O cancelamento unilateral e automático de um
dos trechos da passagem aérea sob a justificativa de não ter o passageiro se
apresentado para embarque no voo antecedente é caracterizado como uma prática
comercial de conduta abusiva.
As empresas do ramo de transporte aéreo de
passageiros vêm adotando o cancelamento unilateral de um dos trechos da
passagem em razão do não comparecimento no voo de ida (no show).
Ou seja, quando do não comparecimento do
passageiro para o embarque no voo antecedente, automaticamente, sua passagem de
volta é excluída com a aparente finalidade de viabilizar nova comercialização
do assento da aeronave.
Todavia, constata-se que esta prática atende,
tão somente, os interesses comercias da empresa, promovendo a obtenção de maior
lucro a partir da dupla venda.
Apesar desta conduta justificar do ponto de
vista econômico e empresarial, por outro lado, não a legitima posto que
configura uma prática comercial que causa prejuízos à parte vulnerável da
relação de consumo, cuja proteção é imposta pela Constituição Federal e
concretizada pelo Código de Defesa do Consumidor.
De acordo com as linhas principiológicas do
CDC, avalia esta prática comercial como abusiva por afrontar os direitos
básicos do consumidor, tais como, a vedação do enriquecimento ilícito, a falta
de razoabilidade nas sanções impostas e, ainda, a deficiência na informação
sobre os produtos e serviços prestados.
Sobre o aspecto do enriquecimento ilícito
configura-se de forma evidente no momento em que o consumidor, ainda que em
contratação única e utilizando se de tarifa promocional, adquire o serviço de
transporte materializado em dois bilhetes de embarque autônomos e vê-se
impedido de fruir um dos serviços que contratou, o voo de volta.
Por sua vez, constata-se a falta de razoabilidade
quanto à aplicação de penalidades pela empresa aérea frente ao abusivo
cancelamento do voo subsequente.
Quanto a deficiência de informação nos
contratos de adesão sobre cláusulas restritivas dos direitos do consumidor, configura-se
afronta ao princípio da transparência (CDC, art. 4º, caput) – o que resulta a
nulidade da respectiva cláusula contratual, com fundamento no art. 51, inciso
XV, do CDC.
Conclui-se, desse modo, que a conduta da
companhia de cancelar o bilhete de volta, por não ter sido utilizado pela parte
o bilhete de ida, configura ato ilícito, gerando para o consumidor o direito de
ser ressarcido por eventuais danos morais que suportar, dependendo das
circunstâncias de cada caso.
STJ - REsp 1.595.731-RO, Rel. Min. Luis
Felipe Salomão, por unanimidade, julgado em 14/11/2017, DJe 01/02/2018.
Por Renata C K Bastos
Fonte JusBrasil Notícias