Estatisticamente, pouco mais de 9% dos
americanos adultos são diagnosticados com algum tipo de transtorno de
personalidade — uma variedade do transtorno mental. Se o advogado enfrenta, vez
ou outra, dificuldades “inexplicáveis” em seus relacionamentos com clientes, a
explicação pode ser essa: um transtorno — do cliente ou dele mesmo (esperançosamente,
não).
Para a advogada, psicoterapeuta e escritora
Elizabeth Wittenberg, todos os profissionais precisam aprender a identificar e
lidar com clientes com transtorno de personalidade. No caso dos advogados, porém,
a situação é mais crítica: eles atraem mais pessoas com transtorno de
personalidade, porque elas, naturalmente, precisam mais de seus serviços.
Autora do artigo “Seus clientes o estão
enlouquecendo? Como evitar o drama com clientes enlouquecidos”, ela afirma que
os advogados que entendem melhor o transtorno da personalidade conseguem
administrar situações “enlouquecedoras” e proporcionar aos clientes uma
representação mais eficaz.
O transtorno de personalidade, segundo a
advogada-psicoterapeuta, “é um padrão persistente de comportamento e de experiência
subjetiva que afeta os pensamentos, os sentimentos, os relacionamentos e a
impetuosidade de uma pessoa”. O “paciente” de "TP" não percebe isso. “Normalmente,
ele percebe seus padrões de comportamento como perfeitamente razoáveis e
apropriados, a despeito dos impactos negativos, dramáticos, que causam em sua
vida e nas vidas alheias.”
Uma pessoa com distúrbio de personalidade
segue um “roteiro limitado de vida” e, normalmente, produz imagens “fixas,
inflexíveis, inalteráveis” das pessoas, diz a advogada. Por exemplo, uma pessoa
que já foi classificada por ela como “desqualificada” não conseguirá convencê-la
de que dois mais dois é quatro.
O fato é que esse transtorno compromete seus
relacionamentos com outras pessoas e, consequentemente, suas relações de
trabalho e, no caso, com seus próprios representantes jurídicos. Há muitas
explicações na internet para o transtorno da personalidade e suas derivações.
Lidar com clientes com TP significa
problemas. Isso leva alguns advogados a se sentirem tentados a não representá-los.
Porém, além das questões de discriminação, o transtorno de personalidade pode não
ser perceptível no início da relação. Além disso, considerando que entre 9% e 10%
da população adulta sofre transtornos de personalidade e que um grupo maior
tende a demandar serviços jurídicos, a probabilidade de cada advogado ter de
lidar com esses “pacientes” é muito alta, pelo menos vez ou outra.
A recomendação é que o profissional entenda
o transtorno da personalidade e suas variações, aprenda a lidar com esse tipo
de problema mental, para oferecer uma representação eficiente a seus clientes e
torná-los felizes com seu trabalho e fiéis a você.
Conheça três tipos
de transtornos:
Transtorno da
Personalidade Narcisista
O “TPN” é uma perturbação que leva a pessoa
a ter uma percepção excessiva de sua própria importância (termo encontrado na
literatura médica), que é uma extrema preocupação consigo mesma e uma falta de
empatia pelos outros. A autora diz que clientes com TPN são frequentemente
cooperativos e envolventes, em um primeiro momento. Mas, mais tarde, começam a
culpar alguém, a “dar coices”, quando surge um problema inesperado.
Ela diz que é muito difícil para uma pessoa
com TPN assumir a responsabilidade por qualquer coisa. Ou mesmo admitir que
tenha uma responsabilidade parcial no problema. E não aceita alegações de que
tenha qualquer participação nele. “Clientes com TPN podem chutar o balde, sair
do escritório batendo a porta, se você lhe disser que a culpa por qualquer
resultado ruim, em parte, é dele”.
Recomendações da
especialista:
Frequentemente, o “narcisista” esconde uma
autoestima, extremamente baixa, sob a capa da autoimportância, que é reforçada
pela aclamação das pessoas que admira. O advogado deve ajudar seu cliente
narcisista a elevar sua autoestima, tratando-o com um certo excesso de cortesia
e respeito.
Eles gostam de pensar que seu advogado é o
melhor e que tem um alto status. Não o decepcione com modéstia. Permita a rasgação
de seda, mas não sugira, de qualquer forma, que é melhor do que ele, em
qualquer coisa que não jurídica. Reprima sua irritação diante de suas ostentações,
bazófias e espertezas. Narcisistas precisam de aprovação. Um pouco de massagem
em seu ego e seus objetivos da representação serão cumpridos naturalmente.
A parte mais complicada para um advogado é levar
o cliente narcisista a fazer um acordo em disputas civis e, principalmente, nas
criminais. Muitas vezes, é melhor para a resolução do caso que ele admita certa
culpa ou certa responsabilidade. Mas isso não está em seus planos de vida. Pode
ser interessante discutir uma “política de resultados”, que justifique certas
concessões.
Jamais caia em qualquer armadilha, que o
leve a se sentir desmoralizado, quando lidar com um cliente narcisista. Ele
precisa criticar a qualidade de seu trabalho, para se sentir bem. Não se
preocupe se seu cliente não reconhece seu bom trabalho. Você conhece, melhor do
que ele, suas qualificações e sua eficiência.
Transtorno da
Personalidade Antissocial
O “TPA” é uma condição de saúde mental, na
qual a pessoa mantém um padrão, a longo prazo, de manipulação, exploração ou
violação dos direitos dos outros. Isso é um comportamento mais comum na área
criminal.
Pessoas com TPA ou com características desse
transtorno frequentemente “visitam” o sistema judicial, diz a advogada. Geralmente,
isso se explica pela inconformidade com as normas sociais ou mesmo com os
ditames da lei. Mas não significa, em todos os casos, um comportamento
criminoso.
“Figuras antissociais podem ser vistas na
presidência de alguma grande corporação, no comando de uma grande organização,
em um clube da alta sociedade ou na traseira de um camburão da polícia”,
escreve a advogada. Elas sentem prazer em manipular, conscientemente, outras
pessoas.
“Além de serem manipuladoras e enganadoras,
são consistentemente irresponsáveis, não sentem remorsos por suas ações
malignas e, frequentemente, são muito impulsivas. Às vezes, são indiferentes ao
mal que causam a outras pessoas, às vezes racionalizam a maldade”, ela descreve.
As pessoas com TPA sentem necessidade de
controlar os outros, para se sentir poderosas. Como os narcisistas, podem
contar vantagem e negar responsabilidade pelos problemas dos outros, mas o
fazem de uma maneira diferente. O cliente com TPA provavelmente contará vantagens
sobre suas atividades ilegais, mas irá caracterizá-las como alguma coisa que
todo o mundo faz. E mentem muito, assegura a advogada.
Recomendações da
especialista:
Pode ser perigoso trabalhar com clientes com
TPA. Por isso, o advogado deve se preocupar com sua segurança e com sua imagem
de pessoa forte. Deve fazer reuniões com a participação de outras pessoas e
usar uma abordagem direta, para mostrar força, não fraqueza. Deve ser rígido,
no que se refere a expectativas, à apresentação de faturas e outros aspectos da
representação. Qualquer acordo de pagamentos de honorários, que inclua certas
facilidades e nenhuma garantia, será desrespeitado.
Para formar um relacionamento produtivo com
um cliente antissocial, o advogado tem de entender a necessidade do “paciente” de
manter o controle da situação. Coloque-se a sua disposição, mostrando que ele
pode conseguir o que quer, se vocês trabalharem como um time. Ao discutir questões
jurídicas, prefira se focar nas consequências, não nos aspectos puramente jurídicos
ou morais.
Clientes antissociais vão lhe dizer o que
pensam que você deve saber e, normalmente, omitem detalhes em seus argumentos. Esclareça
os detalhes, sem desafiá-lo, para não despertar sua fúria.
Provavelmente, você se sentirá desconfortável
com essa situação. Por isso, tenha paciência. Mas não se deixe intimidar ou ser
enganado. É melhor assumir uma atitude cética, em relação a tudo o que ouvir (uma
boa qualidade para todos os advogados, de qualquer forma). Assegure-se de
negociar garantias de pagamento dos honorários.
Transtorno de
Personalidade Limítrofe
A definição do "TPL" está na
literatura médica e, às vezes, também é chamada de Transtorno de Personalidade
Borderline (TPB). É um problema de saúde mental de pessoas que exibem padrões
persistentes de emoções instáveis ou turbulentas. Essas experiências interiores
frequentemente resultam em ações impulsivas e relacionamentos caóticos com os
outros.
São casos de instabilidade emocional. A
pessoa pode ser suicida ou se engajar em comportamentos autodestrutivos. “Clientes
com TPL podem ser pessoas muito divertidas, fáceis de lidar, até que, de
repente, não são mais”, diz a advogada. “O problema é que você pode não ter a mínima
ideia de que o cliente sofre de TPL, até que ele “exploda” no escritório ou,
pior, no tribunal. Então, o cliente “perfeito” se torna um problema.
Em matérias jurídicas, o TPL pode trazer
descontrole emocional à representação. Clientes com TPL podem perder as
estribeiras a qualquer momento e terminar o relacionamento. Entre as prováveis
consequências estão ameaças de reclamações à Comissão de Ética da ordem e
processos por má prática profissional, quando terminam o relacionamento com
raiva.
Recomendações da
especialista:
Mantenha a clareza, a consistência e a
estrutura, para evitar o pior. Telefonemas regulares e troca de e-mails ajudam
a acalmar clientes com TPL, que valorizam a atenção. Retorne qualquer comunicação
prontamente, nem que seja apenas para confirmar recebimento e que irá examiná-la
(ou qualquer outra coisa).
Representar um cliente com TPL é como andar
em uma montanha russa. Resista às subidas e descidas, mantendo a calma em todas
as horas. Clientes com TPL têm a mania incrível de desafiar o advogado a rejeitá-los.
Entenda a situação, persevere, e cumpra o trabalho para o qual foi contratado
da forma mais eficiente possível.
Por João Ozorio de Melo
Fonte Consultor Jurídico