As
dificuldades da vida contemporânea, agravadas pela crise econômica e o aumento
da concorrência, tornam a realização profissional um sonho mais difícil de ser
alcançado do que há 20 ou mais anos.
As
barreiras existentes para ingressar ou formar uma banca de advocacia, para ser
aprovado em concurso público ou conseguir ser professor de uma Faculdade de
Direito, podem levar o jovem profissional ao desalento e a um nocivo
conformismo. O psiquiatra Augusto Cury
chama tal estado de ânimo de coitadismo, observando que:
“O coitadismo é o
conformismo potencializado, capaz de aprisionar o Eu para que ele não utilize
ferramentas para transformar uma história. Vai além do convencimento de que não
é capaz, entra na propaganda do sentimento de incapacidade. O coitadista faz
marketing de suas crenças irreais, de impotências e limitações. Não tem vergonha
de dizer “Sou desafortunado!”, “Sou um derrotado!”, “Nada que faço dá certo!”,
“Não tenho solução!”, “Ninguém gosta de mim!”
(O Código da Inteligência, Sextante, p. 50).
O
coitadismo acaba sendo uma armadilha, pois leva seu portador à inanição, termina
com sua vontade e ambição. E, de certa forma, acaba sendo aceito com
benevolência por terceiros, pois o coitadista, aparentemente, não oferece
nenhum grau de risco aos que o rodeiam e, por isso mesmo, desperta piedade.
Ao
inverso, o ambicioso desperta sentimentos mistos, mais complexos, como
admiração, medo e inveja. Afinal, o crescimento do ambicioso poderá
exteriorizar o insucesso de quem, dele, está próximo.
Portanto,
por essas peculiaridades do ser humano, na área do Direito quem se proclama um
coitado, um perseguido pelo destino, é visto com mais simpatia do que quem se
propõe a lutar, vencer, conquistar espaços.
Mas
qual o resultado de uma ou de outra posição na vida pessoal e profissional da
pessoa?
O
coitadista pode ser um jovem iniciando sua vida profissional ou um bacharel em
Direito com anos de casa. O jovem, depois de tentativas frustradas, pode
rebelar-se contra o Exame de Ordem, o mercado de trabalho, os concursos, o
sistema de Justiça ou qualquer obstáculo que se interponha entre ele e o
sucesso.
Essa
posição de vítima poderá resultar solidariedade dos que lhe estão próximos,
solidariedade essa nem sempre será sincera. Na verdade, muitos concluirão, sem
nada dizer-lhe, obviamente, que ele não é muito esforçado ou que seu Q.I. está
bem abaixo do mínimo desejável. Em outras palavras, ao assumir tal posição o
sujeito não avançará um passo na busca da realização pessoal.
Vejamos
agora a situação de um coitadista mais vivido, com boa experiência profissional
na bagagem. Suas queixas poderão atingir alvos diversos. Por exemplo, sendo
juiz, poderá lamuriar-se que não é
reconhecido pelo seu Tribunal, não integrou, injustamente, a última
lista tríplice de promoção ou que não recebeu apoio financeiro para cursar
mestrado. Sendo advogado, poderá viver a lamentar a ingratidão dos clientes ou
a demora no julgamento de suas causas.
Por
sua vez, a ambição é o sentimento existente no lado oposto, a mola propulsora
do mundo. Ela exige vontade, garra, força física e psicológica. Além disto,
estimula a dedicação aos estudos, o aperfeiçoamento profissional, o crescimento
cultural em sentido amplo e não apenas no campo do Direito.
O
ambicioso, por vezes, é visto com reservas, como se fosse errado querer subir
na escala social e econômica. Contudo, não há nada de errado em uma jovem
recém-formada querer ter o melhor escritório de advocacia de sua cidade ou de
um procurador do Estado almejar ser procurador da República e trabalhar em
importantes processos envolvendo políticos e empresários. Da mesma forma, não
merece qualquer crítica um desembargador que ambicione ser ministro do STJ ou
um advogado consagrado que deseje ser ministro do STF. São aspirações legítimas.
A
ambição tem apenas um risco: tornar-se incontrolável. Aí, sim, ela é nociva.
Quem, para alcançar destaque, bajula, corrompe-se, humilha-se perante os que
podem ajudá-lo na empreitada, abandona seus ideais sob a justificativa de que
não há outro jeito, evidentemente não está utilizando a ambição corretamente. É
uma deformação de algo positivo.
Imagine-se
um professor que, na busca de uma posição de mando em uma universidade, não
hesita em divulgar, através de terceiros, os erros de seu oponente nas redes
sociais, prejudicando a imagem do adversário. Ou um procurador de Justiça que,
para alcançar a posição de procurador geral da Justiça acerta acordos com os
que apoiam sua campanha, garantindo posições corporativas injustificáveis.
Ainda, um líder da advocacia que, para alcançar posto de destaque na seccional
da OAB, abandona os filhos à própria sorte, perdendo-se em sucessivas viagens
para isto ou aquilo.
Nesses
casos, a ambição não foi bem dimensionada. Ela deve estar sempre adequada a
outros valores importantes, pois de nada valerá alcançar-se um objetivo
profissional se nos outros setores de sua vida a pessoa carregar o fardo de
fracassos familiares, rejeição pelos amigos ou pela sociedade. De que valerá
ser ministro do STF se o filho, graduado em Direito, passar as tardes no quarto
com depressão ou entregue às drogas? De
que adianta ocupar as mais altas posições na hierarquia do Estado e temer ser
vaiado em um restaurante?
Em
suma, na condução da vida profissional, nada há de errado no fato do
profissional do Direito querer ser um vencedor na advocacia ou no serviço
público, inclusive alcançando status e boa posição financeira. Ao contrário,
Isto é muito mais saudável do que entregar-se ao escapismo, tornar-se um
coitadista que dedica seu tempo a atribuir a outros ou ao destino a culpa por
seu insucesso.
No
entanto, na busca do êxito é preciso tomar cuidado com a via escolhida, pois a
ambição não justifica o abandono de valores como a ética, a honestidade e a
solidariedade, sem os quais o sucesso será apenas uma aparência exibida no
Facebook, escondendo o sentimento amargo da insatisfação pessoal. Na longa
caminhada das profissões jurídicas, cada um faz a sua opção e traça o seu
destino.
Por
Vladimir Passos de Freitas
Fonte
Consultor Jurídico