O
cartão de crédito ganha uma cor nova, com design arrojado e aparência de coisa
chique. A agência tem carpete, cafezinho e sofá na sala de espera com televisão
funcionando e gerentes, em tese, mais sorridentes. A estratégia criada pelos
bancos para reunir os clientes considerados de alto padrão começou a se
espalhar pelo Brasil no fim da década de 1990. As instituições estrangeiras
deram a largada, acompanhadas logo em seguida das nacionais.
Os
nomes por si só já tentam impor a sofisticação prometida aos VIPs, assim
definidos pelos bancos: BB Estilo, Bradesco Prime, Santander Select, Itaú
Personnalité e por aí vai. Puxada pelo aumento médio da renda da população nos
últimos anos, a carteira desses clientes cresceu expressivamente e os espaços físicos
reservados a eles se proliferaram, inclusive pelo interior do país. Com o
avanço rápido, a modalidade acabou reproduzindo fragilidades do sistema
bancário, alheias ao perfil da clientela.
Clientes
“privilegiados” constataram que o discurso do atendimento personalizado e das
taxas diferenciadas, na maioria das vezes, não se concretizam. Também
perceberam que o ar-condicionado e a recepcionista chamando pelo nome não são
garantias de que o gerente será eficiente e terá, de fato, disposição para dar
as informações completas e de maneira transparente. Frustrados com as
propagandas enganosas, muitos sentem saudades dos tempos de menos pompa como
“cliente comum”. E se arrependem de ceder aos apelos das instituições, pois ser
VIP custa caro e o retorno é baixo.
Sendo
assim, os especialistas recomendam: os VIPs não devem se acanhar e cobrar dos
bancos os mesmos direitos de qualquer consumidor, com uma atenção adicional,
pois, se o banco vendeu a ideia de prestígio e maior eficiência, a promessa tem
de ser cumprida, sob pena de desrespeito ao Código de Defesa do Consumidor.
Pela legislação em vigor, especificamente no artigo 35, o fornecedor é obrigado
a prestar o serviço “nos termos da oferta, apresentação ou publicidade”. Caso
contrário, o contrato está sendo descumprido.
A
decepção com os compromissos de exclusividade não efetivados tem levado
consumidores a duvidar do conceito de alto padrão dos bancos. “Se perderam o
controle e não podem oferecer atendimento diferenciado de verdade, como
asseguram, as instituições financeiras precisam rever a própria política em
relação a esses clientes”, comenta a coordenadora institucional da Associação
Brasileira de Defesa do Consumidor (Proteste), Maria Inês Dolci.
MIMOS.
Quem se enquadrou na faixa de renda estipulada pelos bancos e virou VIP não
deve se deixar anestesiar pelos mimos, que, no entender de Dolci, muitas vezes
não servem para nada. Há cartões de crédito que cobram taxas de anualidades
altíssimas prometendo serviços especiais, como concierge de hotel, que não
servem para nada. Os verdadeiros diferenciais, emenda a especialista, passam
pela qualidade do atendimento, por informações precisas, preços justos e pela
resolução dos problemas com rapidez. “Uma agência mais bonita, um cartão VIP e
uma secretária que acompanha até a sala do gerente não podem ser suficientes
para satisfazer o cliente”, sustenta.
A
maioria dos clientes de alta renda espera dos bancos, no mínimo, descontos
generosos nas tarifas, sublinha a economista do Instituto Brasileiro de Defesa
do Consumidor (Idec), Ione Amorim. Ao atingir o padrão VIP — demandando, em
tese, mais serviços e gerando mais lucro à instituição —, aspira-se, inclusive,
à isenção de taxas. “Muitos consumidores não acreditam mais nessas
conveniências do conceito prime. Há um claro desgaste nessa relação”, diz
Amorim.
Fonte
Correio Braziliense