É entendimento predominante na doutrina e na jurisprudência de que são aplicáveis as regras do Código de Defesa do Consumidor nos contratos bancários e de financiamento. Os argumentos são os mais variáveis possíveis para fundamentar a incidência das normas de consumo nos referidos contratos, verificando sempre a dificuldade de se caracterizar o consumidor. Quanto aos contratos de depósito, de poupança e de investimentos não há dúvida acerca da aplicabilidade das normas do Código de Defesa do Consumidor, visto que o consumidor é destinatário final, enquadrando-se no conceito do artigo 2º, caput do mesmo codex. Por outro lado, a dificuldade em reconhecer o consumidor surge nos contratos de empréstimos e financiamento, onde o objeto da obrigação é o dinheiro, bem juridicamente consumível. Assim, parte da doutrina e da jurisprudência se utiliza do princípio da vulnerabilidade do consumidor para o reconhecimento da figura do consumidor na relação de consumo, mesmo quando o contrato bancário resulta de uma atividade profissional. Outros entendem que haverá relação de consumo se o devedor utiliza o dinheiro ou crédito bancário como destinatário final, segundo a doutrina de Nelson Nery Júnior. Há também remansosa jurisprudência favorável à aplicação do Código de Defesa do Consumidor nos contratos bancários, fundamentando-se apenas na regra do artigo 3º, § 2º, do referido estatuto, reconhecendo como serviço as atividades de natureza bancária, financeira e de crédito: "Art. 3º § 2º. Serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista."(grifei) Não obstante, há entendimento em sentido contrário ao exposto, consubstanciado na inaplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor aos contratos bancários e de financiamento. Muitos entendem que no caso da realização de um empréstimo bancário para execução de uma atividade profissional, não está presente a figura do consumidor, já que não há um destinatário final do objeto da relação de consumo. Existem também aqueles que reputam ser inaplicável o Código de Defesa do Consumidor nos contratos bancários, alegando que estes são regulados por legislação específica, a par de não contemplarem relações tipicamente de consumo. Outros requerem a comprovação de abuso na relação contratual para que fique caracterizada a relação de consumo, caso contrário, seria inválida a aplicação do Código de Defesa do Consumidor nos contratos bancários. Com efeito, a despeito das argumentações supra, entendo ser plenamente aplicável o Código de Defesa do Consumidor nos contratos bancários, mas, para tanto, devemos enquadrar tais contratos nos conceitos ditados por este código. Dessa forma, para a caracterização de uma relação de consumo é necessário que da relação jurídica obrigacional participe um consumidor e um fornecedor, tendo por objeto um produto ou serviço. A ausência de algum desses requisitos implicaria na existência de uma relação jurídica diversa, de natureza cível ou comercial. O conceito de fornecedor está previsto no artigo 3º, caput do Código de Defesa do Consumidor e os bancos se enquadram perfeitamente nele, pois, sendo sociedades anônimas, suas atividades são reconhecidas como de comércio, por expressa disposição do artigo 119 do Código Comercial: "Art. 119. São considerados banqueiros os comerciantes que têm por profissão habitual do seu comércio as operações chamadas de Banco". Já os parágrafos 1º e 2º, do artigo 3º, do Código de Defesa do Consumidor, dispõem acerca dos conceitos de produto e serviço, sendo expressamente considerado como serviços todas as atividades de natureza bancária, financeira e de crédito. Mas, em se tratando de consumidor, o Código de Defesa do Consumidor nos apresenta quatro conceitos: o nuclear (art. 2º, caput) e três conceitos por equiparação (art. 2º parágrafo único, art. 17 e art. 29). Assim, para verificar se os contratos bancários celebrados, apresentam-se como típica relação de consumo, basta enquadra-los nos conceitos acima. Em se tratando de consumidor que esgota a vida econômica do bem - destinatário final - não há nenhuma dúvida acerca da aplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor. É o típico caso da pessoa que realiza um empréstimo bancário, visando adquirir sua moradia. Aqui, o consumidor preenche os requisitos do artigo 2º caput do Código de Defesa do Consumidor. Já o fornecedor é aquele previsto no artigo 3º caput, do mesmo codex. E o objeto da obrigação - serviços bancários e financeiros - está entre aqueles descritos no parágrafo 2º do mesmo artigo 3º. Todavia, alguma indagação pode surgir quando o consumidor adquire o produto com finalidade lucrativa, deixando de ser destinatário final do mesmo. Os empréstimos destinados ao financiamento de lavouras, ou ao investimento comercial, são exemplos clássicos. Não obstante, a despeito de o adquirente do empréstimo não se caracterizar como consumidor, nos moldes do artigo 2º caput do Código de Defesa do Consumidor, não se pode olvidar de que no mesmo código existem mais três conceitos de consumidor, conforme descrito alhures. No caso em apreço, o conceito de consumidor que nos interessa é aquele previsto no artigo 29 do Código de Defesa do Consumidor: "Para os fins deste Capítulo e do seguinte, equiparam-se aos consumidores todas as pessoas determináveis ou não, expostas às práticas nele previstas". Pelo disposto neste artigo, verificamos que são considerados consumidores todas as pessoas (físicas ou jurídicas), determináveis ou não (interesses difusos e coletivos), expostas às práticas comerciais e contratuais abusivas, constantes nos capítulos V e VI do Código de Defesa do Consumidor. Com efeito, os contratos bancários, que são por excelência contratos de adesão (art. 54 do Código de Defesa do Consumidor), estão disciplinados no capítulo VI. Logo, todos aqueles que celebrem os referidos contratos são considerados consumidores, por força do art. 29 do Código de Defesa do Consumidor. Ademais, em se tratando da existência de cláusulas abusivas, a interpretação é a mesma, sendo consumidor qualquer pessoa a elas expostas, nos termos do artigo 29 c.c. 51 do Código de Defesa do Consumidor. Portanto, através de uma interpretação sistemática, conclui-se que a atividade bancária será sempre relação de consumo, porque, caso o consumidor não se enquadre no conceito clássico do artigo 2º, "caput", do Código de Defesa do Consumidor, ele entrará no conceito por equiparação, preconizado pelo artigo 29 do mesmo codex. Tal assertiva é corroborada pelo próprio Código de Defesa do Consumidor, que, visando defender o consumidor, considera como serviço qualquer atividade de natureza bancária, financeira e de crédito (art. 3º, § 2º do CDC). Ressalta-se, por oportuno, que as instituições financeiras reconhecem a aplicação do CDC em suas atividades, já que é fato corriqueiro lançarem âncoras aos artigos 43 e s.s. deste código, com o intuito de justificar a inclusão dos consumidores em seus cadastros negativos. No mais, nos dizeres de Nelson Nery Junior e Rosa Maria Andrade Nery: "A preocupação atual dos países ocidentais é dotar as leis de melhor proteção contra atividades bancárias e creditícias. Acolhendo a sugestão o Prof. Dr. Newton De Lucca, no Congresso Internacional de Direito do Consumidor (Brasília, Abril de 1994), o plenário aprovou conclusão unânime no sentido de que"os bancos e as atividades bancárias se encontram sob o regime jurídico do Código de Defesa do Consumidor". Como se pôde observar, o código em tela retrata um dos princípios fundamentais da democracia - a igualdade, buscando dar tratamento isonômico às partes na relação de consumo. Assim, é reconhecida a aplicação do Código de Defesa do Consumidor nos contratos bancários e de financiamento, bem como nas demais atividades bancárias, porque interpretação diversa implicaria em deixar ao desamparo quem o código objetiva proteger: O CONSUMIDOR.
Fonte JusBrasil Notícias