O
novo CPC, em vigor desde 18 de março de 2016, trouxe diversas alterações ao
procedimento especial de inventário e partilha, agora previsto nos arts. 610 a
673.
A
novel legislação manteve a possibilidade de realização de inventário e partilha
extrajudicialmente, por meio de escritura pública, quando o de cujus não tenha
deixado testamento e as partes forem maiores, capazes e concordes, conforme
disposto no art. 610, §§ 1º e 2º. Esta escritura será hábil para qualquer ato
de registro de bens, o que já era previsto no CPC/73, bem como para
levantamento de ativos financeiros em instituições bancárias, previsão trazida
pela nova lei no art. 610, § 1º.
Não
sendo possível a lavratura de escritura, pela inexistência de consenso entre os
sucessores ou caso algum deles seja incapaz, aplicam-se as regras do rito
ordinário do novo Código para regularização da sucessão, cujas principais
alterações seguem abaixo destacadas.
a) Foro de processamento do inventário
A
primeira inovação deste rito é referente à abertura e processamento do
procedimento, eis que o art. 48 determina que “o foro de domicílio do autor da
herança, no Brasil, é o competente para o inventário, a partilha, a
arrecadação, o cumprimento de disposições de última vontade, a impugnação ou
anulação de partilha extrajudicial e para todas as ações em que o espólio for
réu, ainda que o óbito tenha ocorrido no estrangeiro”.
Anteriormente,
o CPC de 1973 já previa como competente o foro de domicílio e, também, o da
situação dos bens ou da situação do óbito. Agora, independentemente do local do
óbito, apenas se o autor da herança não possuir domicílio certo é que
prevalecerá o foro de situação dos imóveis (art. 49, parágrafo único, I). Se
forem diferentes foros, qualquer destes (inciso II) ou, em última hipótese, se
existirem diversos bens, o local de quaisquer deles (inciso III).
A
incompetência de foro deverá ser arguida em preliminar de primeiras
declarações, com fundamento no art. 64, que determina essa regra para a
Contestação, aplicada ao procedimento de Inventário, por analogia. Caso
contrário, esta competência relativa será prorrogada (art. 65).
b) Legitimados para requerimento de abertura de
inventário
Os
legitimados para requerer a abertura do inventário permanecem os mesmos,
conforme previsão dos arts. 615 e 616, com a inserção apenas do companheiro
supérstite (art. 616, I), seguindo a regra de adequação geral da nova
legislação no que diz respeito aos companheiros.
Contudo,
foi suprimida a regra de que o Juiz poderia abrir o inventário de ofício, anteriormente
prevista no art. 989. Desta forma, somente os legitimados do art. 616 ou os
interessados patrimonialmente poderão requerer a abertura do procedimento.
c) Citação dos sucessores
O
art. 626, que determina a citação do cônjuge, companheiro, herdeiros e
legatários para se manifestarem sobre as primeiras declarações, inovou em seu
parágrafo primeiro e agilizou o procedimento, ao determinar que as citações de
todos deverão ocorrer pelo Correio, por meio de carta de intimação. A citação
por edital só ocorrerá para ciência dos “interessados incertos ou
desconhecidos”.
No
CPC de 1973, equivocadamente só eram citadas as “pessoas domiciliadas na
comarca por onde corre o inventário ou que aí foram encontradas”, e todas as
demais por edital.
Além
disso, a Fazenda Pública, o Ministério Público e o testamenteiro serão
intimados das primeiras declarações (art. 626), e não citados, como era
previsto anteriormente (art. 999/CPC1973), uma vez que não são partes, mas sim
interessados.
d) Inventariante
O
art. 617 reproduziu a ordem legal que deverá ser observada pelo Juiz ao nomear
o inventariante. Porém, a novidade trazida foi a possibilidade do herdeiro
menor, representado ou assistido, e os cessionários do herdeiro ou legatário,
serem nomeados inventariantes (art. 617, IV e VI). Na primeira hipótese, o
legislador preocupou-se com os casos em que todos os herdeiros forem menores,
dando efetividade ao procedimento.
Acerca
da ordem obrigatória de nomeação de inventariante, como bem pontuou a
Professora ANA LUIZA NEVARES, “não parece, no entanto, que a expressão
mencionada direcione o intérprete para uma ordem obrigatória quanto à nomeação
do inventariante. Por suas funções já expostas, o inventariante é uma figura
central no processo de inventário, razão pela qual sua nomeação deve ser
norteada pela idoneidade do nomeado, por aquele que melhor represente os
interesses do espólio e do regular desenvolvimento do processo, considerando
ainda o grau de litigiosidade entre os herdeiros, bem como a natureza dos bens
inventariados”1.
Além
disso, a inclusão dos atos dispositivos trazidos ao processo civil, com a
possibilidade de realização de negócios processuais (art. 190), deu autonomia
às partes também no inventário, eis que os sucessores poderão acordar
amigavelmente quem será o inventariante, independentemente da ordem legal
estabelecida no art. 617.
Uma
das poucas possibilidades de incidentes processuais no novo Código é a
remoção/destituição de inventariante, prevista nos arts. 622 a 625, que deverá
ser autuada em apartado, assegurando a ampla defesa e o contraditório, com
apresentação de defesa no prazo de 15 dias. A considerável inovação, neste
aspecto, é a fixação de multa pelo Juiz, a ser paga pelo inventariante
removido/destituído, quando deixar de restituir a posse de todos os bens do
monte-mor, em quantia não superior a 3% do valor dos bens inventariados (art.
625).
e) Tutela de evidência – antecipação de uso e fruição
de bens
Um
dos mais importantes regramentos é a possibilidade trazida pelo parágrafo único
do art. 647, que permite ao Magistrado deferir antecipadamente aos herdeiros o
direito de usar e fruir de determinado bem, contanto que, ao término do
inventário, tal bem integre a cota deste herdeiro, o qual se responsabilizará
pelos ônus e bônus inerentes à conservação deste bem. Tal regra concretiza a
tutela de evidência em hipótese especial, criada pelo novo Código, antecipando
o resultado prático do processo de inventário.
Tal
antecipação é também permitida aos legatários, conforme entendimento dos
enunciados 181 e 182 da Carta de Belo Horizonte de dezembro de 2014 (IV
Encontro Permanente de Processualistas Civis).
A
decisão é considerada interlocutória e deverá ser atacada por agravo de
instrumento (art. 1.015, parágrafo único).
f) Bens insuscetíveis de divisão
Uma
regra anteriormente prevista no capítulo das alienações judiciais, foi trazida
para dentro do procedimento do inventário, buscando uma divisão cômoda dos
bens, ao dispor, no art. 649, que “os bens insuscetíveis de divisão cômoda que
não couberem na parte do cônjuge ou companheiro supérstite ou no quinhão de um
só herdeiro serão licitados entre os interessados ou vendidos judicialmente,
partilhando-se o valor apurado, salvo se houver acordo para que sejam
adjudicados a todos”.
Estas
três possibilidades observam o art. 648, o qual determina que na partilha
deverão ser observadas as seguintes regras: “I - a máxima igualdade possível
quanto ao valor, à natureza e à qualidade dos bens; II - a prevenção de
litígios futuros; III - a máxima comodidade dos coerdeiros, do cônjuge ou do
companheiro, se for o caso”. Tal inovação expressa o que já vinha sendo
interpretado pelo art. 2.017 do Código Civil (“no partilhar os bens,
observar-se-á, quanto ao seu valor, natureza e qualidade, a maior igualdade
possível”).
Esta
solução busca evitar litígios que o condomínio geralmente acarreta, fazendo com
que a partilha preveja a divisão completa e equânime de todo o acervo.
g) Arrolamento Comum e Sumário
Quando
a herança for de pequeno valor (em novo limite agora estabelecido, qual seja,
igual ou inferior a 1.000 salários mínimos), o inventário proceder-se-á sob o
rito do arrolamento comum (arts. 664, 665 e 667).
Inovou
a legislação ao consagrar a efetividade do processo e possibilitar que, ainda que
haja interesse de incapaz, tal procedimento será adotado excepcionalmente,
desde que as partes e o Ministério Público estejam de acordo com a partilha
(art. 665).
Contudo,
para o arrolamento sumário (independente de valoração), nao pode haver conflito
e todas as partes envolvidas devem ser capazes e inexistir conflito (art. 659).
A inovação trazida pelo art. 659 é que, agora, somente neste caso de
arrolamento sumário, a partilha amigável será homologada (ou os bens
adjudicados ao único herdeiro) anteriormente ao recolhimento do imposto de
transmissão causa mortis. Após a expedição do formal de partilha ou da carta de
adjudicação, a Fazenda Pública será intimada para providenciar o lançamento
administrativo do imposto, fora do processo. Tal regra excepcionou o art. 192
do Código Tributário Nacional (“nenhuma sentença de julgamento de partilha ou
adjudicação será proferida sem prova da quitação de todos os tributos relativos
aos bens do espólio, ou às suas rendas”), mas manteve a regra de que o Fisco
não ficará adstrito aos valores atribuidos aos bens no Inventário, conforme
destacado no art. 662, § 2º.
h) Colação
A
mais polêmica alteração relativa às sucessões é a valoração dos bens trazidos à
colação. O art. 1.014 do Código de Processo Civil de 1973 determinava que “os
bens que devem ser conferidos na partilha, assim como as acessões e
benfeitorias que o donatário fez, calcular-se-ão pelo valor que tiverem ao
tempo da abertura da sucessão”.
Porém,
com a vigência do Código Civil em 2003, entendeu-se pela revogação da
disposição processual, em razão das regras do direito intertemporal, e
passou-se a conferir o valor do bem trazido à colação no ato da liberalidade,
eis que o seu art. 2002 dispôs que “os descendentes que concorrerem à sucessão
do ascendente comum são obrigados, para igualar as legítimas, a conferir o
valor das doações que dele em vida receberam, sob pena de sonegação”, e o art.
2.004 salientou que “o valor de colação dos bens doados será aquele, certo ou
estimativo, que lhes atribuir o ato de liberalidade”.
Revertendo
a positivação do Código Civil, a recente legislação processual manteve a
disposição anterior e dispôs que: “os bens a serem conferidos na partilha,
assim como as acessões e as benfeitorias que o donatário fez, calcular-se-ão
pelo valor que tiverem ao tempo da abertura da sucessão” (art. 639, parágrafo
único). Se mantido o mesmo entendimento da doutrina civilista, de aplicação da
regra do direito intertemporal, ocorrerá um retrocesso com a aplicação do art.
693, pois, ao reproduzir o texto do CPC anterior, em contradição ao art. 2.004
do Código Civil, modificou-se novamente o instituto da colação.
Note-se
que, se o donatário, na abertura da sucessão, ainda possuir tal bem em seu
patrimônio, tal aplicação poderá lhe ser favorável na hipótese de
desvalorização, como é o caso dos veículos, pois o valor trazido à colação será
menor e terá ampliado o seu quinhão relativo aos demais bens. Quando se tratar
de bem imóvel, por exemplo, em que na maior parte das vezes ocorre valorização,
a disposição da lei processual será mais prejudicial ao donatário.
Conforme
entendimento da Professora CLAUDIA ELISABETE SCWERZ CAHALI, “é razoável
sustentar que a melhor solução para resolver a antinomia seria entender que o
valor do bem colacionado é aquele à época da liberalidade, atualizando-se até a
sucessão (na mesma data em que os demais bens serão considerados),
conferindo-se rendimento a ambos os dispositivos legais”2.
Pode-se
perceber pelas alterações acima mencionadas que o Novo Código de Processo Civil
buscou dar celeridade ao rito do inventário, assegurando, inclusive, uma maior
participação dos herdeiros incapazes, seja em sua nomeação como inventariante,
seja pela possibilidade de adoção do arrolamento comum.
Ademais,
a máxima de resolução consensual dos conflitos e a tutela de evidência foram
trazidas expressamente para o procedimento de inventário, o que beneficia a
justa e efetiva partilha e a satisfação dos jurisdicionados.
Fonte
Migalhas