sexta-feira, 4 de setembro de 2015

SEPARAÇÃO: QUEM FICA COM O ANIMAL DE ESTIMAÇÃO?


Um casal de amigos da colunista conviveu durantes anos como se marido e mulher fosse, por priorizar o lado profissional, decidiram adiar o plano de terem um filho e compraram uma linda cadela da raça yorkshire denominada Bekinha que passou a ser o xodó do casal.
O amor entre o casal acabou, mas a paixão pelo animal de estimação não, tendo o casal feito um acordo de “guarda compartilhada” que envolvia dias de semana para um e final de semana para outro.
Porém, se não tivesse acordo, qual seria a solução do caso se o judiciário fosse chamado a resolver?
A questão não é simples por inexistir legislação específica sobre o assunto, tendo em não raros casos, enfrentado a completa falta de sensibilidade por parte do judiciário, conforme é exemplo o seguinte julgado do Rio Grande do Sul, que pode ser lido com certo tom de deboche:

“O curioso é que em tempos de assoberbamento do Poder Judiciário, lotadas as mesas e os armários dos operadores do Direito da área de família com questões de grande relevância, tais como investigações de paternidade ou destituições de poder familiar, não estamos aqui tratando da busca e apreensão de um menor, cuja guarda se discute, mas sim de uma cachorrinha. E as petições lançadas por autor e requerida, eminentes colegas, não perdem de vista as expressões de ‘direito de guarda’ e ‘direito de visita’, não sendo de estranhar que surgisse, em algum momento, alusão à defesa do ‘melhor interesse canino’.”(processo. Nº 70038022414)
Não vejo de forma tão insensível assim, os animais de estimação têm ganhado cada vez mais espaço na vida das famílias, delas afetivamente se tornando membros efetivos, tanto como qualquer filho ou ente querido, fato que o judiciário não pode relegar.
Para a legislação vigente, os animais são considerados como bens materiais, como uma casa, um carro ou utensílios domésticos.
O Código Civil atual regula a partilha de bens conforme o regime adotado pelas partes, podendo ser feito de forma isonômica, como é o caso do regime de comunhão parcial (que é o geral e por isso mais comum); conforme o patrimônio construído por cada um dos cônjuges antes ou depois do casamento, como é o caso do regime de separação total dos bens; ou conforme a participação de cada um na construção do patrimônio, como é o caso do regime de participação final nos aquestos.
É evidente que não se dá para “vender” o animal de estimação e repartir o resultado entre os conjugues, de longe não é a solução mais adequada, pois, voltando ao exemplo inicial, não me parece que vender a amada Bekinha seria o resultado ideal caso não houvesse acordo.
Claro que as questões da vida moderna levam muitas vezes o Judiciário e os operadores do Direito a ter de interpretar as situações cotidianas com aplicação do bom senso mitigando o que está previsto em leis que já se tornaram ultrapassadas. O melhor mesmo é a adoção de uma solução intermediária, considera-se como parte do patrimônio para fins patrimoniais e confere-se status de pessoa (membro da família) para fins pessoais.
Considera-se patrimônio para fins patrimoniais para que o pet não tenha direito de herança, porém status de pessoa para fins pessoais, para que seja possível uma solução que não desconsidere o amor que se sente pelo animal, deferindo-se assim a guarda e direito de visita.
Nestes casos a guarda do animal tem sido concedida de forma compartilhada ou então, pela aplicação de bom senso, ao cônjuge que melhor apresente condições financeiras e de espaço físico para cuidar do animal, disponibilidade de tempo e grau de afetividade conferindo-se ao outro o direito de visitas ao animal. Assim pode-se dizer que para fins de guarda e visitas, o animal de estimação acaba saindo do status jurídico de bem para se tornar um membro da família.
Atualmente, existe o Projeto de Lei de nº 7.196/10 de autoria do deputado Márcio França (PSB/SP), prevendo novas diretrizes em casos de separação do casal, estando incluído, no texto do projeto, que os juízes deverão decidir sobre a guarda dos animais de estimação conforme é decido em relação aos filhos menores, devendo estipular quem ficará responsável pela guarda, assim como o direito de visitas de cada uma das partes envolvida. Diz que o juiz deverá decidir em razão do vínculo afetivo e das condições de oferecer cuidado ao animal.
Enquanto o Projeto de Lei não é aprovado, vamos depender da sensibilidade dos juízes de compreender que a relação do ser humano com o seu animal de estimação vai bem mais além do que sentimento de posse de bens materiais, como dizia Mahatma Ganhi “A grandeza de uma nação pode ser julgada pelo modo que seus animais são tratados.”.

Por Mayara Carneiro Ledo Mácola
Fonte JusBrasil Notícias