Ao longo de toda sua carreira os advogados
enfrentam uma série de desafios paralelos e complementares ao exercício da
advocacia em razão do momento profissional o qual atravessam, desde seu
primeiro estágio até a eventual gestão de seu próprio escritório. Um mosaico
diversificado de desafios para os quais não recebem o devido preparo ou base
teórica durante a Universidade e que ao longo de sua carreira acabam por se
apresentarem como fatores importantes e decisivos para seu sucesso profissional.
Independe do ciclo da carreira o qual os advogados atravessam os desafios não
diminuem, apenas mudam e se diferenciam, e por vezes se tornam mais complexos, principalmente
quando relacionados às pessoas, sejam elas sócios, colaboradores, clientes, concorrentes
ou a si mesmo. Advocacia é uma atividade jurídica essencialmente baseada em
pessoas, seja na sua origem fundamental ou mesmo em sua prática cotidiana.
Tratar deste assunto é desafiador, pois
qualquer tentativa de padronização com objetivo de classificação para estudo e
entendimento acaba por deixar vertentes e especificidades sem a devida
abordagem, mas para fins didáticos a carreira na advocacia pode ser dividida em
cinco fases ou ciclos: o Aprendiz (de estagiário até obtenção da carteira da
Ordem), o Contratado ou Empreendedor (entre um e cinco anos de carreira), o
Proprietário ou Sócio de Serviço (entre seis e dez anos de carreira), o
Estabelecido (entre onze e vinte e cinco anos de carreira) e por fim o
Equilibrista (com mais de vinte e cinco anos de carreira).
Novamente chamo a atenção que tais
estratificações em ciclos ou fases de carreira por tempo de mercado não
conseguem absorver todos os possíveis casos e que ocorram prováveis exceções e
característica de um determinado ciclo ocorrendo muito antes ou bem depois na
escala temporal que acompanha as respectivas estratificações em ciclos. Porém, a
escala de etapas e respectivos desafios costumam respeitar um padrão sequencial
mínimo conforme os advogados avançam em cada um dos ciclos de suas carreiras.
No ciclo “Aprendiz” a maioria dos futuros
advogados enfrentam o desafio de desenvolver sua capacidade técnica em paralelo
a aprendizagem das relações humanas e desenvolvimento de uma postura
profissional condizente com as expectativas de eficiência e comprometimento do
escritório contratante e do mercado.
O Aprendiz tem o desafio de entender que
cada escritório possui um perfil organizacional particular e que o exercício de
percebê-lo seguido pela tentativa de conviver sob estes padrões se traduz em um
perfeito exercício de adaptação e flexibilidade comportamental, normalmente
chamado de “jogo de cintura”, que no futuro serão obrigados a executar perante
seus sócios, colegas, juízes e clientes. O Respeito aos prazos, a correta
organização de tarefas e do tempo, o cumprimento eficiente de suas
responsabilidades e horários, bem como o desenvolvimento da capacidade de se
moldar ao ambiente e equipe de pessoas que os cercam são desafios que devem ser
superados em paralelo ao desenvolvimento da capacidade técnica. Porém não são
os únicos, pois esta etapa da carreira somente estará completa caso consigam
durante a fase de estágio identificar ou ratificar a área do direito o qual
realmente desejam de dedicar, pois, não há uma grande zona de risco em obter
sua carteira da OAB e ainda não saber a qual área do direito irá dedicar. Tal possibilidade
poderá custar alguns anos de sua carreira, pois enquanto o Aprendiz não define
para aonde quer ir não terá como empreender esforços para chegar lá, e ainda
correm o risco de se excederem na constante troca de escritórios em curtos
espaços de tempo em um percurso desvairado de estágios, saltando de um
escritório para outro, comprometendo alguns outros ensinamentos e etapas de seu
amadurecimento profissional.
É uma fase difícil, do exercício da
aceitação e de compreensão do outro, de suas regras, de suas visões diferentes,
e de aceitar mesmo discordando. Uma fase de forte adaptação, modelagem
comportamental e definições que acabarão por influenciar positiva ou
negativamente o futuro de sua carreira.
No ciclo “Contratado
ou Empreendedor” que geralmente
ocorre durante os cinco primeiros anos de carreira o advogado enfrenta novos
desafios, por isso espera-se que ele realmente tenha apreendido os ensinamentos
da fase anterior e esteja preparado para o enfrentamento de novos desafios.
Nesta etapa da carreira os desafios estão
relacionados com a opção de trabalhar como advogado contratado em algum
escritório de advocacia ou partir para uma sociedade de serviços, ou ainda a
abertura do próprio escritório. Quaisquer opções apresentam desafios.
O Contratado enfrentará a cobrança por um
alto volume de produção, eficiência, disponibilidade e comprometimento, bem
como precisará de habilidade e “jogo de cintura” para manter um bom
relacionamento com seu chefe imediato, assim como com outros colaboradores e
sócios do escritório. Desta forma a gestão de sua imagem profissional ou
marketing pessoal dentro do escritório é um desafio importante a ser superado, junto
com a entrega de produtividade e eficiência jurídica esperada visando
consolidar sua permanência, ou ainda quando da estruturação de uma rede de
relacionamentos e da capacidade de captação de clientes, possa se apresentar
como um potencial sócio para o escritório. O trajeto mais curto para o advogado
contratado se tornar um potencial sócio do escritório onde trabalha é se tornar
imprescindível na produção jurídica ou então apresentar capacidade efetiva para
captação de novos clientes para a carteira deste escritório.
Já o Advogado do tipo Empreendedor pode até
iniciar sua carreira partindo para a abertura de seu próprio escritório, desde
que não precise da tutela de um advogado experiente para execução de um
excelente trabalho, tenha um bom “network” associados à habilidade de
transformar contatos em contratos e os recursos financeiros para sustentar seu
escritório e sua vida pessoal por ao menos dois anos. Por isso alguns advogados
optam pelo trabalho remunerado em algum escritório como uma espécie de
intervalo de tempo até ser possível reunir tais condições para empreender.
Seja qual for a estratégia adotada pelos
advogados em início de carreira, os principais desafios estarão relacionados
reafirmação e desenvolvimento de sua capacidade jurídica, definição da área do
direito e segmento de mercado (pessoa física ou jurídica) que pretende atuar
seguido de uma estratégia coerente para alcançá-lo, habilidade de
relacionamento e negociação em seu ambiente de trabalho, gestão de seu
marketing (imagem) pessoal, disponibilidade e dedicação, bem como a capacidade
e oportunidades para a captação de clientes, pois esta poderá definir sua
estratégia de carreira, uma vez que a captação sempre abre oportunidades para
um escritório próprio ou para uma eventual sociedade no escritório onde
trabalha.
No ciclo
“Proprietários ou Sócios de Serviços”
(entre seis e dez anos de mercado) os advogados enfrentam o desafio de expandir
seu mercado, tornar-se referência em uma determinada área ou subárea do Direito,
ao mesmo tempo em que se dedicam a gestão do escritório e aos clientes, com
especial atenção para a rentabilidade da carteira, a eficiência da equipe
jurídica, a marca do escritório e sua reputação pessoal no mercado, bem como a
contínua responsabilidade pela manutenção da satisfação dos atuais clientes e a
captação de novos.
Neste momento da carreira a gestão de
pessoas, de fluxos e qualidade do trabalho, do tempo, da imagem, de
relacionamentos, das finanças e do mercado alvo do escritório acabam por
aumentar muito as horas de trabalho dedicadas em razão do acúmulo de
responsabilidades, obrigando-o a tomar decisões que acabam culminando entre a
expansão societária ou na profissionalização do escritório, na delegação
coerente de responsabilidades (sob o treinamento anterior da equipe), bem como
uma reflexão sobre o modelo de advocacia que se pratica tendo como base a busca
de maior rentabilidade atendendo menos clientes selecionados pela alta
lucratividade ou então pela expansão da carteira tendo como fonte de sua
rentabilidade o alto volume de clientes, sustentado por uma numerosa equipe de
advogados.
São desafios e decisões importantes que
devem ter como base de decisão o mercado e área do direito o qual atuam, os
diferenciais competitivos que oferecem a este mercado e a capacidade das
equipes jurídica e administrativa de entregar um serviço diferenciado que
realmente agregue valor aos clientes. Neste momento serão tomadas as decisões
que poderão ou não estabelecer definitivamente o escritório e o advogado no
mercado. É neste momento que advogados com talento para a captação costumam se
unir, seja pela contratação ou sociedade, a outros advogados com excelência na
execução, pois o sucesso nas fases anteriores de sua carreira acaba por se
materializar em grandes carteiras e por consequência em muito trabalho e pouco
tempo.
No ciclo “Estabelecido” (entre onze e vinte
cinco anos de carreira) os advogados enfrentam o desafio da expansão controlada
para novos nichos de mercado junto da manutenção da atual participação de
mercado e da equipe jurídica. Devem ter como objetivo “blindar” a participação
de mercado já conquistada, sua reputação (evitando queda da qualidade mediante
alto volume de trabalho) e evitar a obsolescência decorrente da acomodação, além
da eventual rotatividade da equipe jurídica composta por advogados experientes
já sem a menor expectativa de se tornarem sócios ou com planos empreendedores
na cabeça.
Neste momento a aposta na solidificação dos
relacionamentos com atuais clientes e parceiros, o investimento contínuo na
imagem da marca jurídica e na performance de gestão do escritório, bem como um plano
de carreira realmente condizente com a realidade da banca podem iluminar um
pouco esta fase garantindo a qualidade da produção jurídica. Cabe ainda atenção
especial nesta fase da carreira para as oportunidades de expansão da carteira
de clientes apostando em novos seguimentos de mercado subsidiado pela reputação
do escritório, network de relacionamento dos advogados e estudos de mercado.
Nesta fase, costumeiramente ancorada por uma
sólida carteira, um dos principais desafios dos advogados Estabelecidos está na
manutenção da satisfação dos clientes. A produção jurídica e o atendimento ao
cliente deve ocupar papel central na gestão do escritório, pois mesmo a
captação de clientes nesta fase será direta ou indiretamente subsidiada pela
satisfação dos atuais clientes. São eles que potencializarão ou irão minar a
reputação do advogado ou escritório no mercado, ocupando papel importante nos
planos e oportunidades futuras.
Os advogados do
ciclo “Equilibrista” são
aqueles com mais de vinte e cinco anos de carreira e que já superaram inúmeros
desafios e evoluíram junto com o mercado e se encontram talvez no auge de suas
carreiras, mas vivenciam agora um cenário diferente daquele onde provaram seu
valor e enfrentam diariamente a tarefa de manter sua reputação de mercado, a
qualidade da produção jurídica, enfrentamento da alta rotatividade de
estagiários e relacionamento com advogados mais jovens (geração y), além de sua
relação com eventuais sócios. Porém, o principal desafio associado aos
advogados “Estabelecidos” é sua postura pessoal perante uma nova realidade do
mercado jurídico, demandando um exercício de autoavaliação sincera, identificação
de seus pontos positivos e negativos, bem como e identificação de quais são os
reais alicerces que sustentam e fizeram diferença sua carreira.
Após as conquistas e vitórias sobre os
desafios anteriores, apenas a autoavaliação sincera ou uma reinvenção de si
mesmo poderão permitir a manutenção da liderança do mercado e automotivação. É
preciso recuperar aquela antiga personalidade de advogado iniciante querendo
provar algo para si mesmo. É necessário incorporar aquela garra da juventude, equilibrar-se
entre o passado e o futuro, e partir em busca de novos desafios, agora com o
conhecimento dos atalhos e a humildade que só aquele que realmente sabe das
coisas possui.
Na advocacia, assim como em outras
profissões liberais com base em serviço, seu produto é você mesmo, assim como a
total responsabilidade pela sua carreira. Os desafios serão permanentes e
sempre haverão decisões estratégicas a serem tomadas. Bem como não há uma
sequencia linear entre os ciclos de carreira, pois muitos já iniciam suas
carreiras com grande estrutura e outros ainda acabam por se estabelecer
profissionalmente como advogado Contratado. Não existem regras definidas neste
aspecto.
Para o sucesso na advocacia não basta tão só
o domínio dos livros de Direito, eles são fundamentais, pois a excelência
jurídica é a base mínima de estrutura e suporte da carreira, mas também é
apenas o princípio de uma sequencia de outros desafios enfrentados em busca do
sucesso profissional. Conhecimentos sobre relacionamentos humanos, marketing
jurídico, psicologia, gestão, tendências políticas, jurídicas e econômicas, e
até mesmo finanças formam um mosaico de conhecimentos complementares e de
suporte para decisões estratégicas e respostas aos desafios que os advogados
serão obrigados a enfrentar no competitivo mercado da advocacia ao longo de
todos os ciclos de sua carreira.
Por Victor Furtado
Fonte OAB/GO