Uma das inovações
que prometem mudar o mundo, o blockchain vai transformar profissionais como
advogados e contadores em programadores
Uma moeda totalmente digital, com as
transações feitas sem precisar de um banco. Em 2016, a bitcoin fez muitos
profissionais correrem para entender exatamente como funcionava a criptomoeda
que causava uma revolução no mundo financeiro.
O nome é blockchain, como Patrícia Demenezes
descobriu ao buscar entender a tecnologia das criptomoedas. A contadora já
tinha mais de sete anos de experiência na sua área e começou a investir na nova
modalidade monetária.
Depois, ela passou a se aprofundar mais na
área de programação, fazendo cursos e se juntando à equipe da startup
GoBlockChain, que oferece conhecimento e serviços de consultoria na área.
“Vi que nada mais é que mexer com códigos. Ainda
sou iniciante, mas já estou dividida: sou metade contadora, metade programadora.
É um desafio muito gratificante para mim começar a me inovar aos 30 anos”, fala
ela.
Embora a bitcoin tenha colocado o holofote
sobre a tecnologia, Henrique Leite, fundador da GOBlockchain, garante que ela
abre a porta para infinitas possibilidades.
Em sua explicação simples: blockchain é uma
forma de guardar informações em bancos de dados. E isso é feito de forma que
certifica que esses dados fiquem seguros e inalterados no complexo mundo
digital.
Ao traduzir o nome dado a essa tecnologia, é
possível formar uma imagem mental de como ela funciona: são blocos de registros
das informações ligados em rede.
No caso das criptomoedas, ou mesmo para
qualquer transferência bancária, cada bloco possui dados para a transação com
sua data, hora, minutos e segundos. Isso gera um apelido, um endereço único
para o bloco.
Quando é adicionada uma nova informação, ela
cria um vínculo com o anterior, utilizando o apelido do primeiro bloco. A
cadeia vai se formando e fica distribuída por servidores diferentes. Assim, nada
do que é feito online se perde ou pode ser fraudado.
A aplicação dessa inovação vai muito além do
mercado das criptomoedas. Empresas, cidades e indivíduos podem se beneficiar do
que pode ser uma revolução na forma como qualquer um dado é armazenado e
acessado.
“O Blockchain gera mais eficiência, redução
de custos e transparência. Se aplicada em uma cadeia de alimentos, eu vou
comprar um ovo orgânico e ter acesso a todo o histórico do produto. Além de
saber quem produziu e quem transportou, posso garantir que as normas de
qualidade foram respeitadas, a validade não foi adulterada”, fala ele.
Um paciente poderia guardar para sempre e
sem papéis todos os exames, consultas, remédios e vacinas da sua vida. Henrique
Leite imagina como cidadãos poderiam auxiliar no funcionamento e manutenção da
cidade trocando sua interação com objetos por pontos ou moedas.
Segundo ele, a colaboração em rede é o
coração dessa tecnologia.
“Venho de um ramo que ainda é muito quadrado,
as pessoas são fechadas e não compartilham conhecimento. Na área de tecnologia
e com o blockchain, as pessoas são muito engajadas em se ajudar e disseminar o
que aprenderam”, comenta Patrícia.
Na startup, ela e Henrique fazem parte da
equipe de programadores não possui hierarquia e eles desenvolvem projetos em
conjunto para clientes interessados em novas soluções usando o blockchain. Cada
um ganha uma remuneração proporcional ao trabalho realizado, sem existir um
chefe.
O uso para substituir documentos tem chamado
a atenção de muitos profissionais fora da área de TI, como aconteceu com a
Patrícia Demenezes e a onda da bitcoin. Muitos advogados têm procurado se
atualizar na linguagem de programação para entender como trabalhar com “smart
contracts”.
Esse novo tipo de documento une a linguagem
legal com a programação, que garante que as cláusulas acordadas estão sendo
cumpridas pelas partes que assinar o contrato.
“É mais normal encontrar engenheiros de
software e desenvolvedores procurando os cursos sobre blockchain, no entanto
cada vez mais advogados têm procurado se atualizar para saber ler esse novo
tipo de contrato, que é a tendência para a área. Também temos empresas da área
médica e de seguros querendo se atualizar”, fala Leite.
Até mesmo o seu currículo pode ser afetado
pelo blockchain. De acordo com estudos da Michael Page com projeções sobre o
futuro dos currículos, o documento, seu histórico profissional e todos os
certificados serão digitais.
O clássico CV se tornará uma plataforma
interativa com auxílio de assistentes virtuais e segurança e credibilidade
asseguradas pelo blockchain.
Quais as
oportunidades de emprego?
O fundador da startup avisa que o mercado
hoje ainda não é muito grande, mas estima que 80% das empresas querem usar a
tecnologia.
Para começar a trabalhar com ela, no entanto,
a pessoa deve escolher o modelo que deseja aprender. Corda, QLP e Hyperledger
são algumas das linguagens mais populares para quem deseja trabalhar para
empresas privadas. “Dão boa visibilidade no mercado e garantem bons salários”, diz
Leite.
Aqui no Brasil, ter experiência com uma
delas pode garantir uma vaga no setor de inovação do Itaú. Desde 2016, o banco
já faz um investimento em blockchain para conhecer a tecnologia e seus
conceitos.
“Nós focamos em times multidisciplinares, que
juntam programadores com funcionários da área de negócios. Não vemos sentido em
pensar unicamente na tecnologia, precisamos resolver problemas reais da
empresa”, explica Igor Freitas, superintendente de tecnologia do Itaú Unibanco.
Segundo ele, o banco dá atenção para todas
as tecnologias emergentes, como Internet das Coisas, Big Data e Inteligência
Artificial, pensando em novas soluções.
O superintendente aconselha que os
profissionais procurem primeiro habilidades comuns entre programadores, como
dominar a linguagem Java, depois procurar especialidades para ampliar seu
entendimento das novidades no mercado e se destacar no recrutamento de talentos.
No banco, os cargos são para pessoas
desenvolvedoras, engenheiras de software e arquitetas de tecnologia, não
especificamente um especialista em Corda.
“Existe espaço no mercado para adoção da
tecnologia de forma mais abrangente, não atrelada a criptomoedas. Usamos os
conceitos para redes privadas”, comenta ele.
Para projetos públicos, feitos na comunidade
online e abertos para programadores no mundo inteiro, Ethereum e Estellar são
duas linguagens para aprender.
Henrique Leite recomenda que as pessoas
também tenham conhecimentos de inglês, pois a maior parte dos conteúdos, cursos
e interações são na língua. E, para desenvolver suas habilidades, o contato com
a comunidade é essencial.
Mas é possível começar de diversas maneiras
e buscar novos desafios, o próprio Henrique entrou em contato pela primeira vez
com o blockchain por meio de um Hackaton. Os eventos presenciais, palestras e
encontros de grupos de estudos ajudam a entrar e avançar na área.
Por Luísa Granato
Fonte Exame Online