O novo modo de tratamento do câncer é uma terapia de assistência
holística à saúde por excelência
“O
câncer é um fenômeno típico, uma doença característica de nosso tempo. O
desequilíbrio e a fragmentação que impregnam nossa cultura desempenham um papel
importante no desenvolvimento do câncer, impedindo ao mesmo tempo que os
pesquisadores médicos e os clínicos compreendam a doença ou a tratem com êxito.
A
imagem popular do câncer foi condicionada pela visão fragmentada do mundo em
nossa cultura, pela abordagem reducionista da nossa ciência e pelo exercício da medicina
orientado para o uso maciço de tecnologia. O câncer é visto como um forte e poderoso
invasor que ataca o corpo a partir de fora. Parece não haver esperança de controlá-lo,
e para a grande maioria das pessoas câncer é sinônimo de morte. O tratamento
médico — radiação, quimioterapia, cirurgia ou uma combinação dessas técnicas —
é drástico, negativo e danifica ainda mais o corpo. Os médicos estão cada vez mais
propensos a ver o câncer como um distúrbio sistêmico, uma doença que, no
início, é localizada, mas que tem a faculdade de se propagar e realmente
envolve o corpo inteiro, e em que o tumor original é apenas a ponta do iceberg.
Os pacientes, entretanto, insistem freqüentemente em considerar seu próprio
câncer um problema localizado, especialmente durante sua fase inicial. Vêem o
tumor como um objeto estranho e querem livrar-se dele o mais rapidamente
possível e esquecer todo o episódio. A maioria dos pacientes está tão completamente
condicionada em suas idéias, que se recusa a considerar o contexto mais amplo
de sua enfermidade, sem perceber a interdependência de seus aspectos psicológicos
e físicos. Para muitos pacientes cancerosos, seu corpo tornou-se um inimigo em
quem não podem confiar e do qual se sentem inteiramente divorciados.
Um
dos principais objetivos na abordagem Simonton é inverter a imagem popular do
câncer, que não corresponde às conclusões da pesquisa atual. A moderna biologia
celular mostrou que as células cancerosas não são fortes e potentes, mas, pelo
contrário, fracas e confusas. Elas não invadem, atacam ou destroem, mas,
simplesmente, se super-reproduzem. Um câncer principia com uma célula que
contém informação genética incorreta, porque foi danificada por substâncias
nocivas ou outras influências ambientais, ou simplesmente porque o organismo
produziu ocasionalmente uma célula imperfeita. A informação defeituosa impede a
célula de funcionar normalmente; e se essa célula reproduz outras com a mesma
constituição genética incorreta, o resultado é um tumor composto de uma massa
de células imperfeitas. As células normais se comunicam eficazmente com seu
meio ambiente para determinar suas dimensões ótimas e sua taxa de reprodução,
ao contrário do que acontece com a comunicação e a auto-organização das células
malignas. Em conseqüência disso, crescem mais do que as células saudáveis e
reproduzem-se a esmo. Além disso, a coesão normal entre as células pode se enfraquecer,
e então as células malignas desprendem-se da massa original e viajam para outras
partes do corpo, formando novos tumores — o que é conhecido como metástase.
Num
organismo saudável, o sistema imunológico reconhece as células anormais e as destrói,
ou, pelo menos, as mantém cercadas para que não possam propagar-se. Mas se, por
alguma razão, o sistema imunológico não é suficientemente forte, a massa de
células defeituosas continua a crescer. O câncer não é, portanto, um ataque
vindo do exterior, mas um colapso interno.
Os
mecanismos biológicos do crescimento canceroso deixam claro que a busca de suas
causas tem que caminhar em duas direções. Por um lado, precisamos saber a causa
da formação de células cancerosas; por outro, precisamos entender a causa do enfraquecimento
do sistema imunológico do corpo.
Muitos
pesquisadores chegaram à conclusão, ao longo dos anos, de que as respostas a
ambas essas questões consistem numa complexa rede de fatores genéticos,
bioquímicos, ambientais e psicológicos interdependentes. Com o câncer, mais do
que com qualquer outra doença, a tradicional prática biomédica de associar urna
doença física a uma causa física específica não é apropriada. Mas como a
maioria dos pesquisadores ainda trabalha dentro da estrutura biomédica, eles
acham o fenômeno do câncer extremamente desconcertante.
Simonton
assinalou: "O tratamento do câncer encontra-se hoje num estado de total confusão.
Quase se parece com a própria doença: fragmentado e confuso". E reconhece
plenamente o papel das substâncias e influências ambientais cancerígenas na
formação de células cancerosas e defendem vigorosamente a implementação de uma
política social apropriada para eliminar esses riscos para a saúde.
Entretanto, concluíram também que nem as substâncias cancerígenas, nem a radiação
ou a predisposição genética fornecem, por si e em si mesmas, uma explicação adequada
para a causa do câncer. Nenhuma explicação para o câncer será completa sem uma
resposta para esta questão crucial: o que impede que o sistema imunológico de uma
pessoa, num determinado momento, reconheça e destrua células anormais, permitindo,
assim, que elas cresçam e se convertam num tumor que ameaça a vida? Esta foi a
questão em que se concentraram, em suas pesquisas e na prática terapêutica; e concluí
que ela só pode ser respondida desde que sejam considerados, cuidadosamente, os
aspectos mentais e emocionais da saúde e da doença.
O
quadro emergente do câncer é compatível com o modelo geral de doença sobre o
qual estivemos discorrendo. Um estado de desequilíbrio é gerado pelo estresse prolongado,
que é canalizado através de uma determinada configuração da personalidade, dando
origem a distúrbios específicos. No caso do câncer, as tensões cruciais parecem
ser aquelas que ameaçam algum papel ou alguma relação central da identidade da pessoa,
ou as que criam uma situação para a qual, aparentemente, não há escapatória.
Numerosos
estudos sugerem que essas tensões críticas ocorrem tipicamente de seis a dezoito
meses antes do diagnóstico do câncer. Elas são passíveis de gerar sentimentos
de desespero, impotência e desesperança. Em virtude desses sentimentos, uma
doença grave e até a morte podem tornar-se consciente ou inconscientemente aceitáveis
como solução potencial.
Simonton e outros pesquisadores desenvolveram um modelo psicossomático de câncer que mostra como os estados psicológicos e físicos colaboram na instalação da doença. Embora muitos detalhes desse processo ainda precisem ser esclarecidos, tornou-se evidente que o estresse emocional tem dois efeitos principais: inibe o sistema imunológico do corpo e, ao mesmo tempo, acarreta desequilíbrios hormonais que resultam num aumento de produção de células anormais. Assim, estão criadas as condições ótimas para o crescimento do câncer. A produção de células malignas é incentivada precisamente na época em que o corpo é menos capaz de destruí-las.
Simonton e outros pesquisadores desenvolveram um modelo psicossomático de câncer que mostra como os estados psicológicos e físicos colaboram na instalação da doença. Embora muitos detalhes desse processo ainda precisem ser esclarecidos, tornou-se evidente que o estresse emocional tem dois efeitos principais: inibe o sistema imunológico do corpo e, ao mesmo tempo, acarreta desequilíbrios hormonais que resultam num aumento de produção de células anormais. Assim, estão criadas as condições ótimas para o crescimento do câncer. A produção de células malignas é incentivada precisamente na época em que o corpo é menos capaz de destruí-las.
No
que se refere à configuração da personalidade, os estados emocionais do indivíduo
parecem ser o elemento crucial no desenvolvimento do câncer. A ligação entre câncer
e emoções vem sendo observada há centenas de anos, existindo hoje provas substanciais
do significado de estados emocionais específicos. Estes são o resultado de uma
biografia particular que parece ser característica dos pacientes com câncer.
Perfis psicológicos de tais pacientes foram estabelecidos por numerosos
pesquisadores, alguns dos quais são até capazes de prever a incidência do
câncer com notável precisão, com base nesses perfis.
Estudados
mais de quinhentos pacientes com câncer e identificou os seguintes componentes
significativos em suas biografias: sentimentos de isolamento, abandono e
desespero durante a juventude, quando relações interpessoais intensas parecem
ser difíceis ou perigosas; uma relação forte com uma pessoa ou grande satisfação
com um papel no início da idade adulta, tornando-se o centro da vida do indivíduo;
perda da relação ou do papel, resultando em desespero; interiorização do desespero,
a ponto de os indivíduos serem incapazes de deixar outras pessoas saberem quando
eles se sentem magoados, coléricos ou hostis. Esse padrão básico foi confirmado
como típico de pacientes com câncer por numerosos pesquisadores.
A
abordagem Simonton afirma que o desenvolvimento do câncer envolve um certo
número de processos psicológicos e biológicos interdependentes, que esses
processos podem ser reconhecidos e compreendidos, e que a seqüência de eventos
que leva à doença pode ser invertida de modo a que o organismo se torne
saudável
novamente. Tal como em qualquer terapia holística, o primeiro passo no sentido de
se iniciar o ciclo de cura consiste em conscientizar os pacientes do contexto
mais amplo de sua enfermidade. O estabelecimento do contexto do câncer começa
por se solicitar aos pacientes que identifiquem as principais tensões que ocorreram em sua vida de seis a dezoito meses
antes do diagnóstico. A lista dessas tensões é, então, usada como base para
se analisar a participação dos pacientes no desencadeamento de sua enfermidade.
O objetivo do conceito de participação do paciente não é suscitar um sentimento
de culpa, mas criar a base para a inversão do ciclo de processos psicossomáticos
que culminaram na doença.
Enquanto
Simonton estabelece o contexto da enfermidade de um paciente, eles também
fortalecem sua crença na eficácia do tratamento e na potência das defesas do
corpo. O desenvolvimento dessa atitude positiva é crucial para todo o tratamento.
Estudos realizados mostraram que a resposta do paciente ao tratamento depende
mais de sua atitude do que da gravidade da doença. Uma vez gerados os sentimentos
de esperança e expectativa, o organismo traduz esses sentimentos em processos
biológicos, que começam a restaurar o equilíbrio e a revitalizar o sistema imunológico,
utilizando os mesmos caminhos que foram usados no desenvolvimento da doença. A
produção de células cancerosas decresce, enquanto o sistema imunológico se torna
mais forte e mais eficiente para lidar com elas. Enquanto ocorre esse fortalecimento,
a terapia física é usada em conjunto com a abordagem psicológica, a fim de
ajudar o organismo a destruir as células malignas.
O
Simonton vê o câncer não como um problema meramente físico, mas como um
problema da pessoa como um todo. Assim, a terapia por eles adotada não se concentra
exclusivamente na doença, mas ocupa-se do ser humano total. É uma abordagem
multidimensional que envolve várias estratégias de tratamento planejadas para
iniciar e dar apoio ao processo psicossomático de cura. No nível biológico, a finalidade
é dupla: destruir as células cancerosas e revitalizar o sistema imunológico.
Além
disso, usa-se o exercício físico regular para reduzir a tensão, aliviar a
depressão e ajudar os pacientes a manter um contato mais estreito com seu
próprio corpo. A experiência mostrou que os pacientes com câncer são capazes de
uma atividade física muito maior do que a maioria das pessoas supõe.
A
principal técnica de fortalecimento do sistema imunológico é um método de relaxamento
e de formação de imagens mentais que os Simontons desenvolveram quando
perceberam o importante papel das imagens visuais e da linguagem simbólica no biofeedback.
A técnica de Simonton consiste na prática regular de relaxamento e visualização,
durante a qual o câncer e a ação do sistema imunológico são descritos na própria
linguagem simbólica do paciente. Comprovou-se que essa técnica é um instrumento
extremamente eficiente para fortalecer o sistema imunológico, freqüentemente
resultando em reduções espetaculares ou na eliminação de tumores malignos. Além
disso, o método de visualização é também uma excelente maneira de os pacientes
se comunicarem com seu inconsciente. Simonton vem trabalhando estreitamente com
as imagens mentais de seus pacientes e aprenderam que elas dizem muito mais
acerca dos sentimentos dos pacientes do que quaisquer explicações racionais.
Embora
a técnica de visualização desempenhe um papel central na terapia Simonton, é
importante enfatizar que a visualização e a terapia física não são suficientes,
por si sós, para curar pacientes com câncer. Segundo Simonton, a doença física
é uma manifestação dos processos psicossomáticos subjacentes, que podem ser
gerados por vários problemas psicológicos e sociais. Enquanto esses problemas
não forem resolvidos o paciente não ficará bom, ainda que o câncer possa
temporariamente desaparecer. A fim de ajudarem os pacientes a resolver os
problemas que estão na raiz de sua enfermidade, Simonton faz do aconselhamento
psicológico e da psicoterapia elementos essenciais de sua abordagem. A terapia
tem usualmente lugar em sessões de grupo, nas quais os pacientes encontram
apoio e encorajamento mútuos.
Concentra-se
nos problemas emocionais, mas não os separa dos padrões mais amplos da vida dos
pacientes; assim, inclui geralmente aspectos sociais, culturais, filosóficos e espirituais.
Para
a maioria dos pacientes com câncer, o impasse criado pela acumulação de eventos
estressantes só pode ser superado se eles mudarem parte de seu sistema de crenças.
A terapia de Simonton mostra-lhes que sua situação parece irremediável apenas porque
eles a interpretam de uma forma que limita suas respostas. Os pacientes são encorajados
a explorar interpretações e respostas alternativas a fim de encontrarem um modo
saudável de resolver a situação estressante. Assim, a terapia envolve um exame contínuo
do sistema de crenças e da visão de mundo dos pacientes.”
Fonte
O Ponto de Mutação – Fritjof Capra