Diante
do crescimento significativo da quantidade de arbitragens no valor nelas
envolvidos, muito tem se escrito sobre a matéria no Brasil, especialmente
quanto a questões técnicas. Nossos advogados têm demonstrado grande qualidade e
aprendem rapidamente as melhores técnicas. Não obstante, tenho identificado um
vício na arbitragem, herança maldita do processo judicial: a verborragia dos
advogados, que tendem a escrever, desnecessariamente, petições imensas.
É
paradoxal que, em um país com mais de 100 milhões de processos, nossos
advogados escrevam tanto, fenômeno que provavelmente só sociólogos,
historiadores e, quiçá, psiquiatras possam explicar. Parece que os advogados
não escrevem para o julgador, que possui pouco tempo para decidir, mas sim para
impressionar o cliente leigo, aproveitando as facilidades tecnológicas que
permitem o “recorta e cola” de trabalhos anteriores.
A
lição de Mark Twain continua atual: dá mais trabalho fazer manifestações
sucintas, pois elas requerem melhor entendimento da demanda e identificação
mais precisa das questões de fato e de direito. Mas exatamente por isso as
petições curtas são mais eficientes do que as longas.
A
arbitragem tem reinventado o contencioso de alto nível, tornando o processo
mais informal, flexível e eficiente. Essa mudança deve atingir também a forma
de se elaborar manifestações. A começar pela forma parnasiana que os advogados
forenses muitas vezes redigem, que deveria ser relegada ao arquivo morto da
prática, merecendo o mesmo fim do que as polainas. Passa por uma boa dose de
redução do nível de litigiosidade nas petições, o que pode se justificar no
Poder Judiciário, para chamar atenção de julgador soterrado em outros
processos, mas que não faz sentido em procedimento como arbitragem, em que o
árbitro dedica bastante tempo ao feito.
E
esse processo de inovação deve alcançar o tamanho das peças processuais, pois
isso contribuirá para que as arbitragens sejam mais rápidas. Afinal, como
esperar que o árbitro decida em poucos meses, se ele tiver quer analisar
centenas ou milhares de páginas de petições? Vejam que o tamanho da petição não
é o que mais importa, mas sim a sua profundidade. Tanto assim que tribunais
como a Suprema corte norte-americana impõe limite de páginas para recursos.
Dito
isso, gostaria de contribuir, de forma bem-humorada, com esse debate, com os
seguintes “10 Mandamentos” da boa petição na arbitragem:
1º mais é menos:
não escreva demais, porque quanto maior o texto, menor a probabilidade de ser
lido. Além disso, textos longos diluem o impacto do conteúdo.
2º escreva de forma esquemática, com introdução,
capítulos e conclusão. A boa
petição é aquela que se consegue um resumo dos argumentos no índice, no
parágrafo introdutório ou na conclusão. Isso facilita que os árbitros entendam
os principais argumentos e os enfrentem na decisão.
3º um parágrafo por argumento. Não mais do que 10 linhas por parágrafo,
salvo se você for o José Saramago.
4º evite tom bombástico. Os árbitros sabem que nem tudo é preto ou branco e que
existem mais do que 50 tons de cinza no mundo real. Há estudos psicológicos
atestando que ser muito enfático tira credibilidade.
5º adote escrita direta. Evite o “data venia”. Está fora de moda e dificulta o
entendimento da mensagem que você quer passar. Use latim apenas se necessário.
Estrangeirismos só se não houver equivalente em português.
6º a petição serve para a parte cumprir com o seu ônus
da prova e para rebater as alegações da contraparte. Por isso, antes de escrever, ponha no papel
tudo o que se precisa provar e tudo o que se precisa rebater de argumentos
contrários. Se o tema não for relevante para o cumprimento do ônus da prova ou
para se rebater alegação relevante da contraparte, não merece estar na petição.
7º verba volent, scripta manent. Muito cuidado com o que escreve. Só afirme
o que tiver certeza, para que não haja contradição no futuro e seu discurso não
vire uma “metamorfose ambulante”. Todas as afirmativas devem estar baseadas em
alguma prova, seja documental, seja testemunhal, seja pericial ou de outra
natureza. Ponha referências às provas existentes como notas de rodapé. Não seja
tímido em transcrever cláusulas contratuais, trechos de documentos e depoimentos
que lhe forem favoráveis.
8º petição não é prova de faculdade. Não discorra sobre questões jurídicas que
todo mundo – e principalmente os árbitros – estão cansados de saber. Por
exemplo, ninguém precisa de lição sobre boa-fé objetiva. Vá direto ao ponto
controvertido. Evite mais do que duas citações e duas jurisprudências sobre
cada ponto. No entanto, se a questão for realmente controversa, aprofunde a
pesquisa. Ao aplicar instituto jurídico, não deixe de cotejar os requisitos de
sua aplicação com o caso concreto. Pareceres de professores só são úteis se
realmente adicionarem valor, ou seja, se a matéria for tão específica que
compense um olhar acadêmico diferenciado.
9º não cite os árbitros, pois eles sabem o que escreveram, e o trabalho acadêmico deles
não cria “coisa julgada”.
10º,
e mais importante, você escreve para os
árbitros, não para você mesmo. Tente ser claro e, ao mesmo tempo,
interessante. Pense na petição como um bom livro de “não ficção”. O árbitro
deve ler não só por obrigação, mas também por prazer de entender o litígio.
Por
Joaquim de Paiva Muniz
Fonte
Migalhas