Workaholic. Perfeccionista. Dedicado demais
ao trabalho. Essas são algumas das respostas mais ouvidas em entrevistas de
emprego à famigerada questão: “Qual é o seu principal defeito?”. O truque é
manjado: temendo revelar suas falhas verdadeiras e ser reprovado na seleção, o
candidato faz elogios disfarçados a si mesmo. Quem não contrataria uma pessoa
cujo único problema é gostar demais de trabalhar?
Não funciona. “Se o avaliador é minimamente
experiente, vai perceber que o candidato não está sendo sincero e quer esconder
alguma coisa”, afirma Guilherme Malfi, gerente de recrutamento da consultoria
Talenses.
Ao fazer a clássica pergunta, o recrutador
tem três objetivos em mente.
O primeiro é simples e direto: conhecer os
pontos que o profissional à sua frente ainda precisa desenvolver. Isso é
essencial para saber se ele está preparado para assumir imediatamente a vaga, ou
se será preciso treiná-lo em algum aspecto técnico ou comportamental depois de
contratá-lo.
A segunda intenção, um pouco mais sutil, é investigar
o grau de autoconhecimento do candidato. “A sua resposta revela muito sobre o
seu grau de maturidade e inteligência emocional”, diz Malfi. “Quem tem
consciência das próprias lacunas é muito valorizado pelo mercado, porque a
consciência daquilo que você não sabe é o primeiro passo para o aprendizado”.
O terceiro intuito é avaliar a sua abertura
às críticas, diz Isis Borge, gerente da consultoria de recrutamento Robert Half.
Segundo ela, a resposta do candidato mostrará se ele é humilde o suficiente
para reconhecer suas próprias fraquezas e se abrir a eventuais feedbacks
negativos — uma capacidade que será fundamental no dia a dia caso ele seja
contratado.
Naturalmente, não existe resposta certa ou
errada para esse questionamento: a única regra é dizer a verdade.
Sinceridade ou
sincericídio?
Ninguém gosta de expor suas falhas. Portanto,
para conversar tranquilamente sobre os seus defeitos com o recrutador, é
preciso entender a entrevista de emprego como um momento excepcional, único, atípico,
totalmente diferente de qualquer outra situação social.
“Tire o peso atribuído culturalmente a essa
pergunta e tente enxergá-la de outra forma, como uma ferramenta usada por outra
pessoa para conhecer você de forma mais profunda”, afirma Borge. “Tire as
máscaras e seja tão honesto com o recrutador quanto seria com você mesmo”.
A chave para deixar de enxergar a
sinceridade como algo perigoso em um processo seletivo é compreender que
nenhuma empresa séria e madura tem a pretensão de contratar um profissional perfeito.
É aceitável e até esperado que você tenha problemas e dificuldades. Com um
detalhe: é altamente desejável que você saiba muito bem quais eles são.
“No passado, era inadmissível dizer numa
entrevista que você é uma pessoa desorganizada, por exemplo, era sinônimo de
desclassificação”, afirma Malfi. “Hoje, as empresas estão muito mais abertas à
sinceridade, preferem jogar um jogo mais transparente com os profissionais
antes de contratá-los, para evitar surpresas desagradáveis depois”.
Ser honesto não é mais um risco, mas uma
necessidade — tanto para ter um bom resultado na entrevista quanto para ser
feliz no emprego que você eventualmente vai conseguir. Afinal, se os seus
defeitos são considerados inaceitáveis pela empresa a ponto de eliminar você do
processo seletivo, isso significa que você e aquele empregador não combinam e
não serão felizes juntos.
A partir desse raciocínio, Borge e Malfi dão
3 conselhos básicos para se preparar para a pergunta mais temida da entrevista
de emprego:
1. Pense a respeito
do assunto com antecedência
Não necessariamente você será confrontado
com o questionamento sobre os seus defeitos, mas é bom estar preparado para ela
se acontecer. A dica de Malfi é dedicar um tempo antes da entrevista para
pensar profundamente sobre as suas fraquezas, tanto técnicas quanto
comportamentais.
Como vão suas habilidades de escrita? Você
tem dificuldade com números? Seu inglês anda enferrujado? Tem facilidade para
se relacionar com pessoas diferentes de você? Consegue administrar seu tempo ou
vive correndo atrás do relógio? Perguntas desse tipo podem guiar a sua reflexão
e produzir boas conclusões. “Com essa preparação, você irá para a entrevista
com uma resposta clara, embasada e sincera na ponta da língua”, diz o gerente
da Talenses.
2. Peça feedback
Mesmo pessoas com altíssimo grau de
inteligência emocional não têm condições de saber tudo a seu próprio respeito. Por
isso, antes da entrevista de emprego, é importante perguntar para profissionais
que convivem com você quais são as principais falhas que eles percebem nas suas
entregas e no seu comportamento de forma geral.
De acordo com Borge, é interessante ouvir o
feedback de chefes, pares e subordinados. Quanto mais diversos forem os perfis
dessas pessoas, melhor. Se você ainda não tem muita experiência profissional, vale
também perguntar para familiares e amigos. O importante é ter uma visão externa
sobre quem você é (ou aparenta ser).
3. Estude o perfil
da empresa e os requisitos da vaga
Certo e errado podem ser conceitos muito
relativos. A competitividade, por exemplo, é uma grande qualidade para empresas
que valorizam o trabalho individual e a disputa agressiva por resultados. Por
outro lado, pode ser um sério defeito sob o ponto de vista de um empregador com
modelo de trabalho colaborativo e avesso ao “estrelismo” de um ou outro
funcionário.
Na sua preparação, orienta Borge, busque
investigar a fundo qual é a cultura da empresa e as características do cargo
que você está pleiteando. Só assim você vai saber o que o recrutador realmente
quer dizer com a palavra “defeito”.
Por Claudia Gasparin
Fonte Exame Online