quarta-feira, 23 de outubro de 2019

CLIENTES ESPECIAIS PAGAM CARO POR CARTÃO E CONTAS, MAS SE FRUSTRAM COM BANCOS


O cartão de crédito ganha uma cor nova, com design arrojado e aparência de coisa chique. A agência tem carpete, cafezinho e sofá na sala de espera com televisão funcionando e gerentes, em tese, mais sorridentes. A estratégia criada pelos bancos para reunir os clientes considerados de alto padrão começou a se espalhar pelo Brasil no fim da década de 1990. As instituições estrangeiras deram a largada, acompanhadas logo em seguida das nacionais.
Os nomes por si só já tentam impor a sofisticação prometida aos VIPs, assim definidos pelos bancos: BB Estilo, Bradesco Prime, Santander Select, Itaú Personnalité e por aí vai. Puxada pelo aumento médio da renda da população nos últimos anos, a carteira desses clientes cresceu expressivamente e os espaços físicos reservados a eles se proliferaram, inclusive pelo interior do país. Com o avanço rápido, a modalidade acabou reproduzindo fragilidades do sistema bancário, alheias ao perfil da clientela.
Clientes “privilegiados” constataram que o discurso do atendimento personalizado e das taxas diferenciadas, na maioria das vezes, não se concretizam. Também perceberam que o ar-condicionado e a recepcionista chamando pelo nome não são garantias de que o gerente será eficiente e terá, de fato, disposição para dar as informações completas e de maneira transparente. Frustrados com as propagandas enganosas, muitos sentem saudades dos tempos de menos pompa como “cliente comum”. E se arrependem de ceder aos apelos das instituições, pois ser VIP custa caro e o retorno é baixo.
Sendo assim, os especialistas recomendam: os VIPs não devem se acanhar e cobrar dos bancos os mesmos direitos de qualquer consumidor, com uma atenção adicional, pois, se o banco vendeu a ideia de prestígio e maior eficiência, a promessa tem de ser cumprida, sob pena de desrespeito ao Código de Defesa do Consumidor. Pela legislação em vigor, especificamente no artigo 35, o fornecedor é obrigado a prestar o serviço “nos termos da oferta, apresentação ou publicidade”. Caso contrário, o contrato está sendo descumprido.
A decepção com os compromissos de exclusividade não efetivados tem levado consumidores a duvidar do conceito de alto padrão dos bancos. “Se perderam o controle e não podem oferecer atendimento diferenciado de verdade, como asseguram, as instituições financeiras precisam rever a própria política em relação a esses clientes”, comenta a coordenadora institucional da Associação Brasileira de Defesa do Consumidor (Proteste), Maria Inês Dolci.
MIMOS. Quem se enquadrou na faixa de renda estipulada pelos bancos e virou VIP não deve se deixar anestesiar pelos mimos, que, no entender de Dolci, muitas vezes não servem para nada. Há cartões de crédito que cobram taxas de anualidades altíssimas prometendo serviços especiais, como concierge de hotel, que não servem para nada. Os verdadeiros diferenciais, emenda a especialista, passam pela qualidade do atendimento, por informações precisas, preços justos e pela resolução dos problemas com rapidez. “Uma agência mais bonita, um cartão VIP e uma secretária que acompanha até a sala do gerente não podem ser suficientes para satisfazer o cliente”, sustenta.
A maioria dos clientes de alta renda espera dos bancos, no mínimo, descontos generosos nas tarifas, sublinha a economista do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), Ione Amorim. Ao atingir o padrão VIP — demandando, em tese, mais serviços e gerando mais lucro à instituição —, aspira-se, inclusive, à isenção de taxas. “Muitos consumidores não acreditam mais nessas conveniências do conceito prime. Há um claro desgaste nessa relação”, diz Amorim.
Fonte Correio Braziliense