Mesmo havendo previsão expressa em contrato,
a entidade de previdência privada não pode descontar do pecúlio devido aos
beneficiários de segurado falecido o saldo devedor de empréstimo contraído por
ele.
Com esse entendimento, a Terceira Turma do
Superior Tribunal de Justiça (STJ) negou provimento ao recurso de uma entidade
previdenciária e manteve decisão que impediu o desconto dos valores devidos
pela participante falecida do pecúlio a ser pago aos seus beneficiários.
Após a celebração do contrato de previdência
complementar, a segurada firmou um contrato de mútuo com a entidade, dando em
garantia, caso não quitasse a dívida em vida, o valor do benefício contratado.
Segundo a relatora do recurso no STJ, ministra
Nancy Andrighi, a vontade manifestada pela participante, ao contrair o
empréstimo e oferecer o pecúlio em garantia, não vai além de sua morte, porque
tal obrigação não pode atingir o patrimônio de terceiros, independentemente de
quem sejam os indicados por ela como seus beneficiários.
“A morte da participante do plano de
previdência complementar fez nascer para os seus beneficiários o direito de
exigir o recebimento do pecúlio, não pelo princípio de saisine, mas sim por
força da estipulação contratual em favor dos filhos, de tal modo que, se essa
verba lhes pertence por direito próprio, e não hereditário, não pode responder
pelas dívidas da estipulante falecida”, afirmou a ministra.
Nancy Andrighi destacou que se aplica ao
contrato de previdência privada com plano de pecúlio a regra do artigo 794 do
Código Civil estabelecida para o seguro de vida, segundo a qual o capital
estipulado não está sujeito às dívidas do segurado, tampouco se considera
herança para qualquer efeito.
Pessoas distintas
A relatora citou doutrina segundo a qual
segurado e beneficiário não podem ser a mesma pessoa e, assim, tratando-se de
valor pertencente ao beneficiário, este não está sujeito às dívidas do segurado.
Ela destacou ainda que tanto o Código de Processo Civil de 1973 quanto o de 2015
preveem a impenhorabilidade relativa dos pecúlios, tal qual o seguro de vida.
A entidade de previdência argumentou que
buscava tão somente o respeito a ato jurídico perfeito praticado pela ex-participante,
sem nenhum vício, consistente no contrato de mútuo com caução do benefício a ser
pago em caso de morte.
De acordo com a relatora, foi correta a
interpretação do tribunal de origem de que a compensação de valores não é
possível no caso analisado, pois não há identidade das partes credora e
devedora, o que torna inviável o desconto daquilo que é patrimônio de terceiro
estranho à relação contratual originária.