Na
era digital, usar como local de trabalho uma casa construída em uma árvore,
como a do Tarzã, é um projeto viável. Pelo menos para um advogado americano, um
"pássaro madrugador" (early bird) que gosta de iniciar suas
atividades diárias junto com os passarinhos. Todos os dias, às 5h da madrugada,
munido apenas de um copão de "chá-fé" (o café ralo dos americanos),
um laptop e tecnologia de computação em nuvem, que lhe dá acesso a todos os
documentos na rede do escritório, ele sobe à casa construída em uma árvore em
seu quintal. Trabalha até às 9h ou 10h. O resto do dia ele usa para ir aos
tribunais, trabalhar mais um pouco e fazer relacionamentos para conseguir mais
trabalho.
O
trabalho feito de casa está se desenvolvendo rapidamente, em duas vertentes. A
dos empreendedores — advogados autônomos ou sócios de pequenas firmas — e a dos
empregados de firmas, incluindo as de advocacia. Entre os empreendedores,
trabalhar de casa é uma opção mais viável. Já entre os trabalhadores com
vínculo empregatício, a ideia está se desenvolvendo mais devagar. Às vezes, as
firmas veem vantagens em permitir que seus advogados trabalhem de casa. Às
vezes, não. Da mesma forma, há prós e contras também para os advogados
empregados.
Uma
das vantagens de permitir a funcionários trabalhar de casa, segundo um estudo
recente feito em conjunto pelas Universidades de Stanford e de Pequim, é o
aumento da produtividade em pelo menos 13%. Os pesquisadores trabalharam com
uma empresa que presta serviços de atendimento ao consumidor, em que era
possível medir a produtividade dos funcionários. Uma equipe de 249 funcionários
foi dividida em dois grupos, um trabalhando de casa e outro do escritório.
Todos tinham um nível de experiência equivalente.
A
empresa viu mais vantagens no serviço feito à distância. Os funcionários que
trabalhavam em casa se conectavam mais cedo e ficavam mais tempo disponíveis
para atendimento aos clientes. Os intervalos no trabalho eram mais curtos e os
telefonemas para avisar que não iam trabalhar porque estavam doentes ou não se
sentiam bem foram significativamente reduzidos. Se não se sentiam bem,
trabalhavam assim mesmo, porque já estavam em casa. Outra vantagem foi a
possibilidade de reduzir consideravelmente o espaço físico utilizado pela
empresa e, com isso, custos de aluguel e de todas as despesas operacionais do
dia a dia, se adotassem um esquema definitivo para manter os funcionários em
casa.
Nos
Estados Unidos, 10% dos funcionários das empresas já trabalham de casa. O
percentual de pessoas que tocam os próprios negócios de casa ou que trabalham
por empreitada como profissionais autônomos é muito maior, segundo estimativas.
Mas não há estudos que deem números mais precisos para confirmar essa
presunção.
Calor humano
Na
China, o resultado do estudo, sob a ótica dos funcionários, não ajuda muito os
advogados que pensam em convencer o chefe a permitir que trabalhem de casa.
Depois de nove meses de experiência, metade dos participantes do estudo
preferiram voltar a trabalhar no escritório. O principal argumento foi o de que
receavam ser preteridos nas promoções. "Longe dos olhos do chefe, longe da
mente do chefe", foi o pensamenteo preponderante, baseado em fatos: no
período do estudo, as promoções beneficiaram muito mais os funcionários que
trabalharam no escritório.
Desenvolvimento
e manutenção de relacionamentos representam uma parte fundamental do processo
de promoção — tal como nos processos empresariais. Relacionar-se com os colegas
e com os superiores hierárquicos quando se está no escritório, no momento em que
as melhores oportunidades surgem, é muito mais fácil e produtivo do que fazê-lo
por telefone ou por e-mail. Telefonemas podem ser até inoportunos se o chefe
está em reunião ou muito ocupado. Mensagens de e-mail requerem um motivo e não
são a melhor maneira de estabelecer comunicações informais, segundo o site The
Careerist.
Perder
as fofocas do escritório também é uma desvantagem considerável, diz o site. É
por meio delas que se fica sabendo quem está em ascensão e quem está em queda
livre no escritório e se a firma está indo bem ou mal, evitando-se surpresas.
Quem fica em casa costuma receber notícias desagradáveis por um comunicado
tardio ou por notícias nos jornais, quando tudo já está perdido. O bate-papo no
escritório também ajuda a saber que projetos e casos estão para ser
empreendidos e o que fazer para se engajar ou não neles, até com antecedência.
Um
levantamento informal do site da Minnesota Public Radio com os leitores sugeriu
mais vantagens e desvantagens de se trabalhar de casa. Veja o que disseram os
leitores do site:
Vantagens
-
Ganho de tempo. Nos grandes centros urbanos, as pessoas podem perder de duas a
quatro horas por dia com deslocamentos para o trabalho e para casa. Esse é, de
longe, o mais importante para muitos;
-
Economia de custos. A redução das despesas com transporte (gasolina, uso do
carro, multas de trânsito) e de riscos de acidentes é substancial. Adeus,
congestionamentos. Se o carro está na oficina, não é preciso pegar táxi ou
transporte público;
-
Não sair de casa, em dias de tempestade, inundações e outras intempéries do
tempo. Colocar a temperatura do "escritório" à sua conveniência;
-
Produzir mais, com menos interrupções. Isso inclui os dias em que a pessoa não
está se sentindo bem para ir ao trabalho — algumas doenças não são impedimento
para se trabalhar em casa. Tudo o que é preciso está por perto;
-
Receber as crianças quando chegam da escola e cuidar delas, fazer as refeições
em casa, em vez de na rua, fazer as tarefas de casa, quando disponível, ir ou
levar as crianças ao médico ou ao dentista, sem ter de fazer arranjos com o
chefe no escritório, assistir a algum evento esportivo na TV no meio da tarde e
compensar o horário à noite — em outras palavras, ter flexibilidade de horário.
O horário de almoço torna-se bem mais curto para quem trabalha em casa,
naturalmente;
-
Uma vez que o esquema de trabalho em casa está montado, torna-se possível
trabalhar de qualquer lugar no mundo, onde haja uma conexão com a internet.
Isso possibilita, por exemplo, viajar, sem precisar tirar férias;
-
Desperta uma grande lealdade à firma que concede essa "mordomia" —
mesmo que o arranjo seja tão bom para a firma quanto para o funcionário; e
-
Não ter de fingir que está ocupado quando não há nada para fazer. Não ter um
chefe em sua cola. Não ficar sentado oito horas por dia em uma cadeira
desconfortável. Não lamentar, domingo à noite, que a segunda-feira está
próxima.
Desvantagens
-
Trabalhar em equipe, quando algum membro do time faz corpo mole: os demais
acabam fazendo trabalho extra;
-
Não estar disponível quando o chefe ou algum diretor precisa discutir problemas
pessoalmente com o funcionário. Em vez de uma reunião rápida, que pode ser
seguida de conversações posteriores se alguma coisa não foi discutida, é
preciso ligar, marcar horário para reunião, verificar disponibilidades etc.;
-
Não ter relacionamento cotidiano com os colegas e com os superiores
hierárquicos. Perder a convivência com colegas. Perder promoções;
-
Não ter ajuda dos colegas rapidamente quando há dificuldades no trabalho. Não
ter ajuda do setor de tecnologia quando há problemas no computador, outro
equipamento ou software (resolver por telefone é bem mais difícil). Ajudar os
colegas a resolver problemas à distância. Não saber se a pessoa está entendendo
ou não o que se está falando — face a face, basta olhar no rosto da outra
pessoa para saber;
-
Não ter disposição para ir a algum lugar, depois do trabalho, para se
relacionar com outros advogados ou com possíveis clientes, como em um happy
hour. Dá preguiça sair de casa no final da tarde ou começo da noite;
-
Perder reuniões de orientação. Perder treinamentos rápidos, às vezes não
programados. Perder a trilha da firma;
-
Comunicação por e-mail não tem expressão corporal e a pessoa nunca sabe qual é
a reação do interlocutor; e
-
As prioridades das crianças podem se tornar maiores que a do trabalho, porque
elas gritam ou choram. A família pensa que, "como você não está
trabalhando", tem tempo para tudo, incluindo lavar a louça e a roupa e
arrumar a bagunça da noite anterior.
Melhor solução
A
leitora Jeannie Ericson deu a fórmula para o que ela considera a melhor saída
para esse dilema: trabalhar de casa e do escritório. Isso balanceia prós e
contras, conforme as situações e as necessidades do advogado e da firma.
"Eu já trabalhei em todos os cenários. A abordagem balanceada é de longe a
melhor solução", garante.
Por
João Ozorio de Melo
Fonte
Consultor Jurídico