A
Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), em recente decisão,
manteve o acórdão do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ) que anulou a
venda de um imóvel objeto de inventário devido à ausência de manifestação do
inventariante do espólio, também herdeiro. De forma unânime, o colegiado
afastou as alegações de ilegitimidade do espólio para pedir judicialmente a
anulação do negócio.
Para
o presidente do IBDFAM/MG, José Roberto Moreira Filho, o entendimento foi
correto. O advogado lembra que, conforme dispõe os artigos 618 e 619 do
CPC/2015, antigo artigos 991 e 992 do CPC/73, incumbe ao inventariante
administrar o espólio velando-lhe os bens com se seus fossem e também é de sua
responsabilidade a alienação de bens de qualquer espécie. Portanto, havendo
ainda a figura do espólio com inventariante nomeado, ou seja, não tendo sido
ainda feita a partilha dos bens inventariados, é necessário a manifestação do
inventariante sobre a alienação de quaisquer bens integrantes da herança.
“Devemos
lembrar, ainda, que a herança é um todo unitário e regula-se pelas regras do
condomínio. Dessa forma dispõe o artigo 1.794 do Código Civil que para a venda
de qualquer bem integrante da herança ou para a cessão dos direitos
hereditários à pessoas estranhas à sucessão é necessário dar-se o direito de
preferência aos demais herdeiros e pelo narrado, no caso em apreço, o autor da
ação era inventariante e também herdeiro e não foi cientificado da venda o que
a torna anulável nos termos do artigo 1.795 do CC. Dispõe, ainda, o artigo
1.793 do Código Civil que é ineficaz a venda por qualquer herdeiro, sem
autorização judicial, de bem discriminado e componente da herança antes de
efetuada a partilha da herança”, diz.
De
acordo com o STJ, a ação proposta pelo espólio discutia instrumento particular
de compra e venda de imóvel formalizado com a filha e a esposa do falecido, mas
sem a participação do inventariante nomeado no processo de inventário. O pedido
foi julgado procedente em primeira instância, com sentença mantida integralmente
pelo TJRJ. Entre outros fundamentos, a magistrada concluiu que, além da
inexistência de escritura pública, um dos herdeiros não emitiu manifestação de
vontade sobre o negócio jurídico, o que invalida a transação.
José
Roberto Moreira Filho explica que, pela ingenuidade das pessoas e
desconhecimento da lei, é muito comum que contratos particulares sejam firmados
tendo por objeto direitos hereditários ainda não partilhados corretamente.
Segundo ele, tais contratos são ineficazes para a transferência dos bens
inventariados. “A herança tem natureza jurídica de bem imóvel, ou seja, as
pessoas devem entender que para a cessão, seja ela onerosa ou gratuita, de bens
hereditários é necessário observar-se as mesmas condicionantes e requisitos
para a transferência de um bem imóvel. Dessa forma, determina o artigo 1.793 do
CC que a cessão da herança necessariamente tem de ser feita por escritura
pública e posteriormente registrada à margem do registro dos imóveis
inventariados, justamente porque a transferência de um bem imóvel deve ser
feita por escritura pública e devidamente registrada”.
O
advogado lembra também da necessidade da outorga uxória caso o herdeiro cedente
seja casado nos regimes de bens que exigem tal outorga para a alienação de bens
imóveis, mesmo que particulares. No caso das cessões gratuitas da herança é
necessário se observar, também, a legítima dos herdeiros necessários.
LEGITIMIDADE EM ABSTRATO
Por
meio de recurso especial, a compradora do imóvel alegou que o negócio anulado
pelas instâncias ordinárias se constituiu como promessa de compra e venda
celebrada com as herdeiras, e não como cessão de direitos hereditários. Ela
alegou também que a legitimidade do espólio para representar os herdeiros
existiria apenas até a conclusão da partilha.
Em
relação à alegação de ilegitimidade do espólio, a Ministra relatora, Nancy
Andrighi, apontou que as condições da propositura da ação, entre elas a
legitimidade das partes, devem ser avaliadas de acordo com as informações
apresentadas na petição inicial, não cabendo ao juiz, nessa fase do processo,
aprofundar-se sobre a sua análise.
“Na
presente hipótese, com base na alegação feita pelo demandante na inicial, sem
depender do exame das circunstâncias e dos elementos probatórios contidos nos
autos, o juízo de origem e o TJRJ identificaram, em abstrato, a legitimidade do
espólio para pleitear a anulação do negócio jurídico, pois o inventário ainda
não havia sido encerrado e o bem imóvel continuava registrado em seu nome”,
destacou a ministra.
“Essa
alegação diz respeito à fase processual em que se encontra a ação proposta.
Quando as ações judiciais estão sendo analisadas pelo Superior Tribunal de
Justiça e pelo Supremo Tribunal Federal algumas questões processuais,
especialmente as fáticas, são vedadas de serem apreciadas por não terem sido
ventiladas e nem decididas nas instâncias inferiores. Então essa decisão é
meramente por técnica processual e por vedação já sumulada nessas instâncias
superiores”, complementa o presidente do IBDFAM/MG.
Sobre
a natureza do negócio jurídico firmado entre o comprador e parte dos herdeiros,
a relatora entendeu que a alteração das conclusões adotadas pelo tribunal
fluminense exigiria o reexame de provas e de cláusulas contratuais, o que é
vedado em recurso especial pelas Súmulas 5 e 7 do STJ.
Fonte
Assessoria de Comunicação do IBDFAM com informações do STJ