Quando se trata de investimentos, seja no caso de consumo, lidar bem com o dinheiro é mais uma questão de comportamento do que de matemática. Repito: lidar bem com o dinheiro é mais uma questão de comportamento do que de matemática. Traduzindo em outras palavras: a raiz de muitos desequilíbrios financeiros está muitas vezes – ou na maioria das vezes – na dificuldade de gerenciar bem as próprias emoções. Lembram-se daquele ditado: “não decida nada de cabeça quente”? Isso vale para qualquer decisão que você vá tomar na vida, mas é especialmente relevante nas decisões financeiras, sobretudo naquelas com impactos de médio e longo prazo.
Suponha que você ache que a sua vida está “uma droga”. Você chega todo dia do trabalho, à noite, cansado, depois de pegar mais de uma hora de trânsito. Ao ligar a televisão, se depara com uma “maravilhosa” propaganda de carro, que faz você sentir vergonha do atual veículo que possui. Pronto! Está preparada a armadilha do consumo. Do consumo inconsciente. Do consumo irresponsável. Aí, para completar a trama, você se dirige, na concessionária mais próxima, onde é atendido por um vendedor, que, como profissional que é, lhe convida a fazer um test drive, onde você, só de entrar no veículo e sentir aquele “cheirinho bom” de carro novo, já pensa em perguntar para o vendedor quais são as formas de pagamento, mas prefere se conter um pouco, e faz antes o dito cujo do test drive. No final do passeio, ao voltar para a loja, o vendedor – tchã-rã! – “adivinha” seu pensamento (lembre-se: ele é um vendedor profissional, e você, um comprador amador) e mostra as 1.001 opções de financiamento do veículo, reforçando, ao mesmo tempo, as mil maravilhas do carro, e ocultando, na mesma proporção, todos os mil defeitos desse mesmo carro.
Não deixe que emoções negativas destruam sua vida financeira. Saiba distinguir aquilo que é superficial e que traz um eventual benefício artificial de curto prazo, daquilo que é duradouro e pode lhe trazer recompensas de longo prazo. Geralmente, entre duas escolhas possíveis, preferimos aquela que nos traz alívio momentâneo, apesar de ser a pior a longo prazo. Para saciar uma fome implacável, preferimos um chocolate a um sanduíche natural. Para matar “aquela” sede, optamos por um refrigerante bem gelado do que um copo d’água. Para curar um estresse qualquer, preferimos um sapato, uma roupa ou um belo de um celular, do que uma melhor análise da situação.
Não que um chocolate, um refrigerante ou um sapato não possam ser bons. Eles podem até serem úteis, mas desde que comprados na medida certa, na hora certa e, sobretudo, pelos motivos certos. O que não podemos fazer é deixar que nossas emoções negativas nos traiam e nos levem a tomar decisões financeiras inadequadas, ao nosso orçamento doméstico e aos nossos planos de investimentos, pois essas decisões financeiras ruins, além de piorarem, por evidente, nossa própria vida financeira, ainda podem repercutir negativamente em todos os demais aspectos de nossa existência, como saúde, trabalho, família etc.
Controle sua mente, e não deixe que sua mente controle você. De certa forma, Nuno Cobra tem razão ao dizer que, no excelente livro A semente da vitória, nosso cérebro é “burro”, no sentido de que aceita qualquer coisa que a gente diz para ele. O problema, nos dias de hoje, é que, como quase todas as coisas que fazemos tangenciam, em algum ponto, o dinheiro, muitas de nossas escolhas na vida – o que fazemos depois de uma briga, o que fazer diante de uma ação cuja cotação na Bolsa só cai dia após dia etc. – se forem feitas sob o impulso de emoções negativas, tendem a ter impactos financeiros igualmente ruins. Quem disse que somos seres racionais? Somo sim, mas também somos, como qualquer outra pessoa feita de carne e osso, feitos de emoção. Não podemos tirar as emoções de nossas vidas; aliás, nem devemos, pois são elas que dão “sabor” a essas mesmas vidas. E também não podemos eliminar por completo as emoções negativas de nossas vidas, pois aborrecimentos, frustrações, tristezas, são aspectos inerentes a qualquer ser humano. Mas podemos, sim, lidar melhor com elas, e, ao lidar melhor com elas, estaremos também construindo uma vida financeiramente mais saudável e harmoniosa.
Dicas para diminuir o impacto ruim de emoções negativas em sua vida financeira
Se não podemos remover completamente as emoções negativas de nossas vidas, afinal, somos seres humanos, e não robôs, ao menos podemos gerenciá-las melhor sob a ótica financeira. Nesse sentido, aqui vão algumas dicas simples, úteis, mas sobretudo práticas, para você melhorar sua relação com o dinheiro, não deixando que emoções negativas façam tantos estragos na sua relação com o dinheiro:
1. Não decida de “cabeça quente”
Não é conveniente curar o estresse do dia-a-dia agindo como a nossa amiga do exemplo 2, ou seja, fazendo “sapatoterapia”, ou ainda “carroterapia”, “iphoneterapia”, ou qualquer outra forma de “shoppingterapia”. E isso por uma razão bastante lógica: problemas de aspecto psicológico não se resolvem com soluções nos níveis físico e material. Problemas psicológicos se resolvem e se compensam com soluções de mesma natureza, ou seja, com soluções igualmente psicológicas, que podem até envolver aspectos espirituais.
Não é conveniente curar o estresse do dia-a-dia agindo como a nossa amiga do exemplo 2, ou seja, fazendo “sapatoterapia”, ou ainda “carroterapia”, “iphoneterapia”, ou qualquer outra forma de “shoppingterapia”. E isso por uma razão bastante lógica: problemas de aspecto psicológico não se resolvem com soluções nos níveis físico e material. Problemas psicológicos se resolvem e se compensam com soluções de mesma natureza, ou seja, com soluções igualmente psicológicas, que podem até envolver aspectos espirituais.
2. Reduza
a exposição às propagandas.
Desligue a TV. “Passe batido” pelas propagandas de revistas (ou nem as leia). Não se fixe nos anúncios publicitários que se estampam com vigor nas páginas de jornais. Pois, “se a propaganda puder envergonhar alguém, terá um consumidor em potencial”. Sábias essas palavras de Vicki Robin, co-autora do esplêndido livro Dinheiro e Vida. Afinal, se você é influenciado por aquilo a que se expõe, quanto menos televisão você assistir, menos persuadido você será a comprar aquilo que estiver sendo anunciado.
3. Seja
frio com o dinheiro, e amável com as pessoas
“Ser frio com o dinheiro” foi uma frase que ouvir há alguns anos, ao assistir a uma palestra do Mauro Calil, educador financeiro de primeira linha. Embora a frase tivesse sido colocada, à época, no contexto do investimento no mercado de ações, ela desde então nunca mais saiu da minha cabeça, e penso que tal frase se aplica também a todas as demais relações da vida. No exemplo 3 acima descrito, nosso amigo não precisava demonstrar sua compaixão com o gerente de banco fazendo uso do dinheiro próprio (que, aliás, nem iria para o gerente, mas sim para o banco). Mas diuturnamente somos convencidos a levar para casa produtos que se mostram, muitas vezes, fúteis e sem grande utilidade. Por quê? Porque do outro lado da relação estava um vendedor profissional, que, como profissional que é (desculpe a redundância), apela aos seus mais nobres e primitivos sentimentos para lhe fisgar no bolso. Agradeça as ofertas, e responda com um amável “Não, obrigado“.
Visto sob outro ângulo, há pessoas que invertem a frase e acabam sendo controladas pelo dinheiro: são amáveis com o dinheiro, e frios com as pessoas. Destroem, com esse vil comportamento, relacionamentos, a própria saúde, e outros valores imateriais mais importantes. Tome cuidado para não ser uma dessas pessoas escravizadas pelo dinheiro!
4. Tenha
capacidade de fazer uma análise crítica de suas próprias ações
Algumas pessoas não fazem essa análise por ignorância, ou seja, falta educação financeira em suas vidas. Outras não a fazem por inércia, deixando, por exemplo, de colocar “no papel” um registro detalhado de suas compras exageradas na última viagem de férias. Mas existe um terceiro grupo de “faltosos”, que não fazem essa análise por medo de encararem a própria realidade que vivenciam. Mas tudo isso é superável. É preciso encarar de frente os problemas, e “cortar na própria carne”, se preciso for. Exercite seu lado racional (que existe, se você leu esse artigo até aqui), para fazer um exame do que está ocorrendo de errado no seu lado emocional. Pense “fora da caixa” e busque soluções que também estejam situadas no mesmo plano psicológico. Não é se entulhando de coisas ou de péssimos investimentos que você vai viver uma vida melhor e mais feliz.
5. Leia
Quanto mais você investir em educação financeira, menos propenso você estará a tomar decisões erradas. E, vamos ser sinceros, num país cujo hábito de leitura – não a financeira, a leitura geral mesmo – vem, lamentavelmente, caindo ano após ano, você deve se considerar privilegiado por ler livros sobre investimentos, blogs de finanças pessoais como esse (aham) e seções econômicas de jornais impressos. O nosso amigo do exemplo 1 estaria mais bem servido se, ao invés de ter vendido as ações no ano passado, tivesse comprado mais. Comprar na baixa, vender na alta. Mas quem faz isso se não tiver as emoções sob controle e souber que essa é a melhor estratégia? É uma coisa que eu sempre digo: conhecimento modifica comportamento. E, por tabela, faz você ter uma vida melhor.
Conclusão
Não aja impulsivamente sob o domínio de emoções negativas. Como eu disse em outro artigo, para ter equilíbrio financeiro, gostar de matemática é o de menos. O que você precisa é gostar de si próprio, e para gostar de si próprio, é preciso valorar adequadamente todas as escolhas que fizer, a fim de que emoções ruins não repercutam negativamente em suas finanças pessoais. Com um conjunto equilibrado de princípios a dirigir suas ações, as chances de isso ocorrer tendem a diminuir consideravelmente. E isso não é bom somente para seu bolso. É bom também para sua própria qualidade de vida.
Fonte Valores Reais