terça-feira, 13 de outubro de 2020

JUSTIÇA GRATUITA - NÃO BASTA PEDIR AO JUÍZO QUE A DEFIRA...

 

É bastante comum que muitos magistrados, país afora, ao se depararem com petições iniciais contendo pedido genérico de concessão de Justiça Gratuita, intimem o autor para que emende a petição inicial, concedendo-lhe prazo a fim de que "tragam-se provas aos autos da situação de hipossuficiência financeira enfrentada pelo autor, sob pena de indeferimento do pedido de Justiça Gratuita".

Por "pedido genérico" eu me refiro ao pedido com base apenas no que exposto no art. 99, § 3º do Código de Processo Civil de 2015 (CPC/2015) e nenhum documento juntado aos autos embasando-o.

Como sabemos, pelo teor do art. 321, caput, do CPC/2015, o juiz deve indicar com precisão o que deve ser corrigido ou completado antes de indeferir a inicial ou - como é o caso - indeferir o pedido de Justiça Gratuita, havendo determinação específica acerca disso no art. 99, § 2º do Códex de Ritos.

Embora o art. 99, § 3º do CPC/2015 deixe subentendido que, para o deferimento do pedido de gratuidade judiciária por parte da pessoa natural, bastaria que o Autor a alegasse, não é bem assim que ocorre na prática.

No dia a dia processual, os magistrados vêm intimando os autores para que provem tal hipossuficiência financeira por algum meio, algum documento, tendo em vista a "enxurrada de pedidos" nesse sentido que recebem diariamente, verdadeiro abuso de direito, por vezes motivando as chamadas "lides temerárias".

Ora, se o papel do instituto é isentar as pessoas pobres na forma da lei do pagamento de custas, evitando que sejam tolhidas do acesso à Justiça pela insuficiência de recursos, nada mais justo que negá-lo a quem não o merece, ou seja, a quem tem condições de suportar as despesas processuais.

Ainda que muitos não concordem com o modo de agir dos juízes neste particular, o fato é que é muito recomendável que você, advogado, na hipótese de pleitear essa "benesse", o faça juntando documentação que a comprove, para evitar dores de cabeça e meses de atraso em desfavor do seu cliente.

Em outras palavras e sem juridiquês: se o que o juiz quer é que o advogado prove que o seu cliente é realmente POBRE na forma da lei, essencial juntar essa documentação anexa à exordial.

Embora não haja um meio único de prova a esse respeito, pelo bom senso e praxe forense, para influir no convencimento motivado do magistrado, nós podemos juntar aos autos:

1) CTPS do autor que revele situação de desemprego;

2) contracheque revelando sua baixa renda;

3) comprovante de inscrição em programas de assistência social (vide Bolsa-Família e outros);

4) nesta pública e notória pandemia de Covid/19, prova bastante contundente é o comprovante de inscrição/recebimento do auxílio emergencial, custeado pelo Governo Federal;

5) comprovar recebimento de BPC - benefício de prestação continuada ou ainda;

6) ao empresário em situação difícil, pode-se ainda descrever a crise econômico-financeira por que passa o país e sua complicada situação econômica. Porém, sabemos que nesse caso a apuração será bem mais rigorosa, em vista do teor do verbete da Súmula de n.º 481 do C. STJ: "Faz jus ao benefício da Justiça Gratuita a pessoa jurídica com ou sem fins lucrativos que demonstrar sua impossibilidade de arcar com os encargos processuais".

Vejam que o conceito de "pobre na forma da lei" é a de alguém que não pode suportar os ônus processuais sem prejuízo do próprio sustento e/ou de sua família. Não se trata de esclarecer ao magistrado se você mora num bairro chique ou na periferia. Até mesmo pessoas que foram ricas um dia podem se encontrar numa situação bem diversa no momento, a tal ponto de fazerem jus à isenção em questão.

E quando falamos em Justiça Gratuita, é importante diferenciá-la da Assistência Judiciária Gratuita. Muito embora esse seja um tema tão velho quanto óbvio para alguns, para outros ainda é controvertido.

Que fique claro de uma vez por todas: pedido de concessão de Justiça Gratuita é uma coisa; Assistência Judiciária Gratuita é outra.

Isso porque a Justiça Gratuita diz respeito à isenção dada à pessoa com insuficiência de recursos, do pagamento das custas processuais, seja em primeira instância (custas processuais propriamente ditas) ou em grau de recurso (preparo).

Já Assistência Judiciária Gratuita diz respeito à atuação da Defensoria Pública, a qual age como representante processual dos hipossuficientes, das pessoas que não detêm meios de constituir um advogado particular, na esteira do que dispõe o art. 5º, LXXIV, da CF e Lei 1.060/1950, a qual teve vários dispositivos revogados pela entrada em vigência do CPC/2015 e pela legislação afeta à Defensoria Pública.

Note-se que não é porque a parte constituiu advogado particular que isso signifique que ela tem recursos para custear as despesas processuais (vide art. 99, § 4º, do CPC), mesmo porque o causídico pode ter pactuado com a parte um contrato de honorários com "quota littis", hipótese em que o patrono só receberá seus honorários caso vença a lide.

Em suma, fique ciente que é melhor juntar aos autos, de logo, as provas que o seu cliente é merecedor da Justiça Gratuita, por ser pobre na forma da lei (ou hipossuficiente, como queira), o que, certamente, lhe poupará tempo e afastará dores de cabeça.

Por Henrique Bandeira

Fonte Consultor Jurídico