Oferta de cursos de línguas estrangeiras cresce no Brasil, mas os especialistas alertam: métodos não servem a todos os interessados
Em 2008, apenas 42 instituições brasileiras ofereciam cursos on-line livres (aqueles que não dependem de aval do Ministério da Educação), segundo a Associação Brasileira de Ensino a Distância. De acordo com o último levantamento da Abed, em 2010, o número praticamente dobrou, chegando a 82 cursos na internet. O ensino de idiomas também fez parte dessa evolução, acompanhada pelo crescimento do número de alunos.
A Englishtown, uma das escolas mais tradicionais do segmento de ensino virtual, registrou em apenas um ano um aumento de 50% no número de estudantes, que agora chega a 150.000. O rival Portal Educação, que oferece cursos de inglês e espanhol, tinha pouco mais de 17.000 alunos no ano passado e espera fechar 2012 com 40.000. O mercado é tão animador que atrai escolas do exterior. No iníco deste ano, a OpenEnglish, escola de inglês on-line fundada na Venezuela, iniciou suas operações por aqui: já atraiu 3.000 alunos. A expectativa da companhia, segundo Andrés Moreno, presidente da OpenEnglish, é superar os 10.000 estudantes até o fim de 2012. A expansão da startup para o Brasil chamou a atenção de fundos americanos, que investiram 40 milhões de dólares para ver o negócio crescer.
Os cursos variam de escola para escola, mas seguem basicamente dois padrões: no primeiro, as aulas contam exclusivamente com recursos de áudio; no outro, a ferramenta é a videoconferência. Nos dois casos, as aulas são realizadas em tempo real por um grupo de cinco ou seis alunos acompanhados por um professor. Em geral, professores que ministram as aulas de nível básico são brasileiros, enquanto os tutores de níveis avançados são nativos da língua estrangeira (ingleses, americanos, espanhóis etc.).
A exemplo do que acontece com os demais cursos de ensino a distância, as aulas de idiomas on-line não escapam de uma indagação: é possível aprender um novo idioma por meio de aulas virtuais? Depende, respondem os especialistas. A mudança da aula presencial para a virtual não se faz sem exigências extras.
Para a linguista Anna Maria Grammatico Carmagnani, da Universidade de São Paulo, que há anos estuda a transposição de livros didáticos para meios digitais, a modalidade on-line é mais indicada para quem busca aperfeiçoar a língua estrangeira do que para os iniciantes. "É preciso que a pessoa já tenha alguma bagagem. O aprendizado de um idioma requer um método específico, um caminho para acessar a nova língua: quem tem pouco ou nenhum conhecimento sobre ela carece desse método. A mediação da internet neste caso não ajuda muito."
A especialista acrescenta que os cursos on-line exigem livros e demais conteúdos de apoio especialmente produzidos para esse fim. "As novas plataformas requerem um material diferenciado e desenvolvido especificamente para aquele meio. Assim como os livros e apostilas fazem o melhor uso do papel, os recursos da internet, como vídeo, fóruns e interatividade, têm seu próprio potencial", diz. A simples transposição do papel para a internet, portanto, produz resultados mais pobres.
Alguns cursos de fato procuram fazer bom uso dos recursos eletrônicos. É o caso de ferramentas motivacionais, que estabelecem objetivos e avaliam o desempenho dos alunos. A medição de performance, como é batizado o recurso na OpenEnglish, por exemplo, apresenta os dados em gráficos, o que ajuda os estudantes a acompanhar sua própria evolução.
Há ainda outro fator a ser levado em conta, acrescenta Vera Lúcia Menezes de Oliveira e Paiva, pesquisadora da Universidade Federal de Minas Gerais e estudiosa do uso da tecnologia no ensino de línguas estrangeiras. Para a especialista, a grande vantagem dos cursos on-line é a flexibilidade. "O aluno pode estudar no horário que lhe convier", diz. Mas a oferta é também uma armadilha. "Só os muito disciplinados conseguem ir adiante nesse tipo de esquema. Ou seja, a eficácia do curso depende muito do aluno."
"A economia de tempo foi o que me motivou a escolher um curso on-line. Eu podia fazer os exercícios no iPad durante o almoço, por exemplo. A flexibilidade de horário, outro ponto positivo, jogou contra mim, contudo: acabei deixando o curso em segundo plano. Por fim, desisti."
Estratégias
As escolas tentam contornar esses obstáculos, alimentando as atividades extra-classe, por exemplo. Segundo Julio De Angeli, vice-presidente da Englishtown, a escola mantém um fórum por meio do qual os alunos de toda a rede (que inclui escolas da sueca EF, espalhadas em 120 países) trocam experiências. "Focamos no uso da língua no cotidiano e por isso achamos importante que os alunos mantenham contato mesmo fora do ambiente escolar", explica.
A Englishtown promove ainda encontros presenciais, onde os alunos podem exercitar o que aprenderam nas aulas. Um serviço de call center também é colocado à disposição dos estudantes para que eles possam tirar dúvidas sobre lições ou planos de estudo. As aulas acontecem 24 horas por dia, sete dias por semana, em áudio (grupo) ou vídeo (particular): o aluno só precisa escolher o horário mais adequado. Para passar de nível é preciso atingir a média sete.
A OpenEnglish, que atua em 25 países, tenta emplacar no mercado um formato alternativo de aula virtual. Ao conectar-se na rede, o aluno pode, é claro, unir-se a uma turma compatível com seu nível de domínio do idioma estrangeiro. Mas ele também pode procurar um grupo virtual de alunos e professor que discutam um tema de seu interesse, seja ele cinema, negócios ou futebol. "Um consultor da escola entre em contato com o estudante e investiga suas preferências. A cada duas semanas ele volta a ligar para motivá-lo e identificar suas dificuldades", diz Pupo Neto, CEO da OpenEnglish no Brasil. "O objetivo disso é evitar um fenômeno recorrente no estudo a distância: o aluno sentir-se sozinho. Essa abordagem pode fazer a diferença no aprendizado dele."
Por Renata Honorato
Fonte Exame.com