientemente. Para Andréa, esse tipo de raciocínio é prejudicial tanto aos homens quanto às mulheres, pois eles acabam se sentindo pressionados e elas podem chegar a pensar que não desenvolveram todas as suas potencialidades.
Em seu livro, a psicóloga conta as histórias de dois homens inicialmente casados com mulheres que não trabalhavam e que dependiam deles para tudo. Ambos se divorciaram e depois se casaram com mulheres independentes financeiramente, considerando a nova empreitada como uma libertação. Para esses dois homens, o relacionamento anterior era nocivo tanto para eles quanto para elas, com um “erro” partilhado: eles queriam que as esposas ficassem em casa, e elas achavam que deveriam mesmo ficar.
Os tempos mudaram e hoje relações em que a mulher depende completamente do marido estão se tornando cada vez mais raras. Atualmente, 65% das mulheres contribuem com o orçamento doméstico e 50% dos homens também se dedicam aos afazeres domésticos. Mas apesar de as mulheres já serem incentivadas e até cobradas a ser financeiramente livres, o desejo de que elas arranjem um marido rico persiste em muitos lares. E um homem ser capaz de sustentar toda a família também não é considerado nenhum absurdo.
Estes são resquícios do passado, que advêm de outros mitos: o pensamento que alguns homens têm de que a dependência financeira vai “prender” a mulher à relação; e o medo que muitas mulheres têm de ficar “solteironas” se forem excessivamente independentes. Para Andréa, tudo ilusão.
Ela cita dado do IBGE de 2008 que mostra que 72% das separações não-consensuais, no Brasil, são pedidas por mulheres. Ora, se apenas 65% delas contribui para o orçamento da casa, é possível deduzir que uma parte delas não tinha renda quando pediu a separação. Quanto ao medo de ficar “para titia”, os entrevistados acima provam que há homens por aí muito mais interessados nas independentes.

3. O dinheiro é sujo e enriquecer é um ato egoísta
Perguntados sobre o que deveriam ter feito ou evitado fazer, no passado, para serem ricos, os homens entrevistados por Andréa Villas-Boas simplesmente responderam. Muitas mulheres, por outro lado, fizeram questão de diferenciar riqueza material e espiritual, de dizer que teriam que ter se corrompido ou se afastado dos filhos, ou mesmo que, se tivessem feito escolhas diferentes, não seriam quem são hoje. Houve quem associasse querer ganhar dinheiro a orgulho.
Entre os homens, ninguém associou ter dinheiro a ter menos princípios ou valores, muito menos a deixar de fazer o que lhes dá prazer. A autora ressalta, aí, a questão do equilíbrio, percebida muito mais entre eles do que entre elas. Aproveitar a vida hoje e ser previdente para o futuro não podem ser ideias excludentes, principalmente porque desperdiçar a juventude e chegar desamparado à velhice tampouco é uma fórmula inteligente.
Mas por que as mulheres associariam o dinheiro a algo ruim? As expectativas sociais que historicamente pesaram sobre homens e mulheres são uma pista. Durante muito tempo – e não num passado tão distante – pais impediram suas filhas de trabalhar no início da vida adulta, alegando que elas não precisavam disso. As mulheres eram preparadas para o casamento e os filhos, seguindo, no máximo, uma carreira tipicamente feminina. Algumas entrevistadas passaram por essas situações.
Outro fator são as responsabilidades que pesam sobre as mulheres. Elas são mais cobradas a serem presentes como mães e a educar os filhos, o que nem sempre é socialmente cobrado dos homens. Daí vem a culpa, pois muitas mulheres se sentem mal ao sair para trabalhar enquanto deixam o filho na creche ou na escola, por exemplo. “A culpa é vista nas pequenas atitudes, como a mãe que sempre compra presentinhos para os filhos como forma de compensar sua ausência. Mas isso é mais uma tabu para a mãe do que para a criança”, disse Andréa em entrevista a EXAME.com.
É claro que hoje em dia muita coisa está diferente. A mulher trabalhar fora definitivamente não é mais um escândalo, e elas já começam a figurar mais nas carreiras tipicamente masculinas e nos cargos de liderança. Se antes precisavam se masculinizar e até dar as costas para a família para poder subir na carreira, cada vez mais elas estão conseguindo encontrar um equilíbrio, inclusive com o apoio de seus maridos. Hora de rever os conceitos.

4. Mulheres cuidam, homens comandam
Nossa sociedade se organiza de forma a colocar a mulher no papel de cuidadora, dedicada aos filhos, aos pais idosos e a profissões relacionadas à educação e à saúde. Homens, por sua vez, são geralmente criados para comandar, correr atrás do que querem, serem proativos na escolha das parceiras, provedores do lar e atuarem em profissões relacionadas às finanças e à tecnologia. O resultado são pressões distintas, e que possuem tanto um lado positivo quanto um negativo para ambos os gêneros.
Separar biologia de cultura é complicado, mas antropólogos já estudaram sociedades em que as mulheres faziam o trabalho mais pesado ou eram incumbidas de escolher seus parceiros sexuais dentre vários candidatos. A tendência de cada sociedade é considerar o seu sistema natural, mas a naturalidade, nesse caso, é bem questionável.

5. Mulheres são afetivas, homens são objetivos
Andréa defende que ambas as características convivem em qualquer ser humano, mas que algumas mulheres receiam agir com mais objetividade por temerem ser consideradas menos afetivas ou até duras demais. Novamente, aqui elas opõem as duas características, ao contrário dos homens.
Para desmontar o mito de que a mulher é mais impulsiva na hora das compras, a psicóloga cita dados coletados pelo especialista em comportamento do consumidor Paco Underhill: 86% das mulheres consultam o preço das variedades de um mesmo produto antes de escolher qual levar; apenas 25% das mulheres compram as roupas que experimentam, contra 65% dos homens; menos de um quarto dos homens leva lista de compras; e 72% dos homens olham a etiqueta de preço, contra 90% das mulheres. Ela lembra ainda que as mulheres não interrompem a busca por um produto até que estejam totalmente satisfeitas. O que é, inclusive, financeiramente inteligente.
Já no ambiente de trabalho, realmente falta objetividade. Como gestora de RH, Andréa pôde observar que mulheres são capazes de abrir mão de promoções em prol de uma colega que precise mais, pois tem filhos ou é mãe solteira, por exemplo. Também hesitam em pedir aumento e agir com mais assertividade, contentando-se em reclamar pelos cantos.
“As mulheres numa mesma função ganham 27,5% menos que os homens. Se isso acontece, é porque elas também aceitam, por um lado, esse salário menor. A mulher valoriza mais o sucesso do que o salário”, disse Andréa a EXAME.com. Não é preciso se masculinizar, mas nesse caso vale aprender com a assertividade masculina e correr atrás do que se deseja.

Fonte Exame.com