Conforme artigo 12 da Lei 1060-50, ao final
do processo juiz deve fixar custas e honorários, mesmo se justiça gratuita:
Artigo
12. A parte beneficiada pela isenção do pagamento das custas ficará obrigada a
pagá-las, desde que possa fazê-lo, sem prejuízo do sustento próprio ou da família,
se dentro de cinco anos, a contar da sentença final, o assistido não puder
satisfazer tal pagamento, a obrigação ficará prescrita.
Dessa forma, é equivocada a decisão judicial
que deixa de fixar honorários e custas em razão de justiça gratuita. As custas
são tributos e não tem o Juiz autorização legal, nem constitucional para
isentar as mesmas. O que ocorre é que o juiz dispensa, o adiantamento de custas
quando do início do processo para permitir o acesso ao Judiciário, isto é uma
decisão provisória. Portanto, ao final o perdedor da demanda deve ser condenado
em custas, despesas, taxas e honorários.
A rigor, o juiz deve, ao final do processo,
intimar o perdedor da demanda para pagar as custas em prazo judicial, sob pena
de expedir certidão de custas não pagas e remeter à Fazenda Pública. Não
efetuando o pagamento, o juiz deve determinar a remessa da certidão de custas não
pagas para a Fazenda Pública, preferencialmente pelo meio eletrônico, a qual
tem o prazo de cinco anos para provar que o perdedor da demanda tem condições
de pagar o valor.
A lei não fixa o prazo para que o juiz
remeta a certidão de custas não pagas à Fazenda Pública, e seria importante que
o CNJ fixasse este prazo. Contudo, é possível imaginar que um prazo razoável
seria até 30 dias, e se o juiz não o faz, então cometeria ato ilícito ao gerar
prejuízo ao erário.
Após remeter a certidão de custas não pagas
para a Fazenda Pública, o processo seria baixado. E caberia à Fazenda Pública
comprovar a capacidade financeira do devedor. Caso a Fazenda Pública nada
fizesse, então incorreria em ato ilícito. Note-se que a Fazenda Pública não é obrigada
a cobrar os valores, mas tem que fundamentar.
Logo, o prazo de cinco anos é tido como um
período de carência em que o beneficiado fica obrigado ao pagamento das
despesas caso sua situação econômica venha a ser alterada.
O Supremo Tribunal Federal já se manifestou
no sentido da compatibilidade do artigo 12 da lei 1.060/50 com o disposto no
artigo 5º, inciso LXXIV da Constituição Federal, entendendo pela sua recepção:
Custas:
condenação do beneficiário da justiça gratuita. O beneficiário da justiça
gratuita, que sucumbe é condenado ao pagamento das custas, que, entretanto, só lhe
serão exigidas, se até cinco anos contados da decisão final, puder satisfazê-las
sem prejuízo do sustento próprio ou da família: incidência do artigo 12 da Lei 1.060/50,
que não é incompatível com o artigo 5º, LXXIV, da Constituição." (RE 184.841,
Rel. Min. Sepúlveda Pertence, julgamento em 21-3-95, DJ de 8-9-95). No mesmo: RE
495.498 – AgR, Relator Ministro Eros Grau, julgamento em 26-6-07, DJ de 17-8-07.
Neste sentido, temos também o seguinte
julgado Superior Tribunal de Justiça, relator Ministro Luiz Fux, quando ainda
naquela corte:
A
parte beneficiada pela Justiça gratuita, quando sucumbente, pode ser condenada
ao pagamento dos honorários advocatícios, mas lhe é assegurada a suspensão do
pagamento pelo prazo de cinco anos, se persistir a situação de pobreza, quando,
então, a obrigação estará prescrita, se não houver, nesse período, a reversão (Lei
1.060/1950). Precedentes citados: REsp 743.149-MS, DJ 24/10/2005; REsp 874.681-BA,
DJ 12/6/2008; REsp 728.133-BA, DJ 30/10/2006; AgRg no Ag 725.605-RJ, DJ 27/3/2006,
e REsp 594.131-SP, DJ 9/8/2004. REsp 1.082.376-RN, Rel. Min. Luiz Fux, julgado
em 17/2/2009.
Portanto, se o juiz não fixar a condenação,
ou o Estado não fizer a cobrança e/ou execução do crédito quando o beneficiário,
ao final do processo, for comprovada a sua condição de pagar as custas dentro
do prazo quinquenal, estará tacitamente o Juiz ou a Fazenda Pública realizando
um ato de renúncia de receitas fora dos padrões estabelecidos na Lei de
Responsabilidade Fiscal, Lei Complementar 101/2005, já que estará desacompanhada
do impacto orçamentário-financeiro, senão vejamos:
Seção
II - Da Renúncia de Receita
Artigo
14. A concessão ou ampliação de incentivo ou benefício de natureza tributária
da qual decorra renúncia de receita deverá estar acompanhada de estimativa do
impacto orçamentário-financeiro no exercício em que deva iniciar sua vigência e
nos dois seguintes, atender ao disposto na lei de diretrizes orçamentárias e a
pelo menos uma das seguintes condições:
Importante
ressaltar que se a despesa com advogado não foi suportada pelo Estado (advogado
dativo, defensoria), então não cabe ao mesmo cobrar esta parte da condenação,
mas apenas ao advogado da parte vencedora, uma vez que tem previsão legal para
isto. Inclusive, o advogado não depende da cobrança por parte do Estado da parte
perdedora os honorários.
O artigo 12 da lei 1060-50 dá a
racionalidade necessária ao sistema de justiça gratuita, o qual está sendo
utilizado mais para beneficiar alguns setores privilegiados do que realmente os
carentes. É como se o Governo distribuísse
bolsa-família sem critério algum e com o falso argumento de atender aos pobres,
mas o dinheiro ficasse com os intermediários.
Por exemplo, hoje nem há interesse em fazer
acordos, pois raramente há condenação em custas. E seria importante que os
acordos antes da instrução tivessem previsão de uma expressiva redução no valor.
A decisão do juiz no processo não exigindo o
adiantamento das custas, não é uma decisão de isenção definitiva, mas apenas de
suspensão da cobrança naquele momento, pois nem há um contraditório efetivo
sobre esta questão.
No cotidiano forense há uma preocupação
exacerbada com o adiantamento das custas, mas não há uma preocupação em cobrar
ao final da demanda, o que acaba onerando apenas o autor. No entanto, estudos
na Itália constatam que os autores vencem em 80% das ações judiciais, logo
normalmente quem deve pagar é o réu, e isto seria feito ao final.
Tanto nos Estados Unidos, como nos países da
Europa, a assistência jurídica gratuita somente é concedida a quem comprova
inserir nos critérios definidos. No Brasil, alguns tentam diferenciar “assistência
judiciária gratuita” de “assistência jurídica gratuita”, mas o objetivo do
Legislador não foi este. Caso contrário, chegaríamos ao absurdo de sustentar
que a assistência judiciária não está assegurada na Constituição, mas apenas a
assistência jurídica.
No Brasil já se teve caso de gratuidade para
fazendeiro, médico, empresário, juiz, desembargador, e este não é o maior
problema, pois se venceram a demanda nada devem e cabe ao perdedor pagar as
despesas processuais. Logo, se perderam vão pagar as custas, mas se venceram a
demanda, então a parte contrária seria condenada a pagar custas, e o Estado
teria o prazo de até cinco anos para comprovar que o perdedor pode pagar. Esta
medida até moraliza mais o instituto da justiça gratuita e sem onerar o autor,
o qual pode ser vencedor, mas teve que arcar com as despesas processuais, se não
teve justiça gratuita no ajuizamento da ação judicial.
O programa de justiça gratuita atualmente no
Brasil é como se o Governo criasse um programa de distribuição de remédios para
carentes, controlado pelas indústrias farmacêuticas, sem necessidade de prestar
contas, sem necessidade de comprovar a carência dos beneficiados, nem a eficiência.
Em suma, tende mais atender aos prestadores do serviço do que os usuários, os
quais ficam invisíveis e vira mera retórica.
Na prática a questão é tão negligenciada que
se a parte autora pede a gratuidade, uma vez que raramente o réu pede, porém ao
final mesmo se o réu for perdedor, o juiz concede a justiça gratuita para o
processo e não para a parte. De fato, não há muita atenção sobre esta situação,
e segue-se o caminho mais fácil que é não
calcular as custas.
Quem calcula o valor das custas não é o
juiz, mas sim a Contadoria, porém o Juiz tem que determinar na sentença, e se não
o fizer, pode caber embargos declaratórios. O problema é que o Estado não é intimado,
em regra, para atuar nos processos de
justiça gratuita.
Estima-se que se gaste mais com assistência
jurídica gratuita do que com o programa de Bolsa Família, incluindo as isenções
de custas e despesas com estruturas de assistência jurídica. Porém, a verba do
Programa Bolsa Família vai direto para os carentes, enquanto a verba da Assistência
Jurídica fica com o Prestador do Serviço, e não se computa as omissões na
cobrança das custas.
Inclusive seria até recomendável que todo
pedido de justiça gratuita a Fazenda Pública já fosse intimada no curso do
processo para eventual impugnação, uma vez que é interessada direta em razão do
impacto financeiro.
Como a questão também envolve legalidade e
questão de recurso público também há interesse do Ministério Público para
justificar eventual omissão.
Sem dúvida, quando se fala em justiça
gratuita há muita resistência, inclusive porque muitos setores têm usado este
argumento em prol de seus interesses corporativos. Mas, é preciso uma ampla
discussão sobre a justiça gratuita, uma vez que até mesmo empresas
multinacionais estão sendo beneficiadas pela mesma equivocadamente, como no
caso dos Juizados Especiais em que bancos e concessionárias de telefonia estão
sendo isentados do valor na primeira instância, apesar de a lei 9000-95 ser
clara no sentido de dispensa do adiantamento na primeira instância e que deve
ser cobrado ao final as taxas e despesas, excluindo apenas as custas (Artigo 54
e 55 da lei 9099/95). Tecnicamente custas, taxas e despesas processuais são
conceitos diferentes.
Portanto, reprisa-se, com a aplicação do
artigo 12 da Lei 1060-50 é possível uma racionalidade no sistema de justiça
gratuita, ou seja, no primeiro momento (início
da ação) a gratuidade seria concedida pelo Juiz para permitir o acesso ao
Judiciário, com base em critérios mais superficiais, sem aprofundamento, até mesmo
para facilitar o acesso e porque não se sabe o custo final da demanda, como
recursos e outros incidentes. Logo, a pessoa beneficiada não adiantaria as
despesas. Mas, ao final o perdedor seria condenado em custas, despesas e taxas,
bem como honorários na sentença, e se não pagar, a certidão de custas seria
remetida à Fazenda Pública para cobrança em até cinco anos, se provar a
capacidade financeira do devedor/ perdedor.
Por André Luís Alves de Melo
Fonte Consultor Jurídico